O futuro da Europa...

Merkel, tão elogiada no seu generoso humanitarismo, impôs agora à Espanha e à Grécia que reacolhessem milhares de migrantes.

Para salvar o seu governo e a unidade interna do seu partido, cada vez mais contaminado pela mundivisão racista das direitas triunfantes por toda a Europa Central, Angela Merkel propôs a criação de novos “centros de controlo” para refugiados, a sediar nos países de chegada dos migrantes (Itália, Grécia, Espanha) ou noutros que se proponham a acolher estes centros de forma voluntária “segundo um princípio de solidariedade”. Curiosa esta “solidariedade”: para sossegar a extrema-direita racista e xenófoba que já dirige ou participa em 40% dos governos da UE (dos países bálticos à Itália, da Bélgica à Bulgária), os governos que se dizem europeístas liberais e antipopulistas continuam a adotar, uma a uma, as propostas da extrema-direita. Esta proposta de “centros de controlo” em território europeu adia por algum tempo aquela que foi a proposta do próprio Donald Tusk, o presidente do Conselho Europeu, de pagar a países do Norte de África para abrirem eles esses centros, por forma a impedir a travessia do Mediterrâneo, logo descritos pelas ONGs de Direitos Humanos e por um dos comissários da UE como verdadeiros “Guantánamos” europeus. O que saiu da cartola de Merkel para acalmar a direita-da-direita alemã não é muito melhor. Campos de refugiados em que se detém contra a sua vontade quem procura asilo na UE, não por ordem de um juiz mas por pura decisão policial/administrativa, é o que já existe desde 2015 em Itália e na Grécia, onde centenas de milhares de migrantes aguardam meses ou anos pela simples decisão sobre o seu pedido de asilo.

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Para salvar o seu governo e a unidade interna do seu partido, cada vez mais contaminado pela mundivisão racista das direitas triunfantes por toda a Europa Central, Angela Merkel propôs a criação de novos “centros de controlo” para refugiados, a sediar nos países de chegada dos migrantes (Itália, Grécia, Espanha) ou noutros que se proponham a acolher estes centros de forma voluntária “segundo um princípio de solidariedade”. Curiosa esta “solidariedade”: para sossegar a extrema-direita racista e xenófoba que já dirige ou participa em 40% dos governos da UE (dos países bálticos à Itália, da Bélgica à Bulgária), os governos que se dizem europeístas liberais e antipopulistas continuam a adotar, uma a uma, as propostas da extrema-direita. Esta proposta de “centros de controlo” em território europeu adia por algum tempo aquela que foi a proposta do próprio Donald Tusk, o presidente do Conselho Europeu, de pagar a países do Norte de África para abrirem eles esses centros, por forma a impedir a travessia do Mediterrâneo, logo descritos pelas ONGs de Direitos Humanos e por um dos comissários da UE como verdadeiros “Guantánamos” europeus. O que saiu da cartola de Merkel para acalmar a direita-da-direita alemã não é muito melhor. Campos de refugiados em que se detém contra a sua vontade quem procura asilo na UE, não por ordem de um juiz mas por pura decisão policial/administrativa, é o que já existe desde 2015 em Itália e na Grécia, onde centenas de milhares de migrantes aguardam meses ou anos pela simples decisão sobre o seu pedido de asilo.

Cada vez mais hostis face às ONGs que defendem dos direitos dos migrantes, os governos europeus podiam pelo menos ler as auditorias feitas por Bruxelas, como a que no ano passado denunciava a situação das 23 mil crianças detidas nestes campos, sem acompanhamento parental, privadas de liberdade, de segurança, de água, de comida, de cobertores, de cuidados médicos, vítimas muito frequentes de abuso e exploração sexual. 130 mil migrantes aguardavam no fim de 2017 nos campos italianos que as autoridades decidissem sobre pedidos de asilo. A UE comprometera-se a distribuir 35 mil pelos vários países membros, mas apenas 3.809 tinham sido aceites por algum Estado membro; de entre eles, menos de 1.200 tinham sido efetivamente transferidos para fora de Itália - nenhuma daquelas crianças incluída (Guardian, 24.4.2017)! O que se combinou em Bruxelas é multiplicar isto por vários novos campos! E é este o acolhimento prestado aos refugiados pela Europa da democracia e dos Direitos Humanos, cujos Macrons, Merkels e Tusks enchem o peito contra Trump e os racistas que (re)assumiram o governo em Itália. Merkel, tão elogiada no seu generoso humanitarismo, impôs agora à Espanha e à Grécia que reacolhessem milhares de migrantes que, tendo entrado no espaço europeu naqueles países, conseguiram chegar à Alemanha. Depois de anos a insistir com Viktor Orbán que havia que ser solidário e aceitar a distribuição de refugiados pelos város países europeus, Merkel vem agora dar-lhe razão! Ela e Donald Tusk: “Pré-requisito de qualquer política de migrações genuína da UE é que sejam os europeus a decidir quem entra na Europa. (…) Os povos da Europa esperam de nós (…) determinação para restaurar a sensação de segurança (…), não porque se tenham tornado subitamente xenófobos e queiram levantar muros contra o resto do mundo, mas porque fazer cumprir a lei é competência de toda e qualquer autoridade, proteger o território e as fronteiras.” É o que constava do texto do convite formal que o presidente do Conselho Europeu dirigiu aos chefes de governo da UE para a cimeira de 28 e 29 de junho. Não, não é um tweet de Trump...

“Uma vez desumanizados e, portanto, anulados como sujeitos potenciais de exigências morais, contempla-se os seres humanos que são objeto de tarefas burocráticas com indiferença ética”, escreveu Zygmunt Bauman sobre os judeus perseguidos pelo Nazismo (Modernidade e Holocausto). É também assim que a UE está a tratar os refugiados: “objetos desumanizados”, invasores indesejáveis, potenciais criminosos, a quem se não reconhece “poder ter uma ‘causa’, e muito menos uma causa ‘justa’ (…) para que se os tome em consideração”.

O futuro da União Europeia “depende da resposta que dermos às questões vitais colocadas pelas migrações”, dizia Angela Merkel há dias. Tinha toda a razão.