Governo diz que medidas são de esquerda, parceiros falam em "brinde" aos patrões

Vieira da Silva considera que as propostas mudam o "paradigma" no mercado de trabalho e defendem direitos que "são prática desta maioria". PCP, BE e PEV criticam medidas "negativas".

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JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

O ministro do Trabalho, Vieira da Silva, assegurou nesta sexta-feira que o objectivo da proposta de lei do Governo que altera a lei laboral é "fechar a porta à precariedade", mas essa não é a interpretação de BE, PCP e PEV, que acusam o Governo de dar um brinde aos patrões. O BE diz que a proposta, depois do acordo de concertação social, veio “abrir janelas” à precariedade, o PCP garante que a legaliza e o PEV lamenta que tenha sido feita “à medida das entidades patronais”. 

O debate sobre as leis laborais foi mais sobre as medidas que dividem os parceiros de esquerda do que sobre aquelas em que concordam. O ministro do Trabalho defendeu o acordo de concertação social, mas afirmou que as propostas que apresenta nesta sexta-feira no Parlamento são "avanços" que correspondem a "políticas deste Governo, a estratégia e prática desta maioria". 

No início do debate, Vieira da Silva, assumiu que a proposta é uma "bateria de instrumentos de sentido inequívoco de progresso dos direitos e da igualdade" que servem sobretudo "para melhorar a qualidade do emprego e a regulação do mercado de trabalho". Para o ministro não há dúvida de que estas são medidas "com impacto na vida das pessoas, para melhorar a qualidade do emprego e da regulação do mercado de trabalho" que significam "avanços que têm sido a política deste Governo, a estratégia e a prática desta maioria", defendeu.

O governante tentou puxar os partidos à esquerda para a parte da proposta do Governo em que concordam, ou seja, as medidas que reduzem a possibilidade da contratação a prazo. 

Vieira da Silva sabe que o problema dos parceiros parlamentares se prende também com o facto de este pacote ter sido acordado na Comissão Permanente de Concertação Social e, por isso, terminou a intervenção inicial a dizer que "a qualidade e a justeza destas medidas não advém de elas terem sido apoiadas por um acordo de concertação, ainda que seja muito importante, advém da sua capacidade de melhorar o trabalho e emprego e é esse e apenas esse o objectivo que nos move", defendeu.

"Queremos fechar a porta à precariedade, não queremos fechar a porta ao emprego", concluiu.

Mas não foi suficiente para convencer na totalidade a esquerda parlamentar. Francisco Lopes, do PCP, enumerou todas as propostas do PCP que o PS tem rejeitado e no final da sua pergunta considerou que os avanços que constam da proposta do executivo "não compensam o carácter negativo de uma proposta de lei que prejudica os trabalhadores".

O deputado comunista questionou directamente o ministro sobre a taxa de rotatividade, considerando que esta medida é "perversa" porque "em vez de discutir se o posto de trabalho é ou não permanente", avalia essa rotatividade pela média de contratação de cada sector.

Esta seria uma das poucas perguntas a que Vieira da Silva responderia no curto período de respostas dizendo que "uma taxa para penalizar não serve para legalizar. A verdadeira forma de período experimental é o trabalho a prazo e é isso que acabará se esta proposta for aprovada. Deixarão os portugueses, em particular os jovens, de ter como única entrada no mercado de trabalho o contrato a prazo".

O BE, por Isabel Pires, questionou directamente o ministro sobre o porquê de estas alterações não incluírem o aumento do número de dias para pagamento da compensação por despedimento, considerando que o que não consta neste pacote de medidas parece significar um "brinde aos patrões". Citando uma intervenção de Vieira da Silva em 2013 enquanto deputado do PS, contra a redução das compensações por despedimento, questionou: "O que mudou desde então? Vai manter este corte ou defende os trabalhadores? Vai honrar as suas posições ou o acordo com os patrões foi para lhes dar um brinde e manter estas injustiças na lei laboral?”

O Bloco não perdoa ao ministro que, na concertação social, tenha incluído na proposta medidas que "contrariam o que tinha sido acordado" no âmbito do grupo de trabalho contra a precariedade criado no Parlamento. "Depois de fecharmos portas à precariedade, o Governo veio abrir janelas com outras medidas que mitigam, reduzem o âmbito e, em alguns casos, contrariam o que tinha sido acordado à esquerda", lamentou o deputado bloquista José Soeiro.

Soeiro manifestou “surpresa” com aumento do período experimental na contratação sem termo de pessoas à procura de primeiro emprego e de desempregados de longa duração e com o alargamento dos contratos de muito curta duração. "Nada justifica que para tarefas indiferenciadas seja preciso ficar seis meses à experiência. A redacção deste artigo está assombrada de inconstitucionalidade”, afirmou, um alerta igualmente deixado pela direita.

José Luís Ferreira, deputado do PEV, não tem dúvidas de que a proposta de lei do Governo está feita “à medida das entidades patronais”. “Até parece que foi a pedido”, ironizou.

E não poupou o ministro: “Esta proposta tanto podia ter vindo do PS, como do PSD ou do CDS. Basta olhar para a simpatia com que os partidos de direita olharam para o acordo entre UGT e confederações patronais”.

Tiago Barbosa Ribeiro, deputado do PS, começou por defender a proposta o Governo que, garante, vem “responder à maioria dos trabalhadores que são a parte mais fraca da legislação laboral”.

“O PS intervém para estabilizar as relações laborais”, assegurou, numa crítica às medidas tomadas pelo governo do PSD/CDS durante o período da troika. E não poupou a direita, lamentando que não tenha acompanhado as medidas laborais que tem vindo a ser aprovadas no Parlamento.

Quanto às propostas dos partidos que apoiam o Governo no Parlamento, Barbosa Ribeiro assumiu que o PS irá viabilizar algumas nas votações desta sexta-feira.

Direita questiona credibilidade do Governo

Tanto o PSD como o CDS insistiram na falta de capacidade do primeiro-ministro de controlar o seu próprio partido no Parlamento, lamentando que o PS se proponha fazer alterações ao acordo de concertação social

“Se o PS mudar em sede parlamentar o que o Governo se comprometeu a fazer em sede de concertação social, ninguém mais leva a sério este Governo e este primeiro-ministro. Qual é o interlocutor que faz um acordo e o altera logo a seguir? Que palavra tem um Governo que se diz e desdiz ao mesmo tempo? Que autoridade tem um primeiro-ministro e secretário-geral do PS que não se faz obedecer nem é capaz de se manter fiel aos seus compromissos com terceiros?”, quis saber a deputada social-democrata Carla Marques Mendes.

“O que aqui está em causa não é apenas o acordo celebrado é a credibilidade política do Governo, do PS e do primeiro-ministro”, concluiu.

Já antes o deputado social-democrata Adão Silva tinha carregado nessa ideia, salientando primeiro que a legislação laboral mostra que "acabaram os tempos festivaleiros das reversões e agora é tempo dos encontrões" entre os partidos da maioria. Contudo, depois da avaliação política, questionou directamente o ministro: "Aparentemente, o PS está pronto para roer a corda. Qual é a sua posição se houver um exercício de propostas do PS que sejam traição àquilo que foi acordado com os parceiros sociais?"

Dúvidas semelhantes foram colocadas pelo CDS, com o deputado Filipe Anacoreta Correia a dar conta de um Governo "em risco de isolamento, orgulhosamente só, que provoca aqueles de quem precisa", incluindo o Tribunal Constitucional".

Além da proposta do Governo, os deputados discutem na generalidade 18 projectos de Lei do PCP. BE e PEV. Algumas serão hoje votadas, enquanto a proposta de lei do executivo só deverá ser votada a 18 de Julho, ainda durante esta sessão legislativa. O debate em detalhe na Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social tanto da proposta do Governo como das propostas dos partidos que hoje forem aprovadas deverá arrastar-se para depois do Verão e vai cruzar-se com o Orçamento do Estado para 2019.

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