António Costa acredita no Diabo

António Costa e Mário Centeno acreditam no diabo. Mesmo. Eles estão convencidos de que a fragilidade do país é imensa.

António Costa tem um grande problema entre mãos: para conseguir formar governo com o apoio do Bloco e do PCP ele foi obrigado a ser extremamente eleitoralista no início do mandato, e agora, que o final do mandato se aproxima, faltam-lhe recursos para praticar aquele género de eleitoralismo que compra maiorias absolutas. Sacar as chaves do Palacete de São Bento das mãos de Passos Coelho teve um custo altíssimo: reposição acelerada de ordenados e pensões, regresso dos feriados, recuperação das absurdas 35 horas de trabalho na função pública, um conjunto infindável de reversões que custaram muito dinheiro ao país. O dinheiro que distribuiu em 2015 é o dinheiro que lhe vai faltar em 2019.

Isso é péssimo para quem anda à procura dos mágicos 45%. Com um país nas lonas, e os telejornais a abrir com abundantes descontentamentos e greves um pouco por todo o lado, jamais António Costa conseguirá chegar aos 116 deputados. Não admira que o partido esteja a cair consecutivamente nas sondagens. O barómetro de Junho da Aximage, publicado pelo Negócios e pelo Correio da Manhã, atribui ao PS 37% das intenções de voto. Quarta queda em quatro meses. Há um ano, a mesma sondagem atribuía-lhe 43,7%, a um pequeno passo da maioria absoluta. Hoje, já quase ninguém acredita que ela seja possível.

Mesmo havendo sondagens mais generosas para o PS em percentagem de votos, em todas elas os socialistas estão a cair. Donde, uma pergunta impõe-se: porque é que António Costa esperou por 2018 para desvirar a página de austeridade e ter uma sucessão de ataques de lucidez orçamental à frente das câmaras de televisão? Que estranho timing é este? No dia 5 de Junho, ele afirmou, sobre o tempo de carreira dos professores: “Não temos dinheiro para pôr mais 600 milhões de euros por ano a pagar esta reivindicação salarial. É muito simples: não temos dinheiro para todo o tempo de serviço.” Esta segunda-feira, na apresentação do plano para a requalificação de um troço do IP3, disse: “De repente, toda a gente acha que é possível fazer tudo já e ao mesmo tempo. Quando estamos a decidir fazer esta obra, estamos a decidir não fazer evoluções nas carreiras ou vencimentos.” Apetece beliscarmo-nos para confirmar que estamos acordados. A que se deve esta súbita e surpreendente passoscoelhização de António Costa?

A minha teoria é esta: António Costa e Mário Centeno acreditam no diabo. Mesmo. Eles estão convencidos de que a fragilidade do país é imensa, e que as boas notícias que temos ouvido ao longo dos últimos três anos são largamente exageradas. O crescimento que ocorreu desde a saída da troika apenas levou o país de volta para os níveis de PIB anteriores à crise, e o mais provável é que a partir daqui Portugal regresse à velha estagnação económica da primeira década deste século. Sim, o défice parece controlado, mas as condições económicas exteriores são irrepetíveis – basta um solavanco, e a subida de juros acompanhada da subida do desemprego empurra o país outra vez para o charco. Pior: mesmo sem solavancos, basta o inexorável correr dos anos e o envelhecimento da população para revelar a absoluta insustentabilidade do nosso Estado Social. Não admira que António Costa esteja zangado com os professores e aproveite todas as oportunidades para explicar que o dinheiro não nasce do chão. Muita gente pensa que a sua vitória nas próximas eleições será o justo prémio pelos seus quatro anos de governo. Mas e se, em vez de prémio, for um justo castigo? 

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