Migrações e as decisões em falta

Será que o conceito de “migração económica” ou a ideia dos refugiados afastados pela guerra são suficientes para se compreender o que se passa neste mundo em movimento?

Como lidar com as tensões provocadas pelas migrações em direcção à Europa e aos Estados Unidos, acentuadas nos últimos anos? Este é um problema que nos consome entre o populismo nacionalista e xenófobo, o dever de solidariedade global e as necessidades de uma mão-de-obra indiferenciada e mais barata que também alimenta as economias desenvolvidas. E a migração vista pelos migrantes? Será que o conceito de “migração económica” ou a ideia dos refugiados afastados pela guerra são suficientes para se compreender o que se passa neste mundo em movimento?

Primeiro, a Europa. Sem crescimento económico e sem integração social dos emigrantes, não é possível qualquer vitória da decência política. E como nenhum dos primeiros parece assegurado, ou pelo menos assim o julga boa parte dos eleitores e dos novos políticos construídos a partir dessa percepção, é fundamental não apenas tomar decisões de urgência humanitária e de consenso mínimo – o que a União faz há mais de uma década perante o ultrapassar maciço e dramático da sua fronteira mediterrânica –, mas ser profundo, consequente e (ainda mais) corajoso na questão da imigração e dos refugiados. Como? Duas áreas parecem ser desde logo decisivas.

Por um lado, a dimensão da segurança e da prevenção criminal, inteligentes, sem criar estigmas de grupo. Porque sem respostas assertivas neste domínio, é impossível conquistar para a convicção moral uma opinião pública pronta a ser acicatada nos seus instintos mais primários. O novo e diferente é sempre um alvo de suspeita e de dúvida, não há como contrariar a natureza humana.

Por outro lado, há que olhar para estas pessoas com outros olhos que não os da visão burocrática das instituições. Os eleitores dos partidos anti-imigração não fazem muito diferente daquilo que as suas instituições preconizam: estigmatizam, olham de lado, procuram sempre dificultar e demorar, aceitam os impostos mas não dão autorizações de residência, inventam, na imensa arbitrariedade de que em geral gozam, regras novas e exigências kafkianas... São as primeiras muitas vezes a impedir a tal integração, uma palavra de político, e a remeter para a marginalidade e para os semideiros escusos vidas que têm de continuar, com papel ou sem ele. E assim dão, mesmo que involuntariamente, cobertura a um novo esclavagismo, tão legal como o anterior, que todos vemos, mas preferimos não recordar.

Também as imagens nos noticiários acabam por nos dar dos migrantes uma ideia de massa humana indistinta, aflita na sua indigência e desespero comuns. Mas as populações estrangeiras que chegam à Europa são profundamente diferentes e cada imigrante tem a sua história e tem a sua vida. Se se passar de uma ideia geral, necessariamente errada, para cada vida concreta, vamos descobrir génios e criminosos, gente com vontade de trabalhar e gente com vontade de nada fazer, oportunistas e crédulos. Somos afinal tão iguais, que bem sabemos que o medo do outro é o medo de nós próprios.

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