A vida dos actores, de Portugal no século XX e de uma empregada doméstica no Teatro Nacional

Pela voz de 35 espectadores foi apresentada esta terça-feira a temporada 2018/19 do Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa. E teremos no palco criações de Pascal Rambert, Gonçalo Amorim, Teatro Praga, Mohamed El Khatib, Miguel Loureiro ou Angélica Lidell.

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Teatro com Rui Mendes e Beatriz Batarda Filipe Ferreira
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A tecedeira que lia Zola José Caldeira
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The scarlet letter Bruno Simão

Da original apresentação da temporada 2018/19 do Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, que esta terça-feira delegou nas vozes de 35 espectadores o desafio personalizado para todos quantos os ouviam lhes seguirem o interesse de assistir aos espectáculos em causa, resultou a constatação de que são três os nomes que imprimem de forma carregada o seu nome durante os meses que se seguem na sala histórica do Rossio: Pascal Rambert, Gonçalo Amorim e Mohammed El Khatib.

Cada um terá uma presença reforçada ao longo do ano, vincando a construção de um caminho comum com os três autores. Aos poucos, com a apresentação de cada nova temporada desenhada por Tiago Rodrigues, vão-se tornando visíveis estas apostas – que, no caso de El Khatib, são reveladoras de uma vontade de construir uma relação no tempo.

Antes de assinar o espectáculo de abertura da próxima temporada, o dramaturgo e encenador Pascal Rambert, um dos nomes fundamentais do teatro francês contemporâneo, começa a estabelecer a sua ligação ao Teatro Nacional com a apresentação, a 15 e 16 de Julho, de Actrice, no âmbito do Festival de Almada. Desafiado pelo director do Dona Maria II a pensar num espectáculo para esta sala, Rambert decidiu trabalhar uma nova versão de Teatro, peça que começou a desenvolver em Moscovo, à medida que foi entrevistando dezenas de actores e descobrindo as suas vidas através dessas conversas. Entre 15 de Setembro e 14 de Outubro, é o resultado desse trabalho que surgirá através de actores como Rui Mendes ou Beatriz Batarda.

Teatro integrará também o habitual fim-de-semana Entrada Livre (15 e 16 de Setembro) com que o Nacional tem, nos últimos anos, festejado o arranque de cada nova temporada. Este ano, o aperitivo para os meses seguintes far-se-á com a peça de Rambert, mas também com a encenação de David Pereira Bastos para o clássico de Beckett À Espera de Godot, com um projecto de Tiago Rodrigues desenvolvido na Écola des Maîtres, com Um Espectáculo para os meus Filhos, de Rui Pina Coelho, leituras encenadas, concertos na varanda, feira do livro de teatro, exposições e actuações de DJ.

Depois de À Espera de Godot (até 7 de Outubro), que contará com Albano Jerónimo e Miguel Moreira no elenco, será a vez de o destaque recair sobre um ambicioso projecto com assinatura de Gonçalo Amorim e produção do Teatro Experimental do Porto. A sua Trilogia da Juventude abordará em três peças distintas a vida em Portugal nas décadas de 1950, 1970 e 1990, permitindo assim olhar para a História do século XX português no período do Estado Novo, na transição para a democracia e nos anos da governação de Cavaco Silva. Começando com uma resposta a um texto de António Pedro, a trilogia tem início com O Grande Tratado de Encenação (11 a 14 de Outubro), segue com A Tecedeira que Lia Zola (18 a 21) e termina com Maioria Absoluta (25 a 28).

No final de Novembro, será a vez do regresso de Mohamed El Khatib, que o público nacional começou a descobrir no Dona Maria II com Acabar em Beleza, em 2017. Volta o teatro íntimo El Khatib, primeiro com a muito delicada visita aos testemunhos de dois actores de idades e percursos muito diferentes, unidos pela dor da perda de um filho. C’Est la Vie estará em cena a 28 e 29, sucedendo-lhe Moi, Corinne Dadat, a 30 de Novembro e 1 de Dezembro, registo diametralmente oposto e focado na vida da empregada doméstica que dá nome ao espectáculo.

Novos clássicos

Uma das linhas programáticas fundamentais delineada por Tiago Rodrigues ao tomar posse como director do Teatro Nacional D. Maria II em 2015 foi a intenção de revisitar a história do teatro, servindo a dramaturgia clássica através de olhares contemporâneos. Toda a curiosidade, por isso, para perceber como o Teatro Praga vai responder a este desafio em Worst of (1 a 18 de Novembro). Partindo da opinião que se ouve em cada esquina de que as artes portuguesas sempre chegaram com atraso a todas as correntes artísticas determinantes ou que por aqui sempre se ficou aquém do que se produz lá fora, o Teatro Praga pega nestas ideias para revisitar a dramaturgia nacional.

A abordagem aos clássicos estará ainda presente no filtro que Miguel Loureiro aplicará a Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett (1 de Março a 7 de Abril), dirigindo um elenco em que contará com Álvaro Correia, Carolina Amaral ou Tónan Quito; e servirá ainda de mote ao primeiro de dois espectáculos do mini-ciclo Natal no Nacional, com Ricardo Neves-Neves a adaptar e a co-encenar ao lado de Maria João Luís Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll (27 de Dezembro a 6 de Janeiro). Do ciclo faz também parte Olá, Eu Sou o Pai Natal, de Tiago Barbosa (3 a 6 de Janeiro), construído a partir da experiência de dar corpo à personagem obrigatória no universo infantil em vários centros comerciais do país.

A temporada inclui ainda as estreias de Amores Pós-Coloniais, de André Amálio, Sequências Narrativas Completas, de João de Sousa Cardoso, assim como duas reposições de peso: Sopro, peça em que Tiago Rodrigues oferece o centro do palco à ponto do Nacional Cristina Vidal (11 a 19 de Janeiro), e Montanha-Russa, espectáculo em torno da adolescência criado pela dupla Inês Barahona e Miguel Fragata (23 a 27 de Janeiro).

A progressiva afirmação do D. Maria II como palco para importantes produções internacionais não foi descurada e terá como primeiro destaque Quartett, colaboração da companhia de dança ROSAS e do colectivo teatral tg STAN. O texto de Heiner Müller a partir de Ligações Perigosas, de Choderlos de Laclos, estará no Nacional de 11 a 13 de Dezembro. A 1 e 2 de Fevereiro será a vez da visita da essencial criadora espanhola Angélica Liddell aterrar também em Lisboa com The Scarlett Letter, espectáculo montado a partir da obra de Nathaniel Hawthorne, em guerra contra o puritanismo e contra os papéis e as convenções de género. A programação integra ainda Doreen (13 a 17 de Fevereiro), do francês David Geselson.

Uma estreia de laboratório

Desde a primeira temporada de Tiago Rodrigues à frente do Nacional que a programação da casa passou a incluir o ciclo Recém-Nascidos, espaço para a apresentação de jovens companhias nacionais. Em 2019, serão mais dois os colectivos e engrossar este grupo de novas propostas, com As Crianças Loucas a mostrarem de 11 a 13 de Janeiro E Todas as Crianças São Loucas; e, de 18 a 20 de Janeiro, o Colectivo Retorno levará a palco Uma Frida, texto de Sofia Santos Silva.

Por outro lado, Quarto Minguante, com texto de Joana Bértholo e encenação de Álvaro Correia, com apresentações entre 15 de Novembro e 16 de Dezembro, é o claro produto da aposta que o D. Maria II tem realizado nos laboratórios da nova dramaturgia portuguesa. Joana Bértholo frequentou a primeira edição, em 2016, e torna-se a primeira autora desse programa a ver um texto seu ganhar vida no palco do Nacional. Mas esta é apenas a parte da temporada que Tiago Rodrigues quis revelar por enquanto. Os meses de Abril a Julho de 2019 serão para descobrir mais tarde – pelas vozes destes ou de outros espectadores.

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