Irão, uma floresta ordenada

“Nenhum jogador é tão bom como todos juntos”. O pensamento, cuja validade resiste ao passar do tempo, é de Alfredo Di Stéfano e serve na perfeição para ilustrar o principal atributo da selecção do Irão — a organização defensiva. A equipa asiática é um exemplo de como se pode sobreviver no futebol de alta competição mesmo quando a diferença de qualidade é abissal, de como se consegue resistir um jogo inteiro na esperança de gozar de um ou dois momentos para especular. Razões suficientes para não desvalorizar um adversário que complicou (e muito) a vida à Espanha na segunda jornada.

Sejamos claros: a não ser que Carlos Queiroz promova uma cambalhota de 180 graus na identidade da equipa, o Irão vai apresentar-se diante de Portugal num bloco médio/baixo, a dar a iniciativa de jogo ao rival e a cerrar fileiras, em organização defensiva, na expectativa de que uma precipitação portuguesa permita activar uma transição rápida capaz de surpreender. Foi esse o plano de jogo usado frente à Espanha e foi assim que se dispôs maioritariamente no embate com Marrocos, embora nesse primeiro encontro tenha experimentado períodos de maior audácia.

A minimização do risco promovida pelos iranianos salta à vista através de diferentes indicadores. Na escolha das zonas de pressão: raramente ultrapassa a linha de meio-campo para condicionar a saída de bola, por forma a manter um bloco compacto, com a última linha nas imediações da grande área. No momento da construção: não tem por hábito projectar em demasia os laterais para não se partir numa eventual transição defensiva. Na variante do 4x2x3x1 que adopta quando não tem bola: um 6x3x1, gerado pelo recuo dos extremos até ao domínio dos laterais, sobrepovoando assumidamente os últimos 25 a 30 metros.

É óbvio que muita gente a defender não é sinónimo de defender bem, mas no caso do Irão as duas realidades conjugam-se. É uma espécie de floresta ordenada. Concedendo pouco espaço entre linhas e a bascular de forma agressiva e coordenada, a selecção de Carlos Queiroz obriga os rivais a circularem a bola rapidamente e a ensaiarem constantes trocas posicionais — obriga os rivais, acima de tudo, a serem pacientes.

Relativamente forte no jogo aéreo, com o central Rouzbeh Cheshmi (1,92m) à cabeça, controla bem essa dimensão e deve ser encarada com respeito nas bolas paradas ofensivas. Seja nos livres directos (batidos ora por Jahanbakhsh, ora por Haji Safi), nos cantos (Jahanbakhsh novamente) ou nos lançamentos laterais longos (assumidos por Amiri), os iranianos fizeram vários golos através de esquemas tácticos durante a fase de qualificação para este Mundial.

Sempre que recupera a bola, o Irão dá preferência ao corredor central, onde a ligação entre Ansarifard e Azmoun é a mais funcional, mas denota francas dificuldades em construir. E os problemas agravam-se quando a selecção asiática é pressionada na saída de bola, sendo muito raro arriscar uma progressão em apoio — a opção passa por bater longo para evitar dissabores.

Até porque, sempre que procura agigantar-se e subir linhas, expõe-se a um ataque à profundidade e esse é um dos seus calcanhares de Aquiles. O que significa que se Portugal conseguir atrair um pouco o adversário, convencendo-o a sair da toca, poderá encontrar o caminho para sair da floresta.

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