Uma borboleta bate asas na Turquia e o efeito sente-se no futebol alemão

Os turcos fora do país votaram mais do que nunca nestas eleições. Na Alemanha, país com a maior comunidade fora da Turquia, o debate atravessou a política e chegou ao futebol.

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Votação no consulado turco em Genebra, na Suíça MARTIAL TREZZINI/EPA

O número de turcos no estrangeiro a participar na eleição presidencial atingiu nesta votação um número recorde: 1,49 milhões, mais do que nunca, anunciou a comissão eleitoral turca.

Os turcos no estrangeiro votaram antecipadamente. A participação é ainda muito mais baixa do que entre os turcos no seu próprio país: só cerca de 50% dos turcos no estrangeiro votam, mas a importância destes eleitores tem vindo a crescer e o Presidente, Recep Rayyip Erdogan, tem tentado fazer campanha fora de portas desde o referendo do ano passado em que reforçou os poderes do chefe de Estado.

A recusa por vários países de comícios do Presidente, acusado de repressão no período após a tentativa falhada de golpe de 2016, tem levado a um azedar de relações da Turquia com vários países europeus, especialmente com a Alemanha, o país-chave da diáspora turca: é aí que vivem quatro milhões de turcos ou pessoas com ascendência turca e onde há o maior número de eleitores, 1,4 milhões.

Na Alemanha, o apoio de muitos turcos a viver no país a Erdogan é causa de surpresa. Quando muitos turcos votaram a favor de medidas consideradas anti-democráticas pelos padrões alemães (63% dos que foram às urnas na Alemanha votaram “sim” às alterações constitucionais propostas por Erdogan) no referendo ao ano passado, isso levou a um debate sobre integração e respeito pela Constituição alemã destes turcos, alguns com dupla nacionalidade. As autoridades turcas detiveram ainda vários cidadãos alemães, incluindo o jornalista Deniz Yüzel, preso durante mais de um ano.

O apoio a Erdogan de muitos turcos na Alemanha acontece por vários factores, desde uma tendência conservadora de parte da comunidade até sentimentos de exclusão num país onde são sempre vistos como “turcos-alemães” ou “alemães de origem turca”.

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Um cartaz alusivo ao caso das camisolas dos jogadores da selecção alemã no jogo Alemanha-México, no Mundial da Rússia Carl Recine/REUTERS

O caso Özil e Gündogan

Este debate chegou a um ponto alto nas últimas semanas, provocado por uma fotografia tirada num evento em Londres com Erdogan e dois jogadores da selecção alemã de futebol, Mesul Özil e Ilkay Gündogan, que jogam em Inglaterra (Özil no Arsenal e Gündogan no Manchester City). Os dois ofereceram camisolas assinadas a Erdogan; a de Gündogan era dedicada “ao meu Presidente”. Um boost para Erdogan; um catalisador para problemas na Alemanha.

Adeptos da selecção alemã assobiaram os jogadores em várias partidas; o ex-capitão Lothar Matthäus acusou Özil de “não se sentir bem” a jogar na camisola da selecção, o presidente da federação alemã de futebol Reinhard Grindel criticou o gesto e disse que os jogadores “se deixaram manipular” por um Erdogan em campanha.

As más prestações da selecção levaram muitos a culpar a falta de entusiasmo em campo da equipa a um alegado mal-estar pela fotografia.

Özil não falou em público mas Gündogan sim: disse tratar-se de um mal-entendido e de uma resposta cordial dos dois jogadores num evento de caridade para o qual foram convidados todos os jogadores com raízes turcas da Liga inglesa.

Em defesa dos jogadores saiu o seleccionador Joachim Löw, dizendo que quem tem raízes no estrangeiro tem por vezes “dois corações a bater no peito” e que “isto não é muitas vezes fácil de conciliar”.

Os dois jogadores encontraram-se entretanto com o Presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, e a chanceler, Angela Merkel. Merkel notou que os dois não mediram as consequências da acção e pediu “mais compreensão” e “palmas” para os jogadores.

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