E se Portugal jogasse de azul?

O vermelho será assim na sua assunção máxima, a cor do fogo e da vida. A cor da vitória. A cor dos melhores. O melhor usa o vermelho!

Sim, de azul!

Seria culturalmente possível?

A cor é um produto cultural. A cor não existe se não for percebida, isto é, se não for apenas vista com os olhos, mas também e sobretudo descodificada com o cérebro, com a imaginação, mas acima de tudo com a memória!

A cor diz-nos coisas, faz-nos sentir, dá-nos de estados de espírito e sensações. A cor é um magnífico e virtuoso veículo de emoções.

Se o vermelho é fogo, o branco é puro. Já o verde é fortuna, pode ser sorte ou azar. Mas será que sempre foi assim? As cores sempre tiveram o mesmo significado emocional? E historicamente? E porquê? E já agora... que cores?

A adopção de certas cores para determinados fins leva-nos a conotar cores com emoções e sensações, estados de espírito e pessoas. Certas cores são vitória, outras são a morte, algumas são alegria.

A cor é qualquer coisa de indefinível, mas que pode definir. O que se pode tentar esclarecer é o “fenómeno da cor”, ou seja, as condições de percepção a que somos sujeitos para compreender que a cor realmente existe. Se para uns a cor continua a ser apenas cor após ter sido registada enquanto tal (químicos e físicos), para outros a cor é luz. É um fenómeno cultural.

Uma cor que não é olhada, que não é vista, não existe. Os filósofos e os antropólogos defendem a luz enquanto cor. Defendem que a cor só existe quando a vemos passar na frente dos nossos olhos. Uma casa azul deixa de ser azul quando ninguém olha para ela.

Uma camisola deixa de ter cor, quando ninguém se interessou por ela.

O interesse aumenta quando a cor, a conjugação de cores ou de padrões coloridos nos contam uma história apenas com uma imagem, apenas com, imagine-se! com uma simples camisola.

Falo das cores que nos dão para além dessa história, uma ligação emocional, que nos dão nostalgia.

A Adidas e a Nike, as marcas mais presentes neste Mundial de futebol, dão-nos essa ligação emocional em pequenas doses de nostalgia através do design dos seus equipamentos.

Equipamentos inspirados em padrões cromáticos que evocam o passado, inspirados em anos que lembram o sucesso de cada uma das selecções que os envergaram.

Mantendo a sua cor original obviamente, a camisola da selecção alemã por exemplo, campeã em título, é uma versão contemporânea da camisola de 1990. Ano em que conquistou o troféu pela terceira vez e a última antes da vitória na edição de 2014.

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Boateng com a camisola da selecção alemã no Mundial deste ano Reuters

Já a selecção da Espanha, que venceu o Campeonato do Mundo em 2010, entrará em campo no próximo jogo com a sua habitual combinação de vermelho e amarelo, coberta por um padrão impresso em forma de diamante no lado direito, visto pela última vez nas suas camisolas no Mundial de 1994. Com um colarinho sobreposto, a camisola apresenta logotipo Adidas impresso no centro, como o era há 13 anos.

O equipamento do país anfitrião, a Rússia, é um redesign das camisolas usadas pela antiga União Soviética durante os Jogos Olímpicos de 1988 em Seul, onde contabilizaram 132 medalhas no total, incluindo 55 medalhas de ouro. E onde nenhum outro país conseguiu mais medalhas que os soviéticos.

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Denis Cheryshev, jogador da Rússia, durante o jogo de abertura do Mundial 2018 Reuters

Também a Nike seguiu este caminho da celebração e da evocação na criação dos equipamentos das selecções que veste.

Para a selecção do Brasil, a Nike desenhou uma camisola amarela, claro!, mas com um tom bastante dourado, “um ouro samba, vibrante, entusiástico”, o mesmo dourado que venceu o Mundial em 1970.

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O brasileiro Marcelo no jogo com a Suíça Reuters

A cor exacta foi selecionada após uma visita ao Museu do Futebol em São Paulo. A equipa de designers da Nike, liderada por Pete Hopkins, levou consigo um livro de amostras de cores e usou-o para encontrar as camisolas usadas pela selevção brasileira neste Mundial de 1970, que foi curiosamente o primeiro ano em que o campeonato foi transmitido em cores.

Também o sucesso de Portugal no Europeu 2016 não foi esquecido, tanto que, foi até reforçado nos equipamentos desde Mundial.

As nossas camisolas estão marcadas com salpicos comemorativos de ouro presentes nos números e no swoosh da Nike, fazendo-se acompanhar pelos tradicionais tons de verde e vermelho, mas neste caso ainda mais vibrantes. Apresenta ainda detalhes costurados no emblema, fazendo lembrar uma insígnia com detalhes ao nível das da heráldica da Idade Média, fazendo lembrar a nobreza, fazendo lembrar os seus destemidos cavaleiros.

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José Fonte e Bernardo Silva no jogo frente à Espanha Reuters

Hopkins afirma até que criou este equipamento a partir da ideia de "realeza moderna", para honrar o primeiro grande troféu internacional ganho por Portugal.

Estas camisolas dignas da realeza contam a história dos reis modernos do futebol que lideraram a equipa, desde Eusébio, Luís Figo e agora Cristiano, personagens icónicos que comandaram e uniram os plantéis dentro e fora das quatro linhas.

E é este o mais belo de todos os equipamentos. É esta a mais bela de todas as camisolas.

Segundo Goethe, um dos maiores teóricos da cor, o caminho a percorrer até ao azul é o “lado menos” do círculo cromático, é a aproximação ao mundo das trevas. Por oposição, o caminho entre o amarelo e o vermelho é o “lado mais”, temos então o vermelho no topo do mundo da significação e da simbologia, ou seja, o lado positivo do círculo.

O vermelho será assim na sua assunção máxima, a cor do fogo e da vida. A cor da vitória. A cor dos melhores. O melhor usa o vermelho! E se no o judo se utiliza a sobreposição do vermelho ao preto, esta arte marcial reforça a ideia de que o vermelho é uma espécie de “super cor”, a cor por excelência, a cor de todas as cores, a cor absoluta. A mais bela das cores!

E desta vez, mas só desta, falo da cor que é a de Portugal, e não a de outro clube qualquer!

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