Polícias só partilham 60% da informação de que dispõem

Plataforma que permite partilha de dados entre cinco órgãos de policial criminal só tem 272 utilizadores. Módulo que devia controlar acessos nunca funcionou.

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A força policial que percentualmente menos dados transfere para a plataforma é a PSP Bruno Lisita (arquivo)

A Plataforma para o Intercâmbio de Informação Criminal (PIIC), conhecida como o "Google das polícias" e que possibilita desde 2014 a partilha de dados entre cinco órgãos de policial criminal, só permite consultar 60% da informação disponível nos vários sistemas de informação da PSP, GNR, PJ, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e Polícia Marítima.

Isto porque a informação que consta no sistema de cada polícia para poder ser partilhada tem que ser exportada para a plataforma, o que nem sempre acontece. Segundo o último relatório do Conselho de Fiscalização do Sistema Integrado de Informação Criminal, divulgado em Abril, dos 59 milhões de dados existentes nos sistemas de informações daquelas cinco polícias, só 36 milhões estavam disponíveis na plataforma, o que significa 61% do total.

Mesmo assim, esta é maior percentagem de dados partilhados desde que a plataforma começou a funcionar, em 2014. No final desse ano, havia 42 milhões de dados disponíveis e menos de um quarto (nove milhões) estava acessível neste tipo de motor de busca. A comissão recorda que esse problema estava associado a outro “sucessivamente reportado” que era o da reduzida velocidade de exportação, um “processo permanentemente interrompido e reiniciado por anomalias de ordem técnica”. Em Junho de 2015, a percentagem subira para 40% e no final de 2016 ultrapassava os 55%.

A força policial que percentualmente menos dados transfere para a plataforma é a PSP, que apenas exportou 16,9 milhões dos 39 milhões de dados que possui. A Polícia Marítima e a GNR, com um volume de dados no primeiro caso de 700 mil e no segundo de 5,9 milhões, já têm a totalidade dos dados existentes nos respectivos sistemas acessíveis na plataforma. A Polícia Judiciária tem aumentado a transferência de dados e, em finais do ano passado, já partilhava 12,3 dos 13,3 milhões de dados que possuía no seu sistema.

O relatório nota que a necessidade de transferência de dados – a que chama indexação – resulta também da necessidade de alimentar a plataforma com as novas informações, operações que, diz o conselho, “evoluíram favoravelmente aproximando cada vez mais o volume de informação acessível pela PIIC do acervo de informação criminal detido pela globalidade dos órgãos de polícia criminal”. O documento refere que algumas polícias já o fizeram por completo, com “os procedimentos de actualização a decorrerem diariamente”. E completa: “Tal não ocorre em relação à PSP, o que se explica pelo enorme volume de dados a processar.”

O presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia, Paulo Rodrigues, conhece o problema e nota que a PSP chegou a deter 70% do volume de dados da globalidade dos cinco sistemas de informação (percentagem que está agora nos 66%). Desconhece que haja alguma intenção de não partilhar informação, mas nota que existem inúmeros problemas tecnológicos nesta polícia. Explica os 43 utilizadores credenciados na PSP devido a uma “certa desconfiança por se tratar de informação reservada”. Mas garante que quando os dados são pedidos através de um departamento próprio são “rapidamente” disponibilizados e, muitas vezes, de grande utilidade. O PÚBLICO solicitou este sábado um esclarecimento à PSP, que não respondeu em tempo útil.  

Menos de 280 utilizadores

No final do ano passado, a plataforma, que custou 1,2 milhões de euros, contava com apenas 272 utilizadores com diferentes níveis de acesso. Destes, 66 estavam na PJ, 57 no SEF, a GNR tinha 56 e a PSP 43. Fonte da PJ desvaloriza o baixo número de utilizadores, notando que se trata de uma plataforma com informação sensível que não deve estar ao alcance de todos. E realça a sua grande utilidade para aquela polícia.

O relatório dá conta de uma reunião com a secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, Helena Fazenda, responsável pela supervisão e segurança da plataforma, em que esta salientou “a importância fulcral” de candidatar a ferramenta informática a financiamento do Fundo de Segurança Interna tendo em vista “a resolução de problemas de ordem técnica que ainda subsistem e geram constrangimentos significativos” na sua utilização.

O PÚBLICO sabe que este ano foi submetida uma candidatura para financiar uma nova versão da plataforma, que implica um investimento que ronda os 800 mil euros. Esta já é a segunda candidatura apresentada, já que a primeira, realizada no ano passado, acabou gorada, segundo o relatório, “por falta de articulação adequada” por parte da Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros com a entidade que gere o fundo.  

Entre os problemas técnicos mencionados está, por exemplo, o módulo de auditoria que nunca funcionou. Este instrumento servia para registar todos os acessos à informação, dizendo quem consultou, porquê, em que processo, o que procurou e o que recebeu de volta. Para colmatar esta falha, a comissão de fiscalização acordou a realização por parte de cada polícia de um mínimo de duas auditorias por mês para verificar que a informação consultada não é usada para fins alheios à investigação criminal. O conselho de fiscalização analisa estas auditorias e faz visitas às polícias para avaliar o uso da plataforma.

O que também nunca chegou a funcionar foi um outro módulo que deveria remeter para os tribunais as autorizações para a consulta de informações em segredo de justiça (que não são directamente acessíveis). São problemas que o investimento nesta complexa plataforma – que permite a partilha de dados entre cinco sistemas que operam através de três redes de dados de três ministérios diferentes – deverá permitir resolver.  

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