Cartas ao director

Notas para uma reflexão

Os professores perderam autoridade na sala de aula e os encarregados de educação perderam-na na sala de jantar. Há um desprezo generalizado pela experiência de vida, cada vez mais substituída pelo Google, esse oráculo infalível capaz de todas as respostas em fracções de segundo. Os velhos são descartáveis, são chatos e não encontram um lugar confortável na hierarquia social do mundo contemporâneo.

Por outro lado, a voracidade consumista alcandorou os putos à categoria de consumidores. Desde que são capazes de influenciar os hábitos de consumo passaram a ser levados a sério. Na maior parte das situações passaram a ser levados demasiado a sério. As sociedades actuais tendem a valorizar os designados direitos do consumidor em detrimento dos direitos de cidadania. São coisas diferentes e nem sempre compatíveis. Não é nada extraordinário ver putos a berrar porque sim, a falarem por cima dos pais, a reclamarem tudo e nada só porque lhes apetece. E porque podem. Educamos as criancinhas num vazio de valores que tudo relativiza. E os encarregados de educação, muitas vezes porque perderam o pé, encontram nos professores os bodes expiatórios perfeitos para diluírem as suas próprias insuficiências.

Vivemos na sociedade da casa dos segredos e dos brunos de carvalho; uma sociedade boçal, carente de valores que possam irmanar-nos. Perdemos a religião enquanto factor unificador e não fomos capazes de a substituir por nada. A Ética não faz sentido sem uma divindade capaz de castigar os maus e premiar os bons. Ficou o consumismo. O resultado é o que está à vista. Mais adiante nem daremos conta que já não somos livres. Nem nada que se pareça.

Rui Silvares, Cova da Piedade

 

Atenção à Antena 1

Estarrecido é como se fica ao ouvir a crónica radiofónica de David Ferreira de quinta-feira. Mais do que lamentar a perda da presença, nos microfones da Antena 1, de António Macedo, um profissional que, ao longo de muitos anos, com a sua emblemática voz, nos tentou transmitir memória e entusiasmo, é doloroso saber-se que a nossa rádio pública, por estratégia ou negligência, se encontra num processo auto-destrutivo. Numa época de renovação tecnológica constante e obrigatória, os equipamentos degradam-se sem que existam investimentos de renovação para os emissores “presos por fios”, equipamentos de gravação e montagem obsoletos e até para elementos mais comezinhos como cadeiras (que rangem), paredes (que não isolam) ou aparelhos de ar condicionado (descontrolados). De facto, assim, não haverá futuro para a nossa rádio. Parece que alguém quer calar a Antena 1.

A saída de António Macedo da RTP, consumada num acordo judicial, foi o corolário de um processo que o locutor moveu à sua entidade patronal por precariedade, após 15 anos de recibos verdes. Daí a indignação de David Ferreira, ele próprio colaborador activo da Antena 1, que, num gesto de grande coragem, lançou um pungente SOS na sua rubrica diária na mesmíssima estação. A pergunta que colocou e repetiu faz todo o sentido: trata-se de estratégia ou negligência?

José A. Rodrigues, Vila Nova de Gaia

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