Quem vai alimentar e lavar os doentes? Auxiliares estão “exaustos”

Se não reforçarem as equipas, enfatiza o dirigente do sindicato dos técnicos auxiliares de saúde, isso poderá ter “consequências desastrosas no SNS. São, diz, "menos 12% de horas de trabalho”.

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Rui Gaudencio

Há uns anos chamavam-se técnicos auxiliares de saúde mas recentemente foram rebaptizados com a designação de assistentes operacionais. Apesar de serem um grupo profissional quase invisível, são muitos (cerca de 25 mil), são responsáveis por um grande número de tarefas nas unidades de saúde e uma parte substancial tem contratos individuais de trabalho.

Por isso, o presidente do recém-criado Sindicato Independente dos Técnicos Auxiliares de Saúde (que não está ligado a partidos políticos nem a centrais sindicais) calcula que seria necessário contratar 3500 novos profissionais em todo o país para colmatar a redução das actuais 40 para as 35 horas semanais de trabalho. Se não reforçarem as equipas, enfatiza o dirigente, Paulo de Carvalho, isso poderá ter “consequências desastrosas no SNS – trata-se de menos 12% de horas de trabalho”.

Depois de os sindicatos da Administração Pública terem negociado com o Governo o acordo colectivo que foi assinado por 36 hospitais EPE em todo o país e que fará com os trabalhadores deixem de estar em situação de desigualdade e passem também ao horário de 35 horas semanais, foi necessário fazer cálculos.

Paulo de Carvalho só vê duas alternativas -  “ou se fecham camas em enfermarias e serviços, ou se contratam, com carácter de urgência, mais profissionais”. A outra hipótese, que passa pelo aumento do número de horas extraordinárias, é quase uma impossibilidade. “Desde há anos que, de forma ilegal, [o trabalho suplementar] é depositado em banco de horas que jamais serão gozadas", alegando as administrações que isso não é possível devido "à falta de pessoal e à necessidade de manter os serviços a funcionar”.  No fundo, conclui, é “tapar um buraco com um buraco ainda maior”.

A falta de assistentes operacionais é um problema “grave”, enfatiza também o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares, Alexandre Lourenço, que lembra que, desde o tempo do ajustamento determinado pela troika, se ergueram barreiras à contratação deste tipo de profissionais, o que tem levado também a uma sobrecarga dos enfermeiros, que têm que desempenhar tarefas habitualmente levadas a cabo pelos primeiros.

Grupo profissional envelhecido

A agravar, nota ainda Paulo de Carvalho, o grupo dos assistentes operacionais está envelhecido e os doentes de quem têm de cuidar também. Há, destaca, "um aumento enorme de doentes internados com elevado grau de dependência" não só devido à idade, mas também "à múltipla patologia". Metade dos auxiliares (é assim que preferem ser designados) tem mais de 50 anos e 20 a 30% têm limitações físicas, acrescenta o dirigente sindical que lamenta "não ter visto da parte das administrações hospitalares sinais de que estão a preparar os chefes de serviço para elaborar escalas de 35 horas para o mês de Julho".

Com uma remuneração na ordem dos 580 euros mensais, os auxiliares “estão cansados, desgastados", fazem "turnos seguidos sem descanso", alguns chegam a suportar dois turnos de oito horas seguidas", e "sentem que não conseguirão ver aumentado o número de colegas num futuro próximo”. 

Se não houver um reforço, questiona Paulo de Carvalho, “quem irá alimentar os doentes?". "Quem tratará da higienização e desinfecção dos espaços, das camas, das roupas, das mesas de trabalho e tratamento? Quem tratará da higienização dos doentes? Quem irá ter com o doente a meio da noite a cada campainha que toca?", acrescenta. São perguntas que, diz, gostaria de "ver respondidas pelo ministro da Saúde". 

A este cenário "já demasiado negro" soma-se o facto de os novos profissionais (caso sejam contratados) terem de passar por "um período de integração de pelo menos um mês". Faltam duas semanas para o novo modelo entrar em vigor.

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