Balanço dos 12 trabalhos da Reforma da Floresta

A chamada reforma da floresta começou a tomar forma em 2016, tendo adquirido carácter de urgência em 2017 face à severidade dos incêndios. Foi aprovada no Parlamento em Julho do ano passado. São 12 medidas que se podem dividir em três grandes temas. Duas delas não viram luz do dia.

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Daniel Rocha

Reduzir o risco de incêndios

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Reduzir o risco de incêndios

1 - Programa Nacional de Fogo Controlado

O fogo é uma prática ancestral no país mas tem sido demonizado porque, feito sem controlo, pode provocar grande destruição, como se provou demasiadas vezes no passado. Mas, se bem usada, não deixa de ser uma arma eficaz contra os incêndios permitindo uma redução dos combustíveis de que estes se alimentam. O balanço, feito em Maio, indicava que teriam sido objecto de fogo controlado 5730 hectares e foram dadas autorizações para queimadas em 5386 hectares. Estes valores equivalem a 10% do objectivo estabelecido. As condições meteorológicas adversas foram a razão apontada pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Floresta (ICNF) para este fraco desempenho. Em meados de Maio teve início um projecto-piloto em nove municípios para avaliar as condições em que podem ser feitas queimas de amontoados e queimadas de terrenos de forma segura, com apoio da GNR. A intenção era alargar este projecto aos municípios com maior risco de incêndio até final deste mês e ao país todo até Outubro.

2- Alteração ao Sistema de Defesa da Floresta contra Incêndios

Este decreto vem actualizar a legislação sobre o mesmo assunto que data de 2006. São aqui atribuídas maiores competências às câmaras e há mais meios e actores no terreno, desde vigilantes da natureza a militares, passando pelos sapadores florestais (ver texto na página 2). A face até agora mais visível das alterações entretanto introduzidas foi a obrigatoriedade de limpeza dos terrenos em volta de habitações e aglomerados, tendo apertado as regras, sob pena de pesadas multas. Sabe-se que houve de facto muitas limpezas, mas ninguém sabe quantificar. Muitos receiam sofrer penalizações apesar de terem feito as limpezas, porque a chuva dos últimos meses potenciou o crescimento dos combustíveis finos (ervas) que entretanto secam e ficam prontos a arder. Já nos terrenos públicos, uma ínfima percentagem da floresta em Portugal, a Secretaria de Estado das Florestas avança que, no âmbito das acções em curso pelo ICNF e pelos municípios, encontram-se já executados cerca de mil quilómetros da Rede de Defesa da Floresta Contra Incêndios e cerca de 2300 hectares de gestão de combustível. Em análise estão 232 candidaturas a apoios, no valor de 17 milhões de euros, para a instalação da Rede Primária de Defesa da Floresta contra Incêndios em territórios de perigosidade muito alta.

Em fase de conclusão de análise, estão também as 39 candidaturas do projecto das cabras sapadoras — um total de 4900 animais. O objectivo é limpar 3000 hectares em 2018 e 20 mil hectares nos próximos cinco anos.

3 - Actualização do programa dos sapadores florestais

O apoio financeiro aos sapadores foi reforçado e foram abertos concursos para a constituição de mais equipas. Das 100 equipas previstas para 2018, estão já criadas 69, num total de 345 elementos. Foi ainda atribuída uma verba de 600 mil euros de apoio a fundo perdido para o reequipamento de 1000 sapadores. A distribuição das equipas no terreno terá em conta as zonas de intervenção prioritária em matéria de prevenção da floresta contra incêndios, zonas de maior valor patrimonial cultural e natural e áreas protegidas. O objectivo é ter no terreno até ao final do ano de 2019, 500 equipas de sapadores.

4 - Construção de novas centrais de biomassa florestal

A ideia é incentivar a limpeza da floresta canalizando material recolhido para centrais que o queimam e transformam em energia. É uma medida que gera grandes críticas, não só porque concorre com as indústrias que usam a madeira como matéria prima, como se corre o risco de se estar a queimar material de primeira qualidade já que os chamados sobrantes que resultam das limpezas das florestas não têm grande interesse, quer calorífico, quer económico. Foram aprovadas 11 centrais a biomassa. Estão já a ser construídas as do Fundão e Viseu, que deverão ser inauguradas em 2019, e já foi inaugurada a de Vila Nova de Famalicão. O governo está também a avaliar a transformação da central termoeléctrica do Pego de carvão para biomassa após 2021.

Gestão da floresta e ordenamento florestal

5 – Alterações ao regime jurídico dos Planos de Ordenamento, de Gestão e de Intervenção de Âmbito Florestal

A partir de agora, estes planos, que estão desactualizados há muitos anos, terão de de ser incorporados nos Planos Directores Municipais (PDM). Para que os Planos Regionais de Ordenamento Florestal sejam revistos foram implementados gabinetes técnicos intermunicipais pelas Comunidades Intermunicipais. No âmbito do concurso lançado para a criação destes gabinetes, financiado pelo Fundo Florestal Permanente, foram constituídos 20 Gabinetes Técnicos Intermunicipais. "O número de PROF nesta segunda geração passou de 21 para 7. A discussão pública está concluída para os de Lisboa e Vale do Tejo e do Alentejo, Entre Douro e Minho e de Trás-os-Montes. Está em curso a discussão pública do PROF do Algarve, seguindo-se a do Centro Interior e Centro Litoral", informa a secretaria de Estado das Florestas. 

6 – Criação do regime jurídico das entidades de reconhecimento das sociedades de gestão florestal

Face à extrema fragmentação da propriedade privada, que detém 97% da floresta em Portugal, o Governo quer incentivar a criação de condições para que haja gestão conjunta dos territórios. Um problema que afecta sobretudo o Norte e o Centro. Para isso, estão previstas duas novas figuras: as entidades de gestão florestal e as unidades de gestão florestal. Há incentivos fiscais e apoios do Fundo Florestal Permanente para a sua constituição. Está em curso até ao final de julho um concurso, no valor de 500 mil euros, destinado a apoiar a constituição de UGF.

7 – Simplificar a criação das Zonas de Intervenção Florestal

As Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) são outra figura, criada há mais de uma década, que pretende também separar a propriedade da gestão, garantindo que a última é feita com escala. Este tem sido um processo com muitos problemas. Agora reduziu-se a superfície mínima para 500 hectares e diminuiu-se o número de proprietários para 25. As autarquias assumem também aqui maior intervenção em parceria com uma organização associativa de proprietários e produtores florestais ou outra pessoa colectiva. A legislação prevê a atribuição de vários incentivos e benefícios fiscais às ZIF. Encontram-se em processo de constituição 95 novas ZIF.

8 – Alterações ao RJAAR – Regime jurídico aplicável às acções de arborização e rearborização

A principal alteração a este regime é a proibição de aumentar a área de eucalipto, colocando um travão a esta espécie. É a medida mais contestada pelos proprietários pois esta é das poucas espécies que lhes garante rendimento, o que pode potenciar ainda mais o abandono das terras e destruir o que resta da actividade económica de algumas zonas deprimidas. Como a medida foi anunciada com algum tempo de antecedência face à sua entrada em vigor, já este ano, houve uma corrida às plantações desta espécie no ano passado.

9 - Criação de uma Comissão para os Mercados e Produtos Florestais

Esta comissão tentará “conciliar estratégias de regulação de mercado no que respeita aos recursos florestais, designadamente através da monitorização permanente dos recursos florestais disponíveis e do acompanhamento das condições de mercado existentes, de molde a potenciar uma maior valorização dos produtos florestais e, consequentemente, a rentabilidade obtida com os mesmos". Visa sobretudo vigiar os preços face à posição dominante dos grandes grupos ligadas à floresta, com destaque para a Navigator, Altri e Sonae.

10 – Benefícios fiscais

Discussão no Parlamento adiada para Setembro.

Titularidade dos Terrenos

11 - Criação de um sistema cadastral simplificado

Sendo a propriedade maioritariamente privada, não saber de quem são as terras tem sido um grande problema para a gestão e criação de entidades como a ZIF. Já se tentou por várias vezes fazer este cadastro mas o trabalho é hercúleo. Agora foi implementado um  projecto-piloto em dez municípios: Pedrógão Grande, Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos, Góis, Pampilhosa da Serra, Penela, Sertã, Caminha, Alfândega da Fé e Proença-a-Nova. O registo destes terrenos será feito de forma gratuita, através do Balcão Único do Prédio (BUPi), que existirá em formato físico e electrónico. Segundo uma resposta dada há uma semana pelo Ministério das Finanças ao PCP, ao fim de oito meses sabe-se quem são os donos de 35,8% da área destes municípios. Uma importante fatia deste total incide sobre áreas públicas.

12 - Criação de um Banco de Terras

Medida chumbada no Parlamento.