A máfia roubou-lhe a liberdade. Agora revela-se ao mundo

Forçada a casar-se aos 14 anos com um filho de um chefe da máfia, Piera Aiello entrou no programa de testemunhas em 1993, passando metade da vida nas sombras. Agora quer ser um exemplo para as vítimas da máfia que vivem em medo.

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As imagens da deputada foram disponibilizadas ao jornal britânico MASSIMO PERCOSSI

Durante 25 anos, Piera Aiello escondeu a cara. Como testemunha contra a máfia italiana, Piera Aiello, de 51 anos, foi obrigada a passar um quarto de século no anonimato, não podendo mostrar a sua cara em público ou deixar-se ser fotografada. Ainda assim, e de forma anónima, concorreu a um lugar no Parlamento italiano pelo Movimento 5 Estrelas (M5S), na Sicília. A “candidata sem face” foi eleita em Março. Agora revela-o numa entrevista ao Guardian

“Depois de todos estes anos que passei na sombra, posso finalmente olhar para o mundo sem medo de mostrar a minha cara”, desabafou, enquanto era fotografada pelo Guardian. "Estou a regressar à vida. Neste preciso momento sinto-me completamente livre", descreveu.

Piera Aiello nasceu em Partanna, na Sicília. Aos 14 anos foi forçada a casar-se com o filho do chefe da máfia siciliana Vito Atria. Em 1991, um clã rival decidiu matar o marido de Piera Aiello. “Uma noite, dois homens entraram na nossa pizaria. Olharam para o meu marido e dispararam. Ele caiu à minha frente, coberto de sangue”, conta a deputada ao Guardian. Decidiu testemunhar contra os dois homens e as informações que contou às autoridades italianas conduziram à prisão de vários membros de grupos de crime organizado. No entanto, apesar das detenções, Aiello não ficou livre de ameaças. Por isso, e desde então, viveu sob o programa de protecção de testemunhas de vítimas da máfia.

Mudou de nome e deixou a terra onde nasceu. E assim se manteve durante 25 anos. Mas no último ano decidiu sair da sombra e candidatar-se ao Parlamento italiano. “Tinha um objectivo. Trazer até ao Parlamento as condições dramáticas em que aqueles que decidiram testemunhar contra a máfia são obrigados a viver”, conta ao jornal britânico.

Durante toda a campanha eleitoral apareceu de rosto coberto e escoltada por segurança. Mas conquistou a confiança dos eleitores. Agora, como membro do Parlamento, tornou-se mais difícil para Aiello manter-se afastada das câmaras, um risco do qual estava consciente. Aiello continuará a ser um alvo para a máfia italiana — e, paralelamente, continuará a ser escoltada por segurança. Apesar disso, a deputada quer servir de exemplo e encorajar mais testemunhas a falar.

Esta quarta-feira, Aiello regressou à cidade italiana onde nasceu para isso mesmo. Foi lá que se encontrou com outras testemunhas sob o programa de segurança.

“Decidi avançar para que aqueles que enfrentam a máfia não se sintam marginalizados. Decidi tornar-me candidata porque eu, Piera Aiello, queria a minha cara de volta. E agora tenho-a”, resume.

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