S+arck, o “pão líquido” de Philippe

A cerveja orgânica criada pelo reputado designer foi lançada há um ano. Uma “aventura pessoal”, a que Philippe Starck se atirou por “diversão” e pelo desafio de tornar a bebida “mais inteligente”, “saudável” e “elegante”, conta agora à Fugas. Em Portugal, está à venda no Hotel Sublime Comporta.

Licor, barba
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Miguel Manso
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É um dos designers mais reputados do mundo, com um portefólio que abarca milhares de projectos, desde peças de mobiliário ao icónico espremedor de citrinos, passando pelo desenho de hotéis, carros, barcos, aviões. Depois de quatro anos a trabalhar na receita em parceria com a Brasserie d'Olt, Philippe Starck lançou há um ano a sua primeira cerveja. Uma “aventura pessoal”, a que se atirou por “diversão” e pelo desafio de tornar a bebida mais popular do mundo “mais inteligente”, “saudável” e “elegante”.

“Tive esta ideia quase só por diversão. Só porque seria interessante criar uma cerveja, porque [a bebida] não é nada: é água, umas sementes e pronto. É uma pequena magia. Um pão líquido”, conta agora o criador à Fugas, à margem de uma apresentação do festival LUMINA em Cascais. Philippe Starck, que vive em Portugal há cerca de cinco anos, presidiu ao júri do concurso de design para a Iluminação do Percurso de Luz da próxima edição do festival (21-23 de Setembro) e acabava de anunciar a proposta vencedora (Cascais Floating Refraction, de Pedro Martins e Vitor Silva). Entre os discursos e as fotografias, circulavam copos e garrafas de S+arck, com o líquido dourado a sobressair entre a transparência minimalista do recipiente, também criado pelo designer francês.

Quando nos sentamos brevemente na esplanada para falar da cerveja, Starck começa por voltar atrás no tempo para explicar como chegou até aqui. Desfia uma sucessão de projectos alimentares – a marca de comida orgânica OAO, lançada no final dos anos 1990; o azeite orgânico LA; e os champanhes criados em parceria com a Maison Roederer – para nos contar que, afinal, o que sempre quis foi aproximar as suas criações o mais possível do corpo humano.

“Toda a minha vida criei objectos que são externos às pessoas: cadeiras, candeeiros, arquitectura, aviões, motas. Está tudo fora, mas o meu sonho sempre foi chegar o mais próximo possível de nós”, afirma. “Por isso fiz alguns perfumes, que já tocam na pele. Mas, para chegar mais perto, eu queria entrar [no corpo humano].” Daí a produção recente de azeite e de champanhe (este ano vai lançar um rosé sem açúcar e, no próximo, um sem açúcar e orgânico). E agora uma cerveja.

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Mais do que uma visão clara sobre aromas ou especificidades de produção, Starck tinha um “conceito abstracto” para aquilo que deveria defini-la: “Modernidade, elegância, leveza, amargura”, enumera. O que lhe interessava era o desafio de “pegar num produto popular, a bebida número um no mundo [em termos de quantidades consumidas], e torná-lo mais inteligente; aumentar a qualidade”. E produzi-lo de forma orgânica. Porque, para o designer, uma das personalidades internacionais que mais tem alertado para os problemas ambientais e para a importância de uma alimentação saudável, “tudo tem de ser orgânico”.

No caso da S+arck, o malte vem de uma quinta de produção biológica, enquanto a água é captada directamente das nascentes que correm junto à cervejeira Brasserie d'Olt, localizada em Saint-Geniez-d'Olt, no Sul de França. A receita é ainda composta por três tipos de lúpulo com aromas frutados – citrinos, ananás e frutas exóticas. O resultado é uma cerveja lager, de estilo Indian Pale Ale (IPA), leve e frutada, com um travo amargo e notas suaves a madeira. Não tem aditivos, corantes ou conservantes, nem passou por processos de filtragem ou de pasteurização, ficando-se pelos 5,2% de álcool.

“Mais do que ser orgânica, é a soma dos pequenos pormenores que faz a diferença”, defende Starck quando falamos sobre o processo de fabrico, inteiramente artesanal. “Quando se muda a cerveja de um tanque para outro, normalmente faz-se em tubos [com uma curva] de 90º. Os nossos são 'arredondados' para não danificar a cerveja nem alterar as moléculas”, exemplifica. Também não são utilizados mecanismos eléctricos para bombear o líquido de um tanque para outro – “é sempre por gravidade”.

Durante quatro anos, o designer trabalhou na receita com Sébastien Blaquière e a sua equipa da Brasserie d'Olt, fundada em 1998. "Fizemos o blend, misturámos, testámos e, depois, foi refinar, refinar, refinar." Só depois, recorda, desenhou a garrafa de vidro, "também num estilo muito moderno e elegante" para "dar oportunidade às mulheres de beberem cerveja". "A cerveja não é elegante o suficiente para as mulheres por causa das garrafas", defende. "Mas esta é muito clean, leve, branca." Se no copo a espuma que se cria denuncia o conteúdo, na garrafa facilmente a podemos tomar por um sumo ou uma água aromatizada.

Desde finais de Maio do ano passado que a S+arck se encontra à venda numa selecção restrita de espaços, a grande maioria hotéis e restaurantes gourmet. Em Portugal, para já, está apenas disponível no Sublime Hotel Comporta. Mas também é possível encomendar um conjunto de três garrafas (33cl) através do site da cervejeira – custa 12€ (mais portes).

Tal como aconteceu com as linhas de perfume e de champagne, Philippe Starck acredita que vai produzir novas cervejas. "Não há urgência, mas deveremos continuar", assume, para, um momento depois, soltar um "não sei, não é o meu trabalho". E remata: "O meu trabalho é a experiência. Não sou um designer, sou um explorador. E infelizmente para mim e para a minha família, tenho sempre uma nova ideia e faço-a. Pode demorar muito tempo, às vezes custa uma fortuna, mas faço sempre a experiência."

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