A prova de aferição de português “correu bem”, o pior foram os verbos

A Escola Básica Almirante Gago Coutinho adoptou a flexibilidade curricular em 2017. Apesar das preocupações com a adequação do conteúdo da prova de aferição às matérias apresentadas neste regime, os alunos dizem que “correu bem”.

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Daniel e Manuel são alunos do 5.º ano na Escola Básica Almirante Gago Coutinho, em Lisboa. Aos dez anos, um quer ser paleontólogo e o outro engenheiro informático. Mas ainda há muitos passos a dar até lá chegar. A prova de aferição de Português, que fizeram esta sexta-feira, foi o teste mais recente. “Correu bem”, dizem em uníssono ao PÚBLICO, lembrando que não conta para a nota da disciplina. A única dificuldade — para os dois — foram as questões relacionadas com os verbos regulares e irregulares. De resto, foi “fácil”, garantem.

As aulas do 5.º ano nesta escola não são iguais a todas as outras do mesmo grau de ensino. O Agrupamento de Escolas de Alvalade, no qual a Escola Básica Almirante Gago Coutinho se insere, é um dos que aderiu ao projecto da flexibilidade curricular em 2017 — que permite que as escolas passem a gerir 25% da carga horária semanal dos seus alunos e que foi aplicado apenas aos alunos no início de ciclo (1.º, 5.º, 7.º e 10.º anos). Este tempo é alocado à aprendizagem em torno de projectos e trabalho colaborativo.

Uma das professoras de Português desta escola (que não quer ser identificada) garante que “a prova [de aferição] estava dentro dos conteúdos leccionados no 5.º ano”. Mesmo a gramática que saiu na prova, algo que era uma fonte de preocupação para a professora, “era acessível” e não perguntaram nada que não tivesse sido leccionado. A docente lembra que o Instituto de Avaliação Educativa (Iave), que elabora as provas, já tinha garantido que "os conteúdos iam ter em conta" os alunos enquadrados neste regime mais flexível. 

Também a presidente da Associação de Professores de Português, Filomena Viegas, considera que a prova era "muito equilibrada", tendo mantido a "estrutura tradicional", ao mesmo tempo que introduzia "algumas novidades no tipo de exercícios propostos".

Quanto à própria flexibilidade curricular, a professora lembra que “este foi o primeiro ano”. A partir daqui, “vamos melhorando”. E realça que “o ensino para as crianças do século XXI tem de mudar”.

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A prova não conta para a classificação final dos alunos Rui Gaudêncio

Para a directora do agrupamento, Dulce Chagas, “as provas de aferição são importantes”. Particularmente este ano, “é importante trazerem uma mensagem relativamente a esta abertura que se pretende não só pela flexibilidade mas pelo perfil do aluno”. Essa mensagem, diz, deve focar-se na valorização da aprendizagem de processos e não de conteúdos. Ainda assim lembra que a flexibilidade curricular pode existir de formas “muito diversas” e que é um “grande desafio” que as provas de aferição captem essas diferenças.

Cada escola com o seu projecto

Um problema que se adivinha já para o próximo ano é o concurso de professores, que vai levar a novas alterações no quadro de docentes (que já tinha mudado no ano passado) desta e de muitas outras escolas. “Estes projectos fazem-se com as pessoas”, frisa Dulce Chagas. “O capital que se acumulou perde-se este ano.” “Eu vou ter outras pessoas que se calhar vêm de escolas que ainda nem sequer pensaram nisto ou que pensaram nisto de forma completamente diferente e vou ter de passar por um processo semelhante ao deste ano, em que passei o mês de Setembro a reunir com as pessoas”, lamenta a directora. 

“A flexibilidade permite, mais do que nunca, que cada escola tenha o seu projecto”, defende Dulce Chagas. “A sociedade mudou muito nos últimos anos e a escola claramente não tem conseguido acompanhar.” Cabe à escola “fazer um esforço” de modernização. A flexibilidade curricular “pode ser o acelerador dessa modernização de uma forma mais ou menos orientada e estruturada”. No entanto, “não obriga que as pessoas tenham de trabalhar todas da mesma forma”. 

Quase um ano passado da implementação desta nova forma de gerir o currículo dos alunos, a professora diz que a adesão dos alunos e dos professores “não é tão imediata como gostaríamos”. Mas uma coisa é certa: É “tanto mais positiva quanto mais novos são os alunos”.

A responsável pelo agrupamento de Alvalade admite que “não é verdade que todos os alunos tenham valorizado” esta nova forma de organização do currículo, especialmente os mais velhos. “Se não valorizaram, alguma coisa está mal. Se não conseguimos chegar a eles ao fim de um ano, temos de a repensar.”

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