"Donald Trump canadiano" conquista maioria para governar no Ontário

Partido Progressista Conservador regressa ao poder após 15 anos. Liberais caem para terceira força política e perdem o estatuto de partido oficial pela primeira vez em 161 anos.

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Doug Ford chegou à liderança do seu partido há apenas três meses Reuters/CARLO ALLEGRI

Ao fim de 15 anos consecutivos no poder, o Partido Liberal do Ontário foi quase varrido do mapa nas eleições de quinta-feira. O próximo chefe do governo da região mais populosa do Canadá chama-se Doug Ford, um conservador populista cujo discurso já lhe valeu comparações com o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

"Meus amigos, esta vitória é vossa. É a vitória do povo. Pessoas de todas as cores políticas reuniram-se à volta de uma visão comum para o Ontário", disse Doug Ford no seu primeiro discurso após o anúncio dos resultados, na noite de quinta-feira.

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Os conservadores tiveram 40,5 por cento dos votos Carlo Allegri/Reuters

Perante os seus apoiantes, lembrou também "a infuência" do seu irmão, o controverso mayor de Toronto, Rob Ford, que morreu em 2016. E, numa frase que reflecte a sua conhecida aversão ao "sistema", declarou que ele e os seus eleitores "recuperaram o Ontário" com "um governo para o povo".

O Partido Progressista Conservador do Ontário já não liderava os destinos da província desde 2003, mas este ano os eleitores decidiram virar os resultados eleitorais de pernas para o ar.

Não só os conservadores vão governar em maioria, com 40,5% dos votos e 76 deputados, como os liberais tiveram o seu pior resultado de sempre, com 19,6% e apenas sete deputados. Ao não garantirem a eleição de pelo menos oito deputados, os liberais perderam o estatuto de partido oficial na província do Ontário, o que acontece pela primeira vez nos seus 161 anos de história.

"Política grosseira e populista"

A grande figura das eleições é Doug Ford, um empresário com pouca experiência política que chegou à liderança do Partido Progressista Conservador há apenas três meses.

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Ford promete "facilitar a vida ao cidadão comum" Carlo Allegri/Reuters

Antes disso, pensou em seguir os passos do irmão e candidatar-se a mayor de Toronto – capital do Ontário e maior cidade do Canadá –, mas a demissão do anterior líder do seu partido, na sequência de um escândalo sexual, viu abrir-lhe uma porta maior.

Depois de garantir a vitória num congresso muito conturbado, onde teve a oposição da ala mais tradicional do partido, Ford partiu para uma campanha eleitoral assente em propostas consideradas populistas, como cortes nos impostos, nos preços dos combustíveis e nas taxas de emissões de carbono, e um aumento dos gastos com os cuidados de saúde – medidas que não conseguiu explicar de que forma serão financiadas assim que chegar ao poder.

Numa mensagem publicada no Twitter, na madrugada desta sexta-feira, agradeceu aos eleitores e proclamou: "Acabou a festa com o dinheiro dos contribuintes. Juntos conseguiremos voltar a pôr esta província nos carris."

Para além das promessas de tornar o Ontário grande outra vez, foram as suas promessas de "facilitar a vida ao cidadão comum" e os recorrentes ataques contra os media e as elites que lhe valeram comparações com o Presidente Trump.

"O que Doug Ford e Donald Trump têm em comum é um tipo de política grosseira e populista", disse Emmett Mcfarlane, professor de Ciência Política na Universidade de Waterloo, citado pelo Guardian.

Em 2014, quando era vereador na câmara de Toronto, Ford liderou uma campanha para encerrar uma casa da organização de solidariedade social Griffin Centre, onde viviam jovens com problemas de desenvolvimento, incluindo autismo.

Após queixas de moradores por causa de barulho e outros distúrbios, Ford disse que os jovens estavam a "arruinar a comunidade" e a "provocar a queda dos preços das casas". Quando lhe perguntaram porque tinha autorizado o Griffin Centre a instalar uma das suas casas nesse bairro, Ford respondeu que ninguém lhe tida dito que "as crianças autistas iam sair de casa" – uma frase que lhe valeu acusações de insensibilidade.

"Os eleitores do Ontário escolheram um homem que tem feito carreira a combater o statu quo", diz o jornalista Thomas Walkom num artigo de opinião no Toronto Star. "E, ao fazerem isso, deram-lhe carta-branca para ele fazer praticamente tudo o que quiser."

No mesmo jornal, o analista político Martin Regg Cohn fala numa "onda de populismo de direita na província mais populosa do Canadá", que marca também o início de uma batalha política entre um conservador no Ontário, um primeiro-ministro liberal em Otava e um mayor centrista em Toronto.

"Mas também põe o novo chefe do governo do Ontário em rota de colisão com os eleitores da província, que parecem estar mais divididos do que nunca. Apesar de Ford insistir na ideia de que fala em nome do povo, o povo está polarizado, e não há apenas um eleitorado", avisa o analista.

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