Cerca de cem famílias em risco de despejo num bairro junto à Base das Lajes

Até agora, apenas 13 famílias receberam ordem de despejo, mas no total vivem no Bairro de Santa Rita 99 famílias, que temem um desfecho semelhante.

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Nuno Ferreira Santos

Cerca de uma centena de moradores de um bairro ilegal junto à Base das Lajes participou numa manifestação na Praia da Vitória, nos Açores, depois de 13 famílias terem recebido ordem de despejo.

“Estamos aqui hoje a realizar uma manifestação para lutar pelo nosso direito constitucional à habitação. Iremos assistir nos próximos dias ao despejo escrupuloso de alguns moradores. Esta situação é um atentado à nossa comunidade”, adiantou, em declarações aos jornalistas, Lucas Almeida, porta-voz dos cerca de 600 moradores do Bairro de Santa Rita.

Nas décadas de 1950 e 60, a Força Aérea norte-americana na Base das Lajes alugou terrenos rústicos na zona de Santa Rita, onde entretanto construiu habitações, com autorização do Ministério da Defesa de Portugal, devido às lacunas que existiam no parque habitacional da ilha Terceira na época.

Há cerca de duas décadas, alguns militares norte-americanos decidiram vender essas casas a portugueses, apesar de os terrenos em que foram construídas não lhes pertencerem.

Segundo Lucas Almeida, os moradores sabiam que estavam a comprar apenas a casa e não o terreno, mas confiaram na boa-fé dos proprietários.

“Muitos dos antigos moradores abordaram os proprietários do terreno antes de comprar a casa. Os proprietários dos terrenos incentivaram: comprem que logo chegamos a um acordo e vocês compram o terreno”, revelou.

Nos primeiros anos, os moradores pagaram rendas aos donos dos terrenos, mas a partir de 2002, por recomendação da autarquia, deixaram de o fazer.

“Os moradores foram aconselhados a deixar de pagar renda porque era uma ilegalidade”, disse o representante, acrescentando que, “para todos os efeitos, segundo a lei, aquela construção não existe, mas fisicamente está lá”, e “muitos dos moradores pagam IMI [Imposto Municipal sobre Imóveis]”.

Segundo Lucas Almeida, os moradores estão dispostos a adquirir os terrenos, mas os proprietários não lhes dão essa opção.

“Nós não queremos que o Governo os compre e nos ofereça. Nós queremos comprar”, apontou, salientando que o executivo açoriano “não se pronuncia de forma alguma sobre esta matéria e tão-pouco presta apoio a esta comunidade”.

Por enquanto, apenas 13 famílias foram notificadas, mas no total vivem no Bairro de Santa Rita 99 famílias, que correspondem a cerca de seis centenas de pessoas, que temem um desfecho semelhante.

“Nós todos os dias conferimos as caixas de correio para ver quem é que recebeu ou não uma carta de despejo. E é muito triste receber uma carta a dizer que se tem cinco dias para sair de casa”, salientou Lucas Almeida.

Segundo o representante dos moradores, a autarquia da Praia da Vitória “tem sido incansável”, mas ainda não avançou com a expropriação dos terrenos, como prometeu o anterior executivo, caso não chegasse a acordo com os proprietários.

Depois de receber os moradores já notificados e uma comissão representativa de todos os moradores, durante cerca de duas horas o autarca, Tibério Dinis, disse que a prioridade, neste momento, é encontrar uma solução para as famílias que estão em vias de serem despejadas.

“Para já, a preocupação da câmara municipal é salvaguardar a situação do curto prazo destas famílias. Quando o último estiver salvaguardado, reunir-nos-emos com todos e apresentaremos um conjunto de soluções, porque aqui as soluções também têm de ser de alguma forma partilhadas”, salientou.

Segundo o autarca, há quatro casos em que não é possível recorrer da decisão, porque as notificações foram feitas no nome do norte-americano que lhes vendeu a casa, por isso a câmara vai “apoiar uma situação de curto prazo para que as pessoas não fiquem desalojadas, sem tecto”.

Nas restantes nove situações, a autarquia vai avaliar caso a caso para tentar um diferimento para situações sociais (baixos rendimentos, questões de saúde e população idosa, por exemplo).

“Para todos os efeitos, por muito que o tribunal diga que as pessoas não têm direito à casa, a verdade é que pagaram por elas e a verdade é que pagam impostos ao Estado português por elas”, frisou.

Segundo o autarca, a melhor solução seria a aquisição dos terrenos, mas “por valores que sejam dignos e justos”.

Os proprietários dos terrenos já exigiram cerca de seis milhões de euros pela área total, agora exigem cerca de três milhões de euros, mas o município alega que os terrenos estão avaliados em cerca de um milhão.

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