A juventude pode estar na água termal e nos ingredientes dos Açores

Miguel Pombo criou uma linha de cosmética para agir sobre as principais causas que provocam o envelhecimento da pele. Com água termal, mel, óleo de camélias e colostro dos Açores.

Fotogaleria

Esta história começa no vale das Furnas, na ilha de São Miguel, Açores, onde há uma grande concentração de nascentes e que, por isso, é considerada uma das maiores hidrópoles termais do mundo. À água, juntam-se as argilas vulcânicas, o veneno de abelha, o mel, o óleo de camélia-japónica e o colostro (o primeiro leite da vaca logo após o parto). Estes são todos os ingredientes que Miguel Pombo, 33 anos, utiliza na produção dos produtos Ignae, a marca de cosmética regenerativa que está a dar cartas nos EUA. 

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Esta história começa no vale das Furnas, na ilha de São Miguel, Açores, onde há uma grande concentração de nascentes e que, por isso, é considerada uma das maiores hidrópoles termais do mundo. À água, juntam-se as argilas vulcânicas, o veneno de abelha, o mel, o óleo de camélia-japónica e o colostro (o primeiro leite da vaca logo após o parto). Estes são todos os ingredientes que Miguel Pombo, 33 anos, utiliza na produção dos produtos Ignae, a marca de cosmética regenerativa que está a dar cartas nos EUA. 

“O colostro bovino dos Açores é mais rico do que os outros, porque as vacas vivem todo ano perto do mar e alimentam-se de erva de pastagem, sofrendo a influência dos ventos marítimos do Atlântico Norte. Isso leva a que o seu sistema imunitário seja mais forte, mais rico em anticorpos e factores de crescimento, que depois se reflectem na pele humana”, explica Miguel Pombo sobre um dos ingredientes que utiliza, enquanto conduz o seu carro, deixando Ponta Delgada para trás para se começar a avistar, de um lado, as vacas nas pastagens verdes íngremes da ilha, e, do outro, as escarpas que caem até ao mar.

A caminho do vale das Furnas – a cratera de um vulcão que está adormecido desde 1630 –, o empresário faz uma visita guiada à Culto para explicar como nasceu a ideia de usar os recursos naturais do local onde cresceu. Foi em 2009, a milhares de quilómetros dali, em Bruxelas, quando trabalhava numa consultora com clientes da área da cosmética. “Conheci compostos de cremes e verifiquei que havia nos Açores ingredientes parecidos com os que as marcas usavam, como a água termal e a areia negra”, conta. Então, deu consigo a pensar: “Por que não fazer o mesmo?” Desde pequeno que ouvia relatos sobre viajantes que chegavam em romaria para curar as maleitas da pele e problemas digestivos numa das 25 nascentes de águas termais do vale das Furnas, como a nascente do famoso tanque de água amarelada do Parque Terra Nostra, um ex-líbris de São Miguel integrado no Terra Nostra Garden Hotel, onde o empresário recolhe a água termal para fazer os seus cremes.

Foto

Miguel Pombo regressa aos Açores com as ideias a fervilhar, mas terá sete anos pela frente até criar uma linha de cosmética que actua sobre as principais causas de envelhecimento da pele. Passam-se anos entre a criação da empresa de biotecnologia Azores Life Science, dona da marca, o trabalho de investigação e os testes até acertar na fórmula para a primeira linha Ignae com quatro complexos – de dia, de noite, de olhos e sérum. Os produtos chegam ao mercado em finais de 2016.

Por exemplo, estão à venda no spa do hotel – eleito pela Vogue Holanda como um dos seis a visitar no mundo, este ano –, e são utilizados em tratamentos de pele no mesmo espaço onde também são propostos tratamentos de assinatura, como o ritual de boas-vindas, em que as mãos são mergulhadas em água, óleo essencial e ginkgo biloba, colhido no parque botânico – com 200 anos e milhares de espécies –; ou a terapia de relaxamento e redução de tensão muscular, feita no tanque de água termal ao ar livre, a uma temperatura entre 38º e 40º.

Em Portugal continental, os produtos podem ser adquiridos na cadeia de perfumaria Douglas; e já chegaram à Suíça, à Arábia Saudita e aos EUA, onde a conhecida “esteticista das celebridades” Joanna Czech, que já esteve nos Açores, cuida dos rostos de várias celebridades, entre elas a actriz Kate Winslet, a cantora Rihanna e a directora da Vogue US, Anna Wintour. “A Joanna tem sido embaixadora da Ignae nos EUA, e as vendas dispararam”, conta orgulhoso o empresário, enquanto aponta para o tanque termal do Parque Terra Nostra onde recolhe a água para fazer os cremes. 

Foto
Miguel Pombo

Aquela água, diz, “tem uma combinação única de minerais e oligoelementos, entre os quais selénio e zinco, que reduzem e atenuam, por exemplo, os danos causados pela exposição solar, sobretudo a radiação ultravioleta”. É originária de um aquífero que fica em cima de uma rocha ígnea (que deu o nome à marca Ignae) e chega à superfície a cerca de 38º. Miguel tem luz verde do grupo Bensaude, dono do Parque Terra Nostra e do hotel, para recolher a água. Este hotel foi considerado pelo World Travel Awards, os “óscares” do turismo mundial, como o melhor hotel-boutique português. “É considerado um dos melhores destinos do mundo”, realça Alice Melo, assistente da direcção da unidade hoteleira. 

Muitas nascentes, muitas prescrições

Antes de se decidir pela nascente termal do tanque do Parque Terra Nostra, Miguel Pombo analisou outras junto à zona das fumarolas vulcânicas, também conhecidas por caldeiras do vulcão das Furnas; e mais uma dezena de nascentes junto às antigas termas, agora transformadas num hotel. Por aqui podem ser vistas as grutinhas um e dois, as nascentes do Torno e as das quenturas, onde se lê o aviso “proibido lavar pratos, bilhas de leite e outros utensílios”. Há ainda, do outro lado da rua, junto à ribeira, a poça da Tia Silvina, para doenças de pele dos pés, e a nascente da Morangueira, para problemas digestivos, prescritas pela sabedoria popular. Ainda hoje, todas estas nascentes são um chamariz para turistas que mergulham as mãos na água quente e ficam admirados com o fumo, o sabor a ferro e a cor amarelada que fica no chão. “A utilização com finalidades terapêuticas das águas das Furnas remonta aos primórdios do povoamento de São Miguel”, informa Luís Cordeiro, fisioterapeuta pós-graduado em hidrologia, que estudou as águas das nascentes. 

Em tempos chegaram a funcionar alguns balneários medicinais, entre eles o de António Albuquerque, que foi transformado num posto de vendas de artesanato, a Loja Cooperativa Celeiro da Terra. Há ainda o Chalet da Tia Mercês, assim baptizado em homenagem à mulher que cuidou daquele espaço onde se faziam banhos de imersão. Hoje ainda estão por lá duas banheiras, que convivem com outros produtos como o chá verde, que fica com uma cor arroxeada quando feito com a água termal do Padre José – que ficou melhor do estômago só por beber daquela nascente que fica nas traseiras do chalet.

Foto

Dali vê-se uma paisagem de nuvens de fumo que se dissipam no ar, e no nariz entranha-se um intenso cheiro a enxofre. “Já estamos próximos da zona das fumarolas”, anuncia Miguel Pombo, enquanto caminha na direcção de mais uma nascente, esta de água gaseificada com sabor azedo. “Estamos a desenvolver outros dois produtos que utilizam um péptido (molécula composta por aminoácidos) extraído das bactérias que vivem nas fumarolas do vulcão das Furnas e que possuem propriedades regeneradoras”, divulga. 

Depois de ter analisado todas as nascentes, o empresário decidiu-se pelas águas do tanque do Parque Terra Nostra, “que é bacterologicamente pura”, justifica. A sua recolha é supervisionada por um técnico do Instituto de Inovação Tecnológica dos Açores (Inova), a entidade que analisa mensalmente 30 das 48 nascentes de água termal existentes nos Açores. “Fazemos análises químicas e microbiológicas de controlo para assegurar que têm condições para serem usadas pelo público”, explica João Carlos Nunes, director científico do Inova e doutorado em Geologia. Contudo, o também geólogo salvaguarda que, apesar de o saber empírico afirmar que a água amarelada do tanque do Parque Terra Nostra cura doenças de pele, tal só pode ser garantido depois de um estudo médico-hidrológico aplicado a utentes com doenças de pele. E monitorizado por um médico que comprova a cura, acrescenta. É o que vai ser feito no balneário termal da Ferraria, na outra ponta de São Miguel, com o fisioterapeuta hidrológico Luís Cordeiro e um médico. “Dentro de três ou cinco anos, as termas deverão ter classificação médico-hidrológica e legal da água para doenças músculo-esqueléticas”, assegura João Carlos Nunes, também professor universitário de vulcanologia. Por enquanto, só a água das termas do Carapacho, na ilha da Graciosa, está legalizada e classificada para o foro reumatismal. 

Nos seus produtos, a Ignae inclui ainda ingredientes como células estaminais de origem vegetal e péptidos em concentrações elevadas. Em breve vai lançar uma máscara de argila vulcânica e veneno de abelha dos Açores, também regeneradora, para esticar a pele; e está a extrair óleos essenciais de plantas como a criptoméria, com propriedades relaxantes, para incorporar numa nova linha de cremes para spa e numa de óleos essenciais para ambientadores domésticos. Como complemento aos cremes está prevista uma linha de suplementos alimentares. Tudo com ingredientes dos Açores. 

A Culto viajou a convite da Ignae, e ficou hospedada no Terra Nostra Garden Hotel a seu convite