José Pereira da Costa ou a ignorância política atrevida e insultuosa

José Pereira da Costa revela uma total ignorância da História e não percebe por que razão há uma separação entre socialistas e comunistas.

Hesitei em responder à insólita e inesperada “interpelação” que me foi feita no PÚBLICO de 21 de Maio por José Pereira da Costa, tão absurda ela me parece. O autor da interpelação – porventura em busca de algo excitante que lhe proporcione a notoriedade que de outro modo não consegue – quase que me intima a dar-lhe uma resposta como se eu tivesse de ir prestar declarações à PJ (felizmente a PIDE já não existe). Além disso, diz que me conhece “de perto” porque foi meu colega no Colégio Moderno quando lá estava a aprender “as primeiras letras”. O que me leva a concluir que eu não teria mais do que oito anos de idade, já era bom aluno mas tinha “zero em comportamento” (era aluno interno) e já dava alguns “toques” na “chincha” mas ainda não percebia patavina de política.

Ora, como não me lembro deste meu “interpelador” nessa altura (e até tenho boa memória visual) – e nem sequer me recordo de alguma vez lhe ter posto a vista em cima –, devo confessar, todavia, que não o reconheci quando, há já um par de anos, ele me contactou, dizendo que eramos “amigos” (não do “facebook”). Mas dei de barato que assim era, embora com estupefacção quando ele afirma que me conhece “de perto” por ter andado comigo na “primária”.

Mas a verdadeira razão que me leva a gastar um pouco do meu “latim” com José Pereira da Costa é a estúpida e ignóbil ofensa que ele faz a Mário Soares – morto em 7 de Janeiro de 2017 –, acusando-o de “se aliar à extrema-direita (...) com os ataques e o terrorismo desencadeado contra os partidos de esquerda, com o alto patrocínio de Spínola”. Trata-se de uma miserável provocação, bem ao estilo da vergonhosa campanha que a PIDE e a Legião Portuguesa fizeram contra Mário Soares no final da década de 1960 – pouco antes de Salazar o mandar deportar para São Tomé –, escrevendo em paredes e muros, por esse Portugal fora, entre outras, estas exclamações obscenas: “Soares turra! Matem-no!”

José Pereira da Costa revela uma total ignorância da História e não percebe por que razão há uma separação entre socialistas e comunistas, há mais dum século. Não deve saber muito bem o que foi o estalinismo nem as verdadeiras razões da dissidência de tantos militantes de esquerda que se afastaram dos seus partidos comunistas, por essa Europa fora, à medida que, no final da década de 1940, se tornaram conhecidos os crimes cometidos por Estaline. Também nunca terá lido o que escreveu Eduard Bernstein, em 1902, sobre Os Pressupostos do Socialismo e as Tarefas da Social-Democracia. E ainda menos aparenta saber o que foram, em Portugal, o PREC (Processo Revolucionário em Curso) e o “Verão Quente” de 1975. Se conhecesse tudo isto, não teria feito as perguntas ridículas e absurdas que me fez no seu lamentável artigo no PÚBLICO. E perceberia que Mário Soares não fez, nem nunca lhe passou pela cabeça fazer, qualquer aliança com a extrema-direita terrorista, apoiada, ela sim, pelos sectores mais radicais da Igreja Católica. Quer o PS quer o seu secretário-geral condenaram sempre os atentados perpetrados pelo ELP e outros grupúsculos de extrema-direita, durante o PREC de 1975.

É impressionante o caudal de disparates escritos com o atrevimento próprio dum ignorante que não tem a noção do ridículo e do absurdo em que está a incorrer. A evocação que ele faz de si próprio chega a ser patética, como patetas foram as cautelas que ele diz que tomou, com medo que um émulo português do general Pinochet lhe entrasse pela porta dentro. Patética é também a ideia de que, como ele diz, “poderíamos ter sido uma nova Jugoslávia aqui neste canto da Europa”. Para um “quidam” tão incomodado com a divisão entre socialistas e comunistas após o 25 de Abril, só a extrema ignorância da História explica que José Pereira da Costa não saiba que o “titismo” (de Tito, o marechal Presidente da Jugoslávia) foi considerado um “crime ideológico” pelos partidos comunistas ortodoxos, como o PCP, servindo de pretexto para expulsar militantes comunistas. Como meu pai, o matemático Virgílio Simões Barroso (na realidade expulso por motivos ocultos), mas que nem por isso deixou de ser comunista até à morte, aos 44 anos!

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