Serviços públicos, trabalho, cultura e CTT no congresso do PS
No Congresso do PS não se discutirá apenas a estratégia global do partido. Vários militantes de base e dirigentes apresentam moções sectoriais. O PÚBLICO sistematiza os temas nelas expostos.
São 24 as moções sectoriais apresentadas por militantes do PS ao 22.º Congresso do partido que se realiza na Batalha, entre 25 e 27 de Maio. Um número mais alto do que é costume em reuniões magnas socialistas, o que pode indiciar que os militantes querem debater e participar. Daí que a organização do Congresso esteja a ponderar encontrar espaço para que estas moções, além de apresentadas, possam ser também debatidas, o que normalmente não ocorre, transitando a sua discussão para a comissão nacional subsequente aos trabalhos congressuais.
A maioria das moções é de militantes de base, mas há uma apresentada por um membro do Governo, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, outras duas por deputados - Wanda Guimarães, antiga dirigente da UGT, e Paulo Pisco - e três da JS. Até o PS-Porto compareceu com uma moção sectorial.
Estado congregador
O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, apresentou uma moção, ontem divulgada pelo PÚBLICO, de que é segundo subscritor o vereador em Lisboa e presidente da FAUL, Duarte Cordeiro, em que é proposto que seja repensada a intervenção do Estado, de modo a que este se transforme em catalisador do desenvolvimento, congregando agentes públicos e privados. A fórmula encontrada é a de “missões colectivas”, avançando mesmo com a sugestão que o modelo seja usado para diminuir a dependência de Portugal das energias fósseis. A moção afirma a necessidade de a social-democracia defender que “o Estado deve, na sua acção, ser um mecanismo de redistribuição de rendimento e de protecção social, mas também de desenvolvimento e inovação socioeconómica”. Avançando com a ideia de “missões colectivas”, diz que elas serão “um processo mobilizador de vontades e de recursos, com uma arquitectura transparente”. Para garantir a transparência, prevê a criação de um organismo que institucionalize as “relações entre sector público e privado num espaço alargado com funções de coordenação, de comunicação e de deliberação que reúna representantes do Governo, da Administração Pública, das Universidades e centros de interface, das empresas e dos trabalhadores”.
Renacionalização dos CTT
O secretário-coordenador do PS Porto, Rogério Pereira, é o primeiro subscritor de uma moção que propõe a “renacionalização dos CTT”. Alertando para a degradação dos serviços postais desde que os CTT foram privatizados – um acto que caracteriza como ditado “por razões meramente ideológicas” -, a moção pede “a defesa da marca CTT no caminho da modernização e sustentabilidade responsável, reforçando a empresa como elemento fundamental e estratégico no desenvolvimento social e económico do país”. Outra exigência é a da salvaguarda “do futuro sustentável e respectiva criação de valor” dos CTT e do “seu estatuto de grande empresa a nível nacional e no mundo”. A garantia de “um Serviço Postal universal, acessível e abrangente” é outra das questões levantadas. Por fim, é pedido que seja evitado “a tempo a destruição irreversível da rede pública postal e o agravamento da degradação do serviço postal de qualidade”.
Precariedade e direitos
As questões do trabalho surgem em três moções, pela mão do líder da JS, Ivan Gonçalves, da deputada Wanda Guimarães, e de Paula Reis. Ivan Gonçalves centra-se na defesa dos direitos laborais e no combate à precariedade. Defende, por exemplo, a extensão da semana de 35 horas ao sector privado, pede a reavaliação do “vasto conjunto de vínculos temporários” laborais existentes e mais fiscalização.
Wanda Guimarães faz uma desenvolvida abordagem do trabalho precário relacionando-o com a nova sociedade digital e com as consequências das novas tecnologias e da robotização sobre o trabalho e o emprego. Lembrando que Portugal é, com a Espanha e a Polónia, o país com mais precariedade, alerta para o peso desta no sector privado. E pede, entre outras medidas, uma reanálise do Código Laboral que “regule de forma mais adequada as normas laborais de acordo com os novos desafios”. Paula Reis apresenta uma moção para que o regime de teletrabalho seja facilitado.
Em defesa do SNS
A defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS) é o tema da moção de Bruno Gomes que propõe uma reestruturação, apostando nas novas tecnologias e na transformação em holding. Na extensa lista de medidas que apresenta, refira-se que, ao nível da “aposta no capital humano”, advoga que “todas as carreiras existentes” sejam “assentes no mérito" e a progressão seja “associada ao desenvolvimento profissional e científico de cada um, atestado em concursos com provas públicas”. Propõe o fim dos “contratos individuais de trabalho, passando todos os funcionários a contratos de trabalho em funções públicas”. Quer ainda a “implementação da exclusividade no SNS, com a respectiva compensação remuneratória” e que “a contratação de recursos humanos por intermédio de empresas” passe a “residual, estabelecendo o limite de 3% das horas totais, por grupo profissional”.
Ensino superior gratuito
A instituição do ensino superior gratuito é a principal proposta da moção da JS, que tem o seu líder, Ivan Gonçalves, como primeiro subscritor. “Iniciar um processo de progressiva gratuitidade do ensino superior durante as próximas duas legislaturas, de forma faseada”, é a primeira proposta da JS, seguindo-se a definição de “um regulamento geral e uniforme de taxas e emolumentos para todas as instituições de ensino superior, com a fixação de valores máximos a cobrar”, o reforço da “democracia interna, a valorização dos processos de participação na gestão das escolas e o reforço do pluralismo nos órgãos de gestão”, a revisão do “regulamento de atribuição de bolsas de estudo” e a aposta “num plano nacional de habitação para estudantes deslocados”. Por sua vez, Rudolfo Caramez apresenta uma moção em defesa dos estudantes-trabalhadores para que não sejam prejudicados ao terem de mudar de faculdade devido à mudança de local de trabalho. Já João Catela é primeiro subscritor de uma moção que pede o regresso da Formação Cívica aos currículos escolares.
Apoio aos emigrantes
O deputado eleito pelo círculo da Europa, Paulo Pisco, é autor de uma moção em que defende mais apoio ao regresso dos emigrantes. Pede que “a administração pública, através dos ministérios respectivos, identifique os domínios relevantes para facilitar o regresso ao país dos portugueses residentes no estrangeiro”, bem como “sistematize esta informação e a disponibilize da forma mais ampla possível por via digital e através de brochuras nos postos consulares, câmaras municipais e serviços da administração”.
Serviço público de cultura
A criação de um “serviço nacional público de cultura” é proposta por Paulo Matos, que defende uma rede nacional de centros culturais descentralizada e coordenada com as autarquias. Advoga que seja instituída no Orçamento do Estado “a meta de 1%” para o sector, até ao fim da próxima legislatura. Pede ainda uma nova lei do mecenato, o “incremento da arte na educação”, a instituição de “concursos regulares, anuais e plurianuais de financiamento à criação artística”, o “fomento do associativismo cultural tradicional e de proximidade”, a “criação do orçamento participativo na Cultura”, o aumento da “efectiva aplicação de fundos europeus” nesta área e a “luta efectiva contra a precariedade”.
Economia Social
Há duas moções sobre a Economia Social, uma apresentada por Idalina Forte outra por Susana Ramos. Ambas defendem a aposta num sector que o PS elegeu como prioritário no último Congresso, tendo mesmo criado um Departamento Nacional da Economia Social. Idalina Forte centra-se nas IPSS, alerta que a rede de apoio a estas instituições está “em regressão”, lembra a responsabilidade histórica do PS em relação a este sector, referindo a governação de António Guterres, e pede que o Governo aposte neste sector. O mesmo objectivo é avançado por Susana Ramos, que apresenta diversas soluções concretas de apoio às instituições de Economia Social e centrando-se nas necessidades do sector cooperativo.
Protecção civil
A reestruturação da protecção civil é abordada pela moção que tem como primeiro subscritor Joaquim Gomes. A ideia central é a de que sejam unificadas as forças do sector. Questionando que estejam a ser multiplicadas as forças de combate a incêndios, defende que sejam reunidos “os conhecimentos humanos e o material existente, todos numa só organização de combate a incêndios florestais, urbanos e emergência pré-hospitalar”. Advoga ainda a unificação dos bombeiros.
Autonomia regional
O aumento das competências dos governos das regiões autónomas é defendido em duas moções. A de José Sousa pede mais poder na gestão do mar. A de Francisco César (que também subscreve a outra) pede que “sejam devidamente acauteladas as prerrogativas políticas e constitucionais das regiões autónomas” no processo de descentralização.
Voto electrónico
A adopção do voto electrónico para as eleições nacionais é a proposta da moção de Pedro Santos. Defende uma alteração à lei eleitoral para que o Governo possa introduzir “um sistema de voto via Internet”. E quer mesmo que o sistema esteja a funcionar nas legislativas de 2019 para os círculos eleitorais da Europa e de fora da Europa, sendo progressivamente alargado a todos os eleitores.
Regulamentar a prostituição
A JS insiste, mais uma vez, na necessidade da “regulamentação da prostituição”, numa moção que tem como primeiro subscritor o seu líder, Ivan Gonçalves. Lembrando que esta causa é defendida pelos jovens socialistas há dez anos, a moção propõe que o caminho a seguir escolha um de três modelos: o do trabalho independente, para o qual “bastaria uma alteração do crime de lenocínio”; o cooperativo, que obriga a “legislação especial e algumas alterações ao Código Cooperativo” e o de “trabalho dependente”, que “permitiria aos trabalhadores sexuais ter uma carreira contributiva igual à do resto dos portugueses” e a estarem protegidos pelo Código do Trabalho e pela contratação colectiva.