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Um retrato de “negligência e alienação” do Alentejo profundo

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O fotógrafo italiano Michele Pallazzi passou seis meses na região do interior alentejano, "em contacto profundo com a comunidade local". "A sensação que se tem, quando se vagueia pelo sul de Portugal, é que se vive em Finisterrae — no 'fim do mundo'. Os residentes desta periferia da União Europeia vivem esquecidos, como se subliminarmente vivessem num estado de conflito contínuo entre [o presente empobrecido e] o passado glorioso do país e da região", explica ao P3

 

O fotógrafo conta que "está instalado um estado de negligência e alienação" no Alentejo, cuja causa, acredita, encontra raízes na "actual conjuntura económica e social do país". Descreve um ambiente de "abandono e desânimo" vivido no interior. "A centralização da economia — causada sobretudo pela implementação de políticas europeias — fez com que as áreas periféricas sofressem um processo de abandono. Este processo incessante está a resultar numa alteração profunda do tecido social. São verificadas, na região, elevadas taxas de suicídio que estão também relacionadas com esse fenómeno", continua. "As famílias vão ficando desmembradas; os jovens abandonam a terra onde nasceram e os mais velhos e pobres, que escolheram permanecer na região ou simplesmente não tinham condições para migrar, vão ficando cada vez mais isolados."

 

Finisterrae, o projecto fotográfico de Palazzi, confronta os vestígios culturais da época da ocupação do Império Romano com o cenário presente. "Tive necessidade de desenterrar um passado tão profundo porque, na minha opinião, quanto mais retrocedemos no tempo, mais mitificada se torna essa herança histórica. Essa viagem ao passado permitiu-me retratar um mundo distópico e criar um ambiente ficcional que pudesse, metaforicamente, retratar o presente."

 

O projecto, que tem base documental e output ficcional, metafórico, já conheceu publicação na Burn Magazine, GUP e Lens Culture. Todos os trabalhos realizados por Palazzi têm por base uma exploração do presente através de uma lente histórica. "Confronto o homem contemporâneo com as suas origens", explica no seu website. "Investigo o passado para interpretar o presente", resume. É possível acompanhar o trabalho do fotógrafo através da sua conta de Instagram.