PSD e CDS tentam colar Governo de Costa ao de Sócrates

Pela primeira vez, as questões judiciais que envolvem Sócrates e Pinho chegaram ao Parlamento. A direita usou-as para atacar Costa, a esquerda para pedir medidas anticorrupção.

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Fernando Negrão: o líder parlamentar do PSD pressionou o primeiro-ministro com os casos Sócrates e incêndios LUSA/MANUEL DE ALMEIDA

Depois de Rio ter lançado para a agenda o caso Manuel Pinho e de isso ter proporcionado uma turbulência interna no PS, o PSD fez uma "pega de caras" e confrontou António Costa com o legado do seu antigo colega e ex-primeiro-ministro José Sócrates. Fernando Negrão, líder da bancada social-democrata, trouxe esta quarta-feira, pela primeira vez, o caso judicial para o Parlamento, para pedir explicações políticas.

O CDS-PP reforçou a ideia de colagem do actual Governo ao executivo que foi liderado por José Sócrates: há um ministro, Manuel Caldeira Cabral, da Economia, que era então assessor no gabinete de Manuel Pinho.

Com um PS ainda a digerir o anúncio da saída de Sócrates do partido, Negrão foi directo ao assunto: “Por que razão o PS demorou mais de três anos a demarcar-se de José Sócrates e do seu comportamento?” E seguiram-se outras: “Teve medo de ser contaminado eleitoralmente? Para o PS o que é mais importante? Os votos e as eleições ou os princípios e as convicções?"

Depois de três anos a medir as palavras, o líder socialista fez questão de despir a pele de primeiro-ministro e de secretário-geral do PS e de responder “como António Costa”. Nessa qualidade, Costa voltou a sublinhar a independência da justiça e a presunção da inocência. “Se [as acusações] não se vierem a comprovar, é a prova que o sistema de justiça funciona”, disse, deixando uma farpa a Fernando Negrão, lembrando que este também foi suspeito de violação de segredo de justiça no caso Moderna, enquanto magistrado.

Depois de rejeitar a acusação de “deslealdade parlamentar” lançada por Costa, Negrão associou o actual Governo ao de Sócrates, a que o actual primeiro-ministro pertenceu durante dois anos: “Afinal, a bancarrota foi culpa da crise ou resultado de nefastas decisões tomadas pelo Governo a que pertenceu?” A dúvida recebeu um forte aplauso da sua bancada, numa interpelação que gerou burburinho nas bancadas do PSD  e do PS. Não, “não houve qualquer mudança de posição sobre esta matéria”, concluiu o chefe de Governo.  

A colagem do actual Governo ao executivo liderado por Sócrates viria a ser reforçada pela líder do CDS que sugeriu uma auditoria ao ministério da Economia, tutelado por Manuel Pinho e agora liderado por um seu antigo assessor. António Costa refugiou-se na investigação criminal que considera ter “instrumentos mais intrusivos” do que uma auditoria.

Com o tema da justiça na agenda, Assunção Cristas não hesitou em lembrar que Costa pertenceu ao executivo de Sócrates no início – e houve “colegas que fizeram parte durante bastante mais tempo e até ao fim” –, para lançar a dúvida sobre a surpresa agora assumida pelas acusações de corrupção - “porque ninguém viu nada, ninguém ouviu nada, ninguém se apercebeu de nada".

O PS passou pelo assunto da corrupção da mesma forma que pelo dos incêndios: nem uma palavra. Mas o resto da esquerda abriu a porta ao reforço ao combate, com o Bloco a desafiar os partidos para legislarem novamente sobre o sigilo bancário. E o líder comunista foi um pouco mais longe. Apesar de haver “gente séria em todos os partidos” e de defender uma “apurada e célere investigação” a casos como o de Pinho, Jerónimo de Sousa pediu um compromisso do Governo para um combate sério à corrupção, legislando-se sobre o enriquecimento injustificado, os offshores, o combate à criminalidade fiscal, o reforço dos meios de fiscalização, ou para impedir membros do Governo de transitar directamente para os grandes grupos económicos.

Como se estivesse a distanciar-se da colagem a alegados casos de corrupção que a direita tentara deixar no ar, Costa aproveitou para passar a mensagem de que aplaude legislação anticorrupção e lembrou que, como o próprio foi verificar, várias leis em vigor nesta matéria são da sua autoria enquanto ministro da Justiça de António Guterres.  

Preocupação com floresta

Se foi ao ataque que Negrão começou, foi da mesma forma que mudou de tema. Quis saber se Costa se demite, caso haja problemas com os incêndios deste Verão. Na tese do primeiro-ministro, a solução de um governante perante um problema “não é demitir-se, é resolvê-lo”.

À esquerda e à direita, Costa foi confrontado com o atraso ou a falta de meios de combate aos fogos. Em resposta a Heloísa Apolónia, do PEV, o chefe do executivo assegurou que os equipamentos para o GIPS (Grupo Intervenção Protecção e Socorro) em falta – como PÚBLICO noticiou esta quarta-feira - chegarão até meados de Junho.

A mensagem do “esforço” que está a ser feito para evitar novas tragédias foi sublinhada nas respostas do primeiro-ministro que, no entanto, nunca se referiu à demissão do comandante operacional da Protecção Civil, António Paixão, mesmo se lembrada por quase todos os grupos parlamentares. O primeiro-ministro garantiu que os meios aéreos estão prontos a actuar se necessário sem o visto prévio do Tribunal de Contas.

Assumindo “preocupação” pela época dos incêndios que se avizinha, António Costa escudou-se nas condições e limpeza da floresta: “Até podemos ter o dobro dos GIPS, dos bombeiros voluntários e dos meios aéreos, mas se as condições no terreno não forem alteradas…”

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