Câmara começa a proteger repúblicas de aumentos de renda

Dezoito casas de estudantes e três lojas entregaram candidatura a novo regime, mas para já só vão duas a votação na reunião do executivo.

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Sérgio Azenha

Dois meses depois de ter sido aprovado o dispositivo de reconhecimento de entidades de interesse histórico e cultural ou social local, a Câmara Municipal de Coimbra (CMC) vai  analisar as duas primeiras candidaturas na reunião de executivo desta segunda-feira. No entanto, aos gabinetes da autarquia já chegaram 18 pedidos de reconhecimento por parte de repúblicas e três por parte de lojas históricas.

De acordo com a lei 42/2017 que actualizou o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), se uma entidade vir aprovado pelo município o estatuto de interesse histórico e cultural ou social local, passa dispor de mais cinco anos de protecção, sem que o senhorio possa opor-se à renovação do contrato.

De acordo com a legislação, estas entidades passam também a ter acesso a programas municipais ou nacionais de apoio, sendo que os arrendatários “gozam de direito de preferência” no caso da venda do imóvel que podem exercer em 30 dias. Os proprietários dos imóveis passam também a aceder a “benefícios ou isenções fiscais a conceder pelos municípios”.

Em resposta ao pedido de informação do PÚBLICO, o gabinete de comunicação da autarquia explica que apenas duas candidaturas de casas de estudantes a este estatuto vão ser votadas na reunião: as das repúblicas dos Fantasmas e Rápo-Táxo. Isto  porque os serviços camarários “ainda não tiveram tempo de analisar todos” os processos. Só na sexta-feira da semana passada deram entrada quatro pedidos, adianta a câmara.

Relativamente às lojas históricas, dos três pedidos que deram entrada a autarquia refere que dois “não tinham informação suficiente que justificasse a classificação”, pelo que foram indeferidos. Apenas a candidatura da Casa da Sorte, em Coimbra desde 1948, se mantém e deverá ser analisada numa das reuniões de executivo seguintes, juntamente com os restantes processos da repúblicas, com a “máxima celeridade possível”.

Localizadas no Bairro Sousa Pinto, as repúblicas dos Fantasmas e Rápo-Táxo enfrentam maior pressão. Nascidas em 1969 e 1956, estão instaladas no mesmo imóvel que estava à venda, tendo recentemente surgido um comprador. Soraia Freitas, da Rápo-Táxo, explica que a república exerceu o direito de preferência, estando agora em negociações com o senhorio para a compra do imóvel por 400 mil euros. Mas a única forma de o fazer é com recurso a um empréstimo bancário, com garantia dos antigos repúblicos, afirma.

A questão da propriedade ainda afecta grande parte das 25 repúblicas de Coimbra, uma vez que apenas quatro são proprietárias dos imóveis que ocupam. A aquisição mais recente foi a da República da Praça, que recorreu a empréstimo bancário para comprar um imóvel, depois de ter sido despejada em 2015. Há ainda três repúblicas alojadas em imóveis da Universidade  de Coimbra e uma outra que é propriedade da autarquia.  As restantes 17 têm senhorio.

Mecanismo pode ser insuficiente

A república 5 de Outubro fechou as portas em 2013, depois de a renda do apartamento que ocupava ter aumentado 6000%, de 12,5 para 764 euros por mês. Na prática, o reconhecimento de repúblicas pela autarquia como entidade de interesse histórico e cultural ou social local vem resolver temporariamente o problema do aumento da renda, mas não protege as repúblicas de outras situações.

Diogo Barbosa, da república dos Inkas, sublinha isso mesmo. “A lei, em si, não resolve o problema estrutural”. A alteração à lei no NRAU de 2017 impede a actualização de rendas por um período de cinco anos a entidades que vejam o seu papel cultural ou histórico reconhecido, mas Diogo Barbosa adverte que a lei “não impede os despejos” e pede que sejam tomadas outras medidas de protecção.

O período de cinco anos dá uma folga aos estudantes para encontrar outra solução. Já há casas que se estão a organizar e a tentar recolher fundos para comprar o próprio imóvel, refere. Contudo, a aquisição da própria casa, mesmo com recurso à banca, nem sempre é fácil, uma vez que a maioria dos edifícios está localizada em zona classificada ou de protecção da UNESCO, onde os preços ascendem muitas vezes a centenas de milhares de euros.

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