Gul seria o perfeito anti-Erdogan, mas a oposição não o convenceu

Posicionam-se os candidatos para as presidenciais turcas antecipadas. Líder curdo Demirtas, mesmo detido, quer concorrer.

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O ex-Presidente Abdullah Gul poderia ganhar uma segunda volta face a Erdogan Kemal Aslan/REUTERS

A Turquia vai a votos mais uma vez a 24 de Junho, numas eleições que foram antecipadas em mais de um ano, e vai votar sob o signo das alianças pré-eleitorais. Se o partido de Recep Tayyip Erdogan se aliou aos nacionalistas de extrema-direita para tentar garantir a vitória, a oposição formou um bloco heterogéneo. Mas falhou na missão de apoiar um candidato único à presidência, embora toda a gente na Turquia saiba quem poderia ser o único político com reais hipóteses frente a Erdogan: o ex-presidente Abdullah Gul.

O Partido Republicano do Povo (CHP, centro-esquerda), o maior da oposição, admitiu apoiar Gul – que, na verdade, é um dos fundadores do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), com Erdogan, de quem se tem distanciado, assumindo posições muito mais moderadas.

"Há 60 a 65% de eleitores nacionalistas ou conservadores na Turquia. A maior parte tem um preconceito anti-CHP. Por isso é que a direcção do partido admitiu seriamente a hipótese Gul. Em todas as sondagens, ele é a única figura capaz de derrotar Erdogan", disse Asli Aydintasbas, do European Council on Foreign Relations, na sua coluna no jornal Cumhuriyet.

May 4, 2018/ Erdogan is still so angry at Abdullah Gul, despite Gul did not run on SaadetParty ticket. If Gul decided to run, he could have done a lot of damage to the Erdogan machine">

Mas terão vencido as divisões no seio desta aliança pré-eleitoral, que junta o novo partido nacionalista que disputa o voto da extrema-direita, o Partido do Bem (Iyi, cuja líder, Meral Aksener, está  a recolher assinaturas para se candidatar à presidência), e a pequena formação pró-islâmica Partido da Felicidade.

Foi o próprio Gul quem anunciou que não iria participar nas eleições – embora tenha  sido noticiado que o chefe do Estado-maior das Forças Armadas aterrou de helicóptero no jardim do ex-Presidente para o impedir de anunciar a candidatura, escreveu no Al-Monitor Pinar Tremblay, professora convidada na Universidade Politécnica da Califórnia em Pomona.

Outro nome acabou por ser escolhido pelo CHP: Muharrem Ince, um professor de Física do ensino secundário de 53 anos, sem a capacidade de união que teria Abdullah Gul.

Numa segunda volta com Gul, o Partido Democrático do Povo (HDP), pró-curdo, que tem sido alvo de intensa perseguição, poderia apoiá-lo. Mas não abdicou de apresentar o seu próprio candidato – Selahattin Demirtas, detido desde Novembro de 2016 sob acusações de terrorismo, como muitos outros deputados e autarcas a minoria curda.

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Selahattin Demirtas está preso desde Novembro de 2016 SEDAT SUNA/EPA

Se Demirtas, líder do partido até Fevereiro, for considerado culpado pela Justiça turca de todos os crimes de que é acusado, poderá ser condenado a 142 anos de prisão.

Advogado, conhecido como o "Obama curdo" e com a aura de ser um dos poucos interlocutores autorizados a visitar na prisão Abdullah Öcalan (o líder do ilegalizado Partido dos Trabalhadores do Curdistão, considerado uma organização terrorista,  preso desde 1999), Demirtas teve 9,8% dos votos quando se candidatou em 2014 contra Erdogan. É um dos poucos rostos novos e influentes na política turca nos últimos anos.

Mas não é sequer claro como poderá ser autorizado a apresentar a sua candidatura – e muito menos como poderá fazer campanha a partir da prisão de Edirne, perto da fronteira com a Bulgária e a Grécia.

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