A economia da partilha e a regulação

O veto de Marcelo Rebelo de Sousa vai obrigar necessariamente a uma análise à economia da partilha e à discussão política do caminho a tomar.

Marcelo Rebelo de Sousa devolveu ao Parlamento aquela que ficou conhecida como a “lei da Uber”. É um sinal dos tempos, porque reflecte a tensão crescente entre o Estado e as possibilidades económicas abertas pela sociedade digital. A economia da partilha, como bem aponta Paul Mason na entrevista que hoje publicamos, tem sido disfarçada por projectos de monopólio apoiados por fundos de investimento americanos que praticam dumping de preços e colocam em risco negócios instalados.

Não estamos exactamente nessa fase em Portugal e, na verdade, poderemos nunca vir a estar. A Uber e as outras plataformas têm sido importantes na criação de trabalho independente, até porque o seu crescimento coincidiu com o aumento exponencial do turismo – e com uma teimosa recusa dos táxis em qualificar o serviço que prestam, apesar dos crónicos problemas que têm. Aliás, o veto toca precisamente neste aspecto, ao propor a revisão do serviço de táxi. E esse é o melhor caminho, porque nem todos os defeitos da Uber alguma vez chegarão para equilibrar a grande vantagem que teve: expor quão fraca é a qualidade do serviço de táxi prestado em Portugal, muitas vezes com carros decrépitos, motoristas sem preparação e acusações repetidas de sobrefacturação, somando-se a isto os arcaicos mecanismos de concessão de licenças a preços milionários e as suspeitas de cartelização regional.

É portanto óbvio que a situação em Portugal é diferente no que toca ao confronto entre táxis e Uber – mas este primeiro veto vai obrigar necessariamente a uma análise à economia da partilha e à discussão política do caminho a tomar. Será provavelmente uma discussão a decorrer essencialmente em Bruxelas, até porque ela mexe no âmago do projecto social europeu. Estão em questão aspectos como a livre iniciativa, a economia paralela e a capacidade e vontade dos estados em permitir emprego e rendimento à grande maioria da população. E na verdade esses projectos de economia de partilha, a serem genuínos, poderão merecer protecção – desde que se previnam as consequências dos mesmos.

O que está a acontecer em Lisboa e no Porto com os arrendamentos de curta duração a turistas tem a lamentável consequência de matar os centros das cidades e de escorraçar gerações inteiras para fora dos centros urbanos. É algo que tem de ser regulado, não só pelas câmaras mas pelo poder central – e a absoluta inação a que temos assistido é uma prova das dificuldades que estes modelos económicos descentralizados provocam. Falta saber quem se responsabiliza por isto, porque as consequências das opções tomadas terão de ser assacadas a alguém.

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