Cartas ao director

Carta aberta à administração da CP

Começo por afirmar que acho admirável o mundo dos comboios e não os maço com incursões históricas e eruditas sobre o assunto. V. Ex.ªs conhecem por certo melhor do que eu a História dos comboios e diria mesmo que  vivem não só o comboio contemporâneo, como têm um pé assente no comboio do passado, na própria História. E, o que é mais, mergulham com afã os vossos utentes nos profundos subterrâneos dela, porventura numa ânsia de os impregnar de pátrio e férreo zelo.

Vem isto ao caso de ter, juntamente com um familiar, viajado para Caminha no dia 20 p.p. no comboio que oficialmente parte de Campanhã às 13h. Não partiu às 13h. Às 13h chegou à linha 3 uma composição de duas carruagens coloridas, suponho que dos anos 40 ou 50, rebocadas por uma máquina diesel. Foi-nos dito depois que era um “comboio para turistas” proveniente da Régua. Os passageiros – umas dezenas - aguardavam com o nervosismo próprio destes momentos, quando, por entre uma vozearia proveniente dos altifalantes, avultou a ambicionada palavra “Valença” e um funcionário da CP mandou os passageiros entrar.

Entrámos e deparamo-nos com o facto de irmos viajar de costas. Não havia hipótese de virar os encostos. Ó meus senhores, já viajaram assim, como um exército que marchasse às avessas para a linha de batalha? Como se o comando à partida desse ordem para a derrota (em posição de fuga!)? Não me levem a mal mas viajar cerca de 100km às avessas provavelmente altera um pouco o bom senso. Estou certo também de que fazem o melhor que podem com o que vos é providenciado pela História e pelos governos.

A carruagem em que viajámos não era iluminada. Nos túneis (era ainda dia) tínhamos a treva. Viajar assim é viajar no tempo. Uma ambição suprema da humanidade. O turista exultará. Com tudo isto, com o fecho de linhas tão importantes como as que ocorreram nas últimas décadas, não estou certo de conseguirmos com V. Ex.ªs chegar ao futuro e havermos de baixar as expectativas ao ecológico murzelo e ao pouco ecológico automóvel!

Ricardo Lima, Porto

 

'Foi bonita a festa, pá!'

O 25 de Abril é como o 25 de Dezembro. Só acontece uma vez por ano, triste facto, triste fado. Hoje, a poesia está na rua. Toda a gente faz belíssimos discursos sobre a liberdade. Toda a gente faz manifestações e dá o corpo ao manifesto (ou, pelo menos, ao sol da praia, se a meteorologia, que é uma ditadora cheia de caprichos, o permitir). No resto do ano, impera o medo, o cinzentismo e a pasmaceira, a falta de pão e habitação, a pobreza envergonhada e escancarada, a caridadezinha à Jonet em vez da solidariedade e da repartição da riqueza justas e civilizadas, a cultura só para alguns privilegiados, o abandono escolar, um salazarista em cada esquina e pastelaria a pedir de novo Salazar. Entretanto, os tiranos e tiranetes, fascistas e fascizóides, pequeninos ou grandessíssimos Salazarinhos, herdeiros e rendeiros do outro, neste neoliberalismo que nos calhou em sorte, ou azar, ao sol e na sombra, continuam a fazer do povo e desta vila morena à beira mar plantada o que querem e lhes apetece. 

Nelson Miguel Bandeira, Porto

 

 

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