Terminal da Bobadela abre guerra entre concessionária e transportadora

A ALB-Área Logística Bobadela acusa Medway de posição dominante e diz que pode perder o terminal da Bobadela. Por esse motivo, apresentou queixa às entidades reguladoras.

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Patricia Martins

A ALB – Área Logística Bobadela SA apresentou queixa à Autoridade da Concorrência e à Autoridade da Mobilidade e dos Transportes contra a Medway (antiga CP Carga) a quem acusa de prática de abuso de posição dominante e de tentativa de boicote à sua operação.

Lourenço Silva, da ALB, disse ao PÚBLICO que a sua empresa se arrisca a perder a concessão do terminal da Bobadela - cujo contrato obriga à entrada e saída de um mínimo de dez comboios por dia – porque a Medway se recusa a realizá-los.

O terminal da Bobadela é propriedade da Refer (hoje Infraestruturas de Portugal) e à sua exploração concorreram em 2016 a ALB e a Medway, tendo ganho a primeira. Lourenço Silva diz que o presidente da Medway, “como não conseguiu entrar, tentou fazer um negócio comigo em que ele ficava com 80% e eu com 20%”. O administrador da ALB disse que não aceitou porque já lá tinha o negócio há anos (no âmbito de outra empresa), mas tentou ainda fazer uma parceria com Carlos Vasconcelos (administrador da Medway) que, “não só não aceitou como, passados uns dias, retirou daqui os contentores dele”.

A Medway era simultaneamente cliente e fornecedora da ALB. Parqueava na Bobadela os seus contentores amarelos (do grupo suíço MSC ao qual pertence) e vendia serviços de transporte ferroviário à ALB. Lourenço Silva diz que perdeu assim 11% da sua facturação, mas que já está a tentar recuperar por via de outros clientes. O problema maior é que a Medway começou, entretanto, a não realizar comboios para transportar os contentores que deveriam entrar e sair do terminal.

Lourenço Silva diz que a Medway recusou-se a fazer vários comboios à ALB, alegando “indisponibilidade”, mas realizava-os se fossem pedidos pelos próprios clientes do terminal. “Eles [Medway] diziam que não queriam fazer o comboio e pronto. Uma vez por indisponibilidade, outras por não terem maquinista, outros por não terem operador de apoio”.

Na queixa apresentada às autoridades, a empresa diz que “esta situação assumiu novos contornos, uma vez que a Medway assumiu formalmente que não faculta mais nenhum comboio à ALB”. E que “a falta de acesso a comboios por parte da ALB representa uma ameaça real à sua actividade e compromete seriamente a concorrência em Portugal no sector de actividade em que se insere”. É que, de acordo com o caderno de encargos da Infraestruturas de Portugal, o concessionário da Bobadela tem de garantir um mínimo de dez comboios diários. Como a Medway detém 90% do mercado do transporte ferroviário de mercadorias em Portugal (e quase 100% do segmento de contentores), a ALB arrisca-se a ficar apenas com a actividade de parqueamento e transporte de contentores por via rodoviária.

Para Lourenço Silva, o comportamento da Medway visa a descredibilização da ALB que assim está a perder clientes. E alega que, além do abuso de posição dominante, há também um conflito de interesses pois a transportadora ferroviária pertence à MSC (Mediterranean Shipping Company) que é a segunda maior multinacional do mundo especializada no transporte marítimo de carga contentorizada.

Isto faz com que no eixo Leixões – Sines, onde há maior transporte de comboios de contentores, a Medway tenha vindo a reduzir a sua capacidade de oferta à ALB para dar prioridade ao tráfego da MSC. O documento enviado à Autoridade da Concorrência, a que o PÚBLICO teve acesso, apresenta números: a Medway oferece à ALB uma capacidade de transporte de 30 TEU’s (unidade de medida no transporte de contentores) por semana quando, na verdade, a transportadora realiza sete comboios semanais com capacidade para 72 TEU’s por composição, num total de 504 contentores.

Questionado pelo PÚBLICO, o responsável pela Medway, Carlos Vasconcelos, diz que não comenta as queixas apresentadas pela ALB à Autoridade da Concorrência e à AMT. “Não nos parece que as questões que possam surgir numa relação comercial cliente-fornecedor devam ser discutidas na praça pública”, disse, numa resposta escrita.

“Posso, contudo, informar que a Medway foi forçada a tomar decisões por incumprimento contratual por parte da ALB e posso assegurar que não temos qualquer comportamento que possa ser considerado de abuso de posição dominante”, diz Carlos Vasconcelos. Que acrescenta: “a Medway pauta a sua conduta pelo mais escrupuloso cumprimento da legislação e dos contratos com os seus clientes”.

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