O IMI e o mercado imobiliário

A política fiscal, mesmo a municipal, tem impactos importantes nas populações residentes.

O Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) foi introduzido em 2003, substituindo a Contribuição Autárquica (CA). As receitas deste imposto são uma das principais fontes de rendimento dos governos municipais, que sobre o seu gasto têm total poder discricionário. A taxa de IMI é decidida anualmente em sede de Assembleia Municipal, dentro de um intervalo fixado pela Assembleia da República e comum a todos os municípios. Assim, o IMI pode ser considerado como o principal instrumento fiscal de âmbito local.

Ao longo dos anos, temos assistido a várias reformas deste imposto, todas elas com bastante cobertura mediática, visto este ser um dos impostos menos populares do sistema fiscal. Por essa razão, são habitualmente analisadas as reações sociais a estas reformas e as suas possíveis consequências políticas. Contudo, são ainda escassos os estudos sobre os efeitos económicos concretos destas reformas. Este artigo procura responder a esse desafio, focando-se num efeito específico de uma reforma do IMI: no mercado imobiliário.

Aquando da sua introdução e até 2007, os municípios podiam determinar anualmente a taxa de IMI dentro do intervalo de 0,2% a 0,5% para todo o tipo de construções residenciais, industriais e comerciais. No entanto, no dia 2 de Julho de 2008, o primeiro-ministro da altura anunciou, de maneira inesperada, uma redução da taxa máxima de IMI de 0,5% para 0,4%. Considerando que esta baixa no IMI poderá ser vista por potenciais compradores como uma diminuição no seu custo de vida, é importante saber se estes estariam dispostos a pagar mais pelos imóveis.

Para responder a esta questão podemos analisar a evolução do valor médio das transações imobiliárias nos municípios de Portugal continental antes e depois de 2008. Para além disso, esta reforma permite-nos dividir os municípios em dois grupos: aqueles que não foram afectados e aqueles que foram forçados a baixar a taxa de imposto, pois em 2007 haviam escolhido uma taxa de IMI maior que 0,4%. A constituição destes dois grupos é feita através uma reforma de âmbito nacional, algo que podemos argumentar como aleatório. Na Figura 1 podemos observar a distribuição espacial destes dois grupos de municípios. 

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Fig. 1 Distribuição espacial dos Municípios afectados pela reforma do IMI de 2008.

A comparação da evolução do valor médio das transações imobiliárias nestes dois grupos ao longo de um período temporal pré e pós-reforma permite-nos isolar de forma precisa o impacto desta alteração. Para obter o valor mais exacto possível, são também consideradas no estudo diversas características municipais, nomeadamente a distribuição geográfica da população e a sua estrutura etária, efeitos do ciclo económico municipal, indicadores políticos e, em especial, variáveis relativas à prestação de serviços públicos – despesas municipais, nota média nos exames nacionais das escolas públicas, número de centros de saúde, hospitais, tribunais de primeira instância, autoestradas e a taxa de criminalidade.

Através desta análise, verificamos que a reforma de 2008 levou a um aumento de cerca de 7% do valor médio das transações efectuadas nos municípios forçados a diminuir a taxa de IMI, comparativamente à tendência observada para todos os outros que não os afectados pela reforma. O que significa que os ganhos da redução do imposto foram repartidos entre compradores e vendedores.

Estes resultados mostram que a política fiscal, mesmo a municipal, tem impactos importantes nas populações residentes. No caso da reforma do IMI de 2008, a cobertura mediática da altura apontava, sobretudo, para um alívio da carga fiscal com efeitos imediatos no rendimento disponível das pessoas. O estudo mostra que houve, também, uma transferência de riqueza para os proprietários que venderam as suas propriedades nos anos que se seguiram a esta decisão governamental.

 

Nota: Para mais informações sugere-se a leitura de “Property Tax and Real Estate Value: A Natural Experiment from Portugal” desenvolvido em coautoria com João Pereira dos Santos (NOVA School of Business and Economics). 

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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