Um elefante num vale de porcelana

A dimensão do empreendimento, um hotel de cinco estrelas com 18 metros de altura e múltiplos equipamentos, suscitou dúvidas desde o início.

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Mário Ferreira, dono da Douro Azul Fernando Veludo/NFactos (arquivo)

Das ruínas do império turístico de Carlos Saraiva, que faliu em 2016 deixando um lastro de dívidas superiores a 800 milhões de euros, sobrou um projecto baseado num pedaço de terra com 23.100 metros quadrados situado na Rede, concelho de Mesão Frio, exactamente entre a linha de caminho-de-ferro e a margem direita do Douro. Depois de adquiridas as fracções que garantiam a propriedade do terreno, fez-se um projecto e para se viabilizar o projecto encomendou-se um Plano de Pormenor. A ideia era instalar ali, em plena zona de protecção do Alto Douro Vinhateiro inscrito na lista do Património Mundial, um hotel com uma altura de 21 metros acima do nível do solo (entretanto reduzida para 18 metros) e, entre uma miríade de equipamentos, um campo de golfe que, na versão original do projecto, previa buracos nas duas margens do rio.

O hotel previsto ficaria implantado em 8497 metros quadrados, ficando 14.603 para espaços verdes, áreas de lazer, onde se incluía uma piscina, e um parque de estacionamento com 239 lugares. Na actual fase do processo, não fica claro se o projecto do golfe seria para avançar. A sua eventual aprovação ficaria dependente de um novo Estudo de Impacte Ambiental.

O hotel, concebido para ser classificado como um cinco estrelas, teria 180 quartos para turistas mais 13 para os trabalhadores. Nos três pisos previstos para se erguerem acima do nível do solo haveria um piano bar, dois restaurantes gourmet com capacidade para 325 comensais, um business center com seis salas de reuniões e um auditório capaz de acolher 500 pessoas. Nos dois andares subterrâneos seria construído mais um parque de estacionamento para 231 automóveis, uma sala de jantar para eventos com 288 lugares sentados e, entre outros serviços, um “kid’s club”.

A dimensão do empreendimento suscitou desde o início dúvidas. O seu impacte visual seria enorme, mesmo com a promessa de adaptar o projecto a um perfil de arquitectura inspirado nos socalcos durienses. Fontes ligadas à conservação do património garantem que, se avançar, poderá merecer o chumbo do Icomos, uma organização não-governamental que actua nas áreas da conservação do património mundial com influência nas decisões da Unesco. Esta organização teve um papel importante no chumbo do gasoduto projectado pela REN para o Douro Superior e que previa um atravessamento do Douro entre a Quinta do Vale Meão e o Vale da Vilariça.

Outra razão que está na origem a críticas oficiosas ao projecto da Douro Azul reside no modelo de exploração turística que propõe. Se há na região quem aponte para a carência de uma grande unidade para acolher um fluxo turístico que tem crescido ininterruptamente nas duas últimas décadas, há também quem defenda um modelo mais baseado na multiplicação de pequenas unidades pela região. E mesmo entre os que defendem hotéis com a escala da proposta pela Douro Azul as críticas abundam em relação à sua localização. As margens do Douro, alegam, devem ser salvaguardadas de projectos que provoquem impactes como o que uma construção com 18 metros de altura poderia provocar. 

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