A era dos unicórnios começa agora

A fase final da época da NBA arranca este sábado e será um primeiro aperitivo da mudança de poder em curso na prova. Os favoritos são os de sempre – Lebron e os Warriors – mas no seu caminho já estão os inevitáveis sucessores.

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Lebron contra Warriors, IV. A final das últimas três temporadas é a mais provável este ano, assim que se forem eliminando mutuamente as 16 equipas que começam este sábado a disputar os playoff da NBA. As duas super-equipas Cleveland Cavaliers e Golden State Warriors entram mais debilitadas nesta fase final do que acabaram o último jogo da época 2016-17. E este ano enfrentam um campo de batalha muito mais recheado de ameaças, desde outras super-equipas como os Houston Rockets e os Oklahoma City Thunder até aos novos craques como Joel Embiid, Karl-Anthony Towns, Anthony Davis ou Giannis Antetokounmpo, cuja singularidade física e técnica (jogadores com corpo de poste e técnica de base) já lhes valeu a nova categoria basquetebolística de “unicórnios”.

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Lebron contra Warriors, IV. A final das últimas três temporadas é a mais provável este ano, assim que se forem eliminando mutuamente as 16 equipas que começam este sábado a disputar os playoff da NBA. As duas super-equipas Cleveland Cavaliers e Golden State Warriors entram mais debilitadas nesta fase final do que acabaram o último jogo da época 2016-17. E este ano enfrentam um campo de batalha muito mais recheado de ameaças, desde outras super-equipas como os Houston Rockets e os Oklahoma City Thunder até aos novos craques como Joel Embiid, Karl-Anthony Towns, Anthony Davis ou Giannis Antetokounmpo, cuja singularidade física e técnica (jogadores com corpo de poste e técnica de base) já lhes valeu a nova categoria basquetebolística de “unicórnios”.

A vida dos campeões esta temporada não foi um passeio como nas anteriores, mas para Steph Curry e Kevin Durant os jogos a sério começam agora e a prioridade da época regular passava por manter em níveis razoáveis não apenas o interesse, mas sobretudo a saúde. Duas missões que se revelaram frustrantes, não só porque os Warriors sofreram derrotas por simples falta de vontade, mas essencialmente porque as lesões foram deixando um rasto de desânimo, entre todas a de Curry, que vai falhar a primeira ronda da fase final. Ainda assim, quando o motor atinge as rotações máximas os Warriors continuam imparáveis e nalguns momentos da época desfizeram os adversários em poucos minutos, à imagem do que tinham habituado os adeptos nos últimos três anos. São os grandes favoritos e os seus maiores adversários são internos: saúde e motivação.

Do outro lado da barricada, geográfica e competitiva está LeBron James, a caminho da sua oitava final consecutiva. Também os seus Cavaliers enfrentaram obstáculos pouco comuns, desde a troca improvável da sua segunda estrela, Kyrie Irving, passando por uma revolução do plantel a meio da época, até aos persistentes rumores da saída de James no final da temporada. E também LeBron dá sinais – apesar de uma das melhores épocas estatísticas da sua carreira – de que é a partir de agora que os jogos importam, de tal modo que já decretou o habitual apagão das suas contas nas redes sociais durante os playoff. O problema dos Cavs é que a equipa ficou não só mais fraca em teoria (com uma das piores defesas da Liga), mas sobretudo mais imprevisível, com vários jogadores novos sem experiência dos momentos de tensão máxima que marcam todos os minutos de todos os jogos a partir de hoje.

O futuro é dos jovens

Nos playoff, a experiência conta. Os jogos são mais intensos, há menos lapsos de concentração dos adversários, a pressão mediática e directa dos adeptos é maior, as séries estendem-se por um mínimo de quatro jogos levando a um estudo e preparação minuciosa das fraquezas alheias. E as carreiras só ganham corpo histórico com alguma dose de sucesso nestes dois meses de competição.

É o momento dos treinadores, cujas adaptações tácticas a meio de uma série ou decisões instintivas nos últimos dois minutos de jogo podem fazer balançar um duelo equilibrado pelas individualidades. Há oito anos, pelo menos, que os os campeões se fizeram com decisões acertadas em momentos chave de treinadores de elite como Erik Spoelstra, Gregg Popovich, Steve Kerr ou do treinador-jogador LeBron James.

No entanto, quando estas mentes sofisticadas de basquetebol se enfrentam durante duas semanas, a cada dois dias, ter jogadores de topo faz toda a diferença para decidir jogos e séries equilibradas, depois de se anularem as virtudes colectivas e a saturação táctica já estiver a dar poucas vantagens. É aqui que o lançamento decisivo concretizado no décimo de segundo chave faz lendas e desfaz mitos. A chuva de triplos de Steph Curry há três anos, o desarme de lançamento de LeBron há dois anos, o triplo de Kevin Durant na cara de LeBron no ano passado, momentos que fazem a história da NBA e cuja reedição é este ano mais provável com os mesmos protagonistas. 

Ainda assim, há novos candidatos a chegar ao topo da montanha esta Primavera, desde algumas personagens que têm ficado sempre aquém das expectativas nos últimos anos – Chris Paul, James Harden, Russell Westbrook, Paul George – e que procuraram ajuda entre si para superar os traumas passados, até às jovens promessas cujo crescimento acelerado já foi mais que suficiente para carregar as suas equipas ao grupo de elite da NBA. Bucks, (Antetokounmpo), 76ers, (Embiid e o rookie Ben Simmons), Timberwolves (de Towns), Jazz (do rookie Donovan Mitchell) ou Pelicans (liderados por Anthony Davis) são apenas os veículos colectivos de uma nova geração que irá usar estes dois meses como um laboratório para os primeiros ensaios de domínio da Liga, que se tornará tão mais real quanto mais minutos acumularem nos jogos mais difíceis que disputarão nas suas precoces carreiras.

A NBA agradece. Desde que a geração de LeBron James entrou na NBA que os pavilhões da competição não tinham tantos jogadores capazes de conduzir uma equipa até meados de Junho, quando se decide o título. O domínio de James e o advento das super-equipas, conjugado com uma hipermediatização da Liga pelas redes sociais, um enquadramento laboral que acentuou desequilíbrios competitivos e o triunfo da análise de dados nas decisões dos clubes, culminou no ano passado numa das edições mais pobres dos playoff, sem emoção competitiva e com pouco equilíbrio entre os dois colossos finalistas e o resto. O diferencial de qualidade acompanha a explosão de valor da Liga, entre contratos televisivos milionários, vendas de clubes de mil milhões de dólares, acordos de publicidade sem precedentes e aumentos expressivos dos tectos salariais. Tudo fora do pavilhão.

Esta temporada, a réplica de super-equipas pelos Thunder (com Westbrook, George e Carmelo Anthony) e os Rockets (Harden e Chris Paul) e a fome de vitória dos mais novos deverão garantir uns playoff mais equilibrados, imprevisíveis e emocionantes na tentativa de evitar uma quarta final consecutiva entre Cavaliers e Warriors, algo sem precedentes na história da Liga. Isto, quando todos procuram posicionar-se para lidar o melhor possível com os dois factores mais decisivos no desporto: sorte e lesões. Aliás, no caso das lesões raro é o favorito que consegue escapar incólume a um problema físico de um jogador determinante. E este ano – como tem sido dramaticamente recorrente nos últimos anos da Liga, a braços com os efeitos de um calendário impiedoso no corpo dos atletas de um desporto cada vez mais vertiginoso – algumas das principais equipas já partem para esta fase privadas das suas estrelas (Boston Celtics e Kyrie Irving ou os San Antonio Spurs e Kawhi Leonard).

Os oito duelos da primeira eliminatória arrancam em modo maratona entre as 20h de sábado e a madrugada de domingo para segunda. Por ordem, da Conferência Este para a Conferência Oeste, a partir dos emparelhamentos dos respectivos líderes.

Toronto Raptors (1) – Washigton Wizards (8)

Duas equipas em fim de ciclo. Os Raptors têm falhado sucessivamente nos momentos mais decisivos e reinventaram o seu estilo de jogo – correndo e lançando mais – de tal maneira que conseguiram chegar ao topo do Este com alguma vantagem. Têm duas estrelas no auge da carreira – Kyle Lowry e DeMar DeRozan – e um leque alargado de atletas de alto nível. Terminaram a época regular em quebra e continuam a ter de ultrapassar fantasmas com a silhueta de LeBron. Do outro lado está uma equipa liderada por John Wall, que passou o ano lesionado e em conflitos internos com o resto da equipa, com o bombardeiro Bradley Beal à cabeça. Se conseguiram resolver os problemas internos durante os próximos dias, o potencial da equipa sobe de tal modo que podem até ameaçar um líder do Este com crise existencial. Se não, será uma daquelas séries resolvidas rapidamente e permitirá aos Raptors voltarem a ter pesadelos com James na eliminatória seguinte.

Boston Celtics (2) – Milwaukee Bucks (7)

Um duelo de ausências. Antetokounmpo dominará todos os jogos assumindo finalmente o estatuto de super-estrela. O grego fundou o conceito do “unicórnio” da NBA: jogador muito longo, nos anos 80 jogaria debaixo do cesto. Mas a sua agilidade, técnica e visão de jogo permitem-lhe controlar todas as posições em campo, contando ainda com a ajuda de jogadores acima da média como Eric Bledsoe e Khris Middleton. O defeito dos Bucks é estarem sem treinador principal desde o despedimento de Jason Kidd, colocando um interino para enfrentar aquele que já é considerado um dos cinco melhores treinadores da actualidade, Brad Stevens, dos Boston Celtics. A equipa mais titulada da NBA tem, contudo, de lidar com as suas próprias ausências de peso, as suas estrelas Kyrie Irving e Gordon Hayward (desde o primeiro jogo da época). Será a oportunidade para os dois jovens em ascensão dos Celtics, Jaylen Brown e Jason Tatum ganharem quilómetros nas pernas ao mais alto nível. O desfecho é imprevisível, mas ancestral, dado o embate entre o individual e o colectivo

Philadelphia 76ers- Miami Heat

Os 76ers são o símbolo dos novos tempos na NBA: depois de anos a perderem de propósito para assegurarem o melhor talento à saída das universidades saltam das profundezas das tabelas para o topo da Liga em apenas um ano. E graças a apenas dois jogadores: Embiid e Simmons, que aparecem uma vez por geração e coincidiram na mesma equipa ao mesmo tempo e com tempos de maturação iguais. O improvável Processo (como ficou cunhada a estratégia) está a ter resultados improváveis. E a primeira presença tão precoce dos dois génios nos playoff – desde que tenham saúde, algo que não é garantido com ambos – é quase um bónus. Pela frente têm o seu negativo: uma equipa sem vedetas, sem “unicórnios”, mas com jogadores experientes, altruístas e um treinador bicampeão (Spoelstra). Mais um duelo entre experiência colectiva e potencial individual.

Cleveland Cavaliers (4) – Indiana Pacers (5)

É talvez o embate mais previsível da primeira fase do Este. LeBron James nunca foi eliminado na primeira ronda dos playoff. Apesar de todos os problemas que foram marcando aquela que pode ser a última época do melhor jogador da actualidade nos Cavaliers, as peças entretanto acumuladas devem ser suficientes para que o melhor LeBron de sempre (segundo a descrição do próprio) ultrapasse uma equipa dos Pacers que já está contente só de aparecer na festa. Apesar do entusiasmante Victor Oladipo, a falta de experiência nestes palcos revela-se habitualmente contra o “monstro” James.

Houston Rockets (1) – Minnesota Timberwolves (8)

Os favoritos estatísticos transformam jogos em verdadeiros vendavais de lançamentos longos e ataques estereotipados mas imparáveis. A grande deficiência da última época – quando o treinador Mike D’Antoni potenciou as habilidades de passe e lançamento de Harden, mas descurou defesa e flexibilidade táctica – foi acautelada este ano com a contratação de Chris Paul, que lhes dá mais lançamento curto, mais defesa e os torna mais imprevisíveis. E a classe média de jogadores contratados tiveram todos o condão de aprofundar capacidade de sacrifício e experiência, numa equipa que vinha revelando alguma imaturidade. Mas apesar do domínio da época regular, sobram as dúvidas sobre a capacidade das duas estrelas ultrapassarem fantasmas do passado depois dos vários colapsos improváveis em Abril e Maio. Do outro lado, Karl-Anthony Towns vai começar a aprender como se faz nesta fase, usando as inevitáveis derrotas como lições para vir a vencer no futuro. Apesar da ajuda de Jimmy Butler, o “unicórnio” só entrou nesta fase no último jogo da época regular, já exausto pelo intenso treinador Tom Thibodeau e realizado por ter interrompido a mais longa série de ausência dos playoff por um clube.

Golden State Warriors (2) – San Antonio Spurs (7)

O bizarro desaparecimento de Kawhi Leonard, que usou o pretexto de uma lesão complexa para se afastar da equipa, enquanto os seus agentes procuram melhorar a sua situação contratual noutras paragens, torna aquela que seria a eliminatória mais importante praticamente numa formalidade. Mesmo com a lesão de Curry, os Warriors têm demasiadas armas para os Spurs, que só chegam a esta fase graças ao sistema montado há anos por Popovich, de basquetebol colectivo, altruísta e de fundamentos europeus (passe, corte, movimento, bloqueios múltiplos, etc.). Uma oportunidade perdida, dado que no ano passado, até à polémica lesão de Leonard provocada pela "agressividade" de Zaza Pachulia, os Spurs tinham sido os únicos a conseguirem desprogramar tacticamente a máquina dos Warriors. E Leonard era a insubstituível chave universal dessa estratégia.

Portland Trail Blazers (3) – New Orleans Pelicans (6)

Anthony Davis contra Damien Lillard. O líder dos “unicórnios” contra o poster boy dos bases triplistas que são eles próprios a táctica da equipa. Colectivamente, os Trail Blazers estão fortes, assentes numa estratégia que tem vindo a amadurecer com o mesmo treinador e um plantel trabalhador, onde se destaca o outro triplista C. J. McCollum. Mas Davis é já um dos cinco melhores jogadores da NBA capaz de ganhar jogos sozinho e sem grande táctica, para além de bons bases (Rajon Rondo ou Jrue Holiday) e lançadores razoáveis. Se não for suficiente para ganhar os necessários quatro jogos para avançar, ficam escritas mais umas páginas de uma carreira que promete ficar na história do jogo.

Oklahoma City Thunder (4) – Utah Jazz (5)

Um confronto defensivo com pitadas de talento individual ofensivo. Duas das melhores defesas da Liga procurarão tecer amarras suficientemente fortes para atenuar os voos de Russel Westbrook e Donovan Mitchell, o rookie que tomou a liga de assalto e tornou os Jazz numa das equipas mais competitivas da NBA. Dois treinadores sofisticados, dois plantéis curtos mas que se complementam e estrelas secundárias que poderão desequilibrar a balança (Paul George e Rudy Gobert) de um duelo em que o factor casa tem um peso determinante. E nessa perspectiva os Thunder tem o jogo 7 no seu pavilhão. Quem sobreviver a esta batalha é um razoável candidato a contrariar o favoritismo dos Warriors e dos Rockets, transformando imediatamente, se for esse o caso, estes playoff como um dos mais imprevisíveis dos últimos anos.