Os 44 calotes do Novo Banco

Hoje o que eu sei com segurança é que 44 pessoas ou entidades estão a criar o grosso de um problema de 5,4 mil milhões que eu, como português, sou chamado a resolver, pagando.

Muitas pessoas falam sobre a banca e o sistema bancário todos os dias, mas poucas o fazem em português: fazem-no atrás de palavras que a generalidade das pessoas não compreende, e talvez mesmo para que não compreendam… Vou tentar então fazê-lo; pedindo desde já desculpa aos financeiros pela falta de rigor dos termos: desta vez, é de propósito!

Segundo a imprensa, o Novo Banco tem emprestados 5,4 mil milhões de euros (5400000000! 10 dígitos!) e não sabe quanto deste valor irá receber. António Ramalho, que está à frente do banco (que nos disseram que era o banco bom), disse em entrevista que o “grosso do problema” está em 44 empréstimos, (“apenas 1 superior a 500 milhões”, diz como que para nos descansar) e compara com a situação anterior, quando 6 mil milhões de euros estavam emprestados a apenas 5 pessoas/entidades.

Sim, contavam-se pelos dedos de uma mão os que detinham 6 mil milhões em calotes; agora são “apenas” 44 os problemáticos. Tenho duas perguntas: Como? Quem?

Pelo que aconteceu no BES os portugueses já pagaram cerca de 8,5 mil milhões (10 dígitos!), isto é, o dinheiro dos seus impostos que já saiu ou sairá do seu bolso para a esfera dos bancos pós-BES. Nova pergunta: quanto?!

A generalidade das pessoas não trabalha no seu dia-a-dia com mais do que 4 dígitos (1000 euritos), e recebe bem menos do que isso. O facto de trabalhar com notas de 5 e 10 euros, às vezes uma de 20 ou de 50, gera uma dificuldade de conseguir quantificar estes valores (de 10 dígitos); façamos por isso aproximações.

  • 1,1 mil milhões de euros (10 dígitos) é mais do que recebem todas as instituições de ensino superior por ano do Orçamento do Estado; pelo que estamos a falar de valores que permitiam pagar mais de 7 anos de ensino superior em Portugal;
  • A comparticipação do Estado na construção dos estádios do Benfica, Boavista, Porto e Sporting para o Euro2004, foram cerca de 236 milhões: quando falamos de 8,5 mil milhões para o problema BES/Novo Banco estamos por isso a falar de 36 vezes mais;
  • Este valor são quase 15 milhões de salários mínimos;
  • E se o salário médio líquido dos trabalhadores por conta de outrem em Portugal é de 865 euros, 8,5 mil milhões dava para pagar 2 meses e meio a todos os trabalhadores por conta de outrem do país.

Ora, percebido “grosso modo” o quanto, é importante perceber que não só os portugueses já pagaram tudo isto, como vão continuar a meter dinheiro na banca de 3 formas: porque é lá que colocam o seu dinheiro (cedem a “matéria-prima” com que os bancos ganham dinheiro), porque pagam (cada vez mais) comissões bancárias por tudo e por nada (recentemente até jovens que estavam isentos de comissões na CGD passaram a ter de pagar também) e porque no fim, se a gestão der prejuízo porque grandes caloteiros não pagam os empréstimos que lhes foram dados sem garantias suficientes, é o contribuinte que paga outra vez.

Claro que não é esta a língua dos financeiros. O Banco de Portugal fala sobre isto nos seguintes termos: “A redução do stock de NPL, que ainda permanece elevado, exige que as medidas incluídas na estratégia abrangente continuem a ser adotadas”. São as “imparidades”, a “sobre-exposição ao risco de setores não estratégicos”, “os rácios de capital” e outras coisas assim… E esta linguagem vai camuflando o como.

Resta-nos o quem. Já sei que o problema é muito maior na banca toda e em todos os processos envolvendo bancos “resolvidos”, “falidos”, “defraudados” ou “descapitalizados”. Mas hoje o que eu sei com segurança é que 44 pessoas ou entidades estão a criar o grosso de um problema de 5,4 mil milhões que eu, como português, sou chamado a resolver, pagando. Eu pago, voluntariamente ou por imposto. Mas quero saber quem são! E considero ter direito a isso!

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