Tecnologias ao serviço das pessoas mais velhas e seus cuidadores

Ainda que os cuidadores informais possam encontrar nos cuidados prestados uma fonte de realização e crescimento pessoal, é também verdade que podem ver afetada negativamente a sua saúde física e mental.

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Jeff Sheldon/Unsplash

Em 2015, em Portugal, 9% dos adultos com mais de 50 anos prestavam cuidados informais a pessoas mais velhas numa periodicidade diária ou semanal [1]. Quando uma pessoa mais velha precisa de apoio para concretizar atividades quotidianas (tarefas básicas de autocuidado, como alimentação e higiene pessoal) e/ou atividades instrumentais de vida diária (tarefas mais complexas, como a gestão/toma de medicação ou a preparação de refeições), este apoio fica frequentemente à responsabilidade de familiares e amigos que prestam cuidados não remunerados.

Ainda que os cuidadores informais possam encontrar nos cuidados prestados uma fonte de realização e crescimento pessoal, é também verdade que podem ver afetada negativamente a sua saúde física e mental. Desafios sociais encontram-se ainda espelhados nas dimensões da interação social (e.g. diminuição do tempo de lazer do cuidador); do emprego (e.g. sobrerrepresentação destes cuidadores em empregos temporários ou a tempo parcial; absentismo e baixas médicas); e da estabilidade financeira dos agregados familiares.

É pois evidente que na perspetiva de se viver, potencialmente, a última década de vida com incapacidade (em 2015, a expectativa média de vida sem incapacidade aos 65 anos era, em Portugal, de 6,2 anos, enquanto a esperança média de vida era de 19,9 anos) [1], é fulcral que se discutam medidas inovadoras tanto a montante como a jusante, destinadas quer à promoção de um envelhecimento saudável e independente em comunidade, quer à prestação dos melhores e mais sustentáveis cuidados às pessoas mais velhas com incapacidade, ao mesmo tempo que se protegem os seus cuidadores informais.

Como podem as tecnologias ajudar?

A discussão de medidas inovadoras e sustentáveis para um envelhecimento saudável e independente tem-se focado, na última década, no potencial das tecnologias. Estas soluções – designadas Ambient Assisted Living (tecnologias de vida assistida, com a sigla inglesa AAL) – destinam-se, por um lado, a auxiliar a pessoa mais velha a viver de forma independente, diminuindo o volume de cuidados informais necessários. Por outro lado, procuram facilitar a prestação de cuidados e portanto melhorar a qualidade de vida de quem os presta e de quem os recebe. Casas inteligentes, sensores concebidos para medir parâmetros bioquímicos, de movimento e sinais vitais; robótica destinada a gerir a toma de medicação, ingestão e preparação de alimentos, são exemplos de soluções tecnológicas deste cariz.

Entre as pessoas mais velhas e os seus cuidadores, as tecnologias mais populares são aquelas que permitem monitorizar e melhorar o estado de saúde da pessoa mais velha (e.g. gestão de medicação); monitorizar as suas atividades e detetar alterações nas rotinas; prevenir e detetar quedas e outros incidentes no contexto doméstico (ex. incêndios); detetar falhas de segurança (ex. intrusos); e suportar a comunicação à distância entre cuidador e recetor de cuidados [2].

De um modo geral, a multiplicidade de soluções existentes no mercado propõe-se dar resposta, sobretudo, aos seguintes domínios:

Saúde e cuidados
Soluções que permitem recolher e gerir dados clínicos, que apoiam intervenções terapêuticas e a prevenção de doenças. Dispensadores de medicação inteligentes, que a fornecem em horário predefinido e “comunicam” com o cuidador através de uma aplicação móvel; sistemas de monitorização da tensão arterial, cujos dados recolhidos possam ser consultados à distância pelo médico ou cuidador, são exemplos de soluções neste domínio.

Soluções destinadas à acessibilidade, assim como à monitorização e gestão de água, energia elétrica, luminosidade e climatização. Sistemas inteligentes que permitem programar e controlar à distância a ativação das luzes ou aquecimento em casa, são exemplos de soluções neste âmbito.

Segurança e proteção
Dispositivos que permitem, por exemplo, detetar quedas e gerir outras emergências através de sistemas de alarme e contactos automáticos com uma central e/ou cuidador. Soluções de localização de um indivíduo perdido ou destinadas à segurança da habitação são aqui enquadráveis.

Mobilidade e transporte
Soluções no âmbito do transporte de pessoas ou bens, assim como destinadas à orientação de indivíduos e navegação.

Vitalidade e competências
Soluções que permitem compensar ou treinar competências físicas, mentais e sociais essenciais a uma vida independente. Relógios inteligentes que monitorizam o batimento cardíaco e a atividade física são exemplos de soluções deste cariz.

Informação e comunicação
Soluções que suportam a comunicação interpessoal, por exemplo, entre o cuidador e o recetor de cuidados e que apoiam a organização da vida diária.

Os benefícios de soluções mais reconhecidos pelos cuidadores incluem a assistência rápida em caso de emergência, simplificação das atividades de prestação de cuidados e diminuição da dependência do recetor de cuidados [3]. É, contudo, fundamental, que estas tecnologias sejam fáceis de usar: aprender a utilizá-las não deve consumir demasiado tempo nem constituir fonte (adicional) de stress para o cuidador. É ainda importante que estas garantam os pressupostos da segurança, confidencialidade e privacidade, uma vez que entre as principais razões para a rejeição destas tecnologias estão receios de que estes requisitos não sejam cumpridos [4].

Ainda que existam barreiras não negligenciáveis à adoção destas tecnologias, um estudo de revisão dá-nos conta que as mesmas contribuem, efetivamente, para a redução da sobrecarga dos cuidadores informais por via da diminuição do tempo e exigência da prestação de cuidados, assim como da ansiedade face à tarefa [3].

Se é cuidador, é importante que discuta com o seu familiar/amigo quanto aos seus desejos e preferências, assim como com os especialistas que o acompanham, para decidir pela solução mais adequada. Em breve, as pessoas mais velhas e os seus cuidadores poderão beneficiar de uma plataforma de aconselhamento sobre tecnologias aplicadas ao envelhecimento, desenvolvida no âmbito do projeto Europeu ActiveAdvice, que conta com a participação do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto (ICBAS) e do centro de investigação Cintesis – Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

Referências

[1] OECD (2017). Health at a Glance 2017: OECD Indicators. OECD Publishing, Paris.

[2] Nedopil, C., Schauber, C. & Glende I. (2013). AAL stakeholders and their requirement. Ambient and Assisted Living Association 

[3] Madara Marasinghe, K. (2015). Assistive technologies in reducing caregiver burden among informal caregivers of older adults: a systematic review. Disability and Rehabilitation: Assistive Technology, 11(5), 353-360. doi:10.3109/17483107.2015.1087061

[4] Teles, S., Bertel, D., Kofler, A. Ch., Ruscher S.H., Paúl, C. (2017). A Multi-Perspective View on AAL Stakeholders’ Needs. A User-centred equirement Analysis for the ActiveAdvice European Project. 2017 International Conference on Information and Communication Technologies for Ageing Well and e-Health (ICT4AWE).

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