A verdade da mentira

O Regulamento Geral da Protecção de Dados entra em vigor a 25 de Maio e vai obrigar o Facebook a adaptar os seus procedimentos de forma a poder continuar a operar na União Europeia.

A verdadeira dimensão do escândalo Facebook/Cambridge Analytica está agora a ser revelada. Não foram afinal 50 milhões de utilizadores a ver os seus dados roubados, foram 87 milhões — quase todos americanos, quase todos usados para fortalecer os esforços da empresa que trabalhou na propaganda de Donald Trump. E, na verdade, é impossível saber se esta é a dimensão real da fuga, porque o Facebook não tem propriamente um historial respeitável no que toca à honestidade.

A empresa de Mark Zuckerberg foi avisada em 2015 deste roubo, mas manteve o segredo e não informou os seus utilizadores; quando os jornais que agora revelaram o escândalo o contactaram a empresa no decorrer da investigação, esta ameaçou com processos judiciais; e só depois das revelações públicas sobre a forma como os dados dos utilizadores da plataforma foram manipulados é que apareceram os pedidos de desculpa e as promessas de fazer melhor — ironicamente publicados não na rede social, mas nas páginas impressas de jornais um pouco por todo o mundo. Ainda assim, não é suficiente.

O Regulamento Geral da Protecção de Dados entra em vigor a 25 de Maio e vai obrigar o Facebook a adaptar os seus procedimentos de forma a poder continuar a operar na União Europeia. As regras são exigentes e a melhor prova da sua importância foi dada ontem, quando o responsável do Facebook anunciou que vai adaptar procedimentos dentro do espaço europeu, mas não vai adoptar este regulamento a nível global — porque, apesar de serem regras que protegem o consumidor, prejudicam o negócio da rede. Os consumidores europeus — e, logo, os portugueses, ficarão mais protegidos do que outros habitantes do planeta. Só no quadro da União Europeia é que um país como Portugal tem peso para se proteger dos abusos dos gigantes tecnológicos, quer sejam os dados pessoais recolhidos pelo Facebook, quer sejam as disposições sobre inteligência artificial que terão rapidamente de ser postas em prática. 

Estas são situações novas, cujas consequências atingem os consumidores com muita rapidez. Em regra, o legislador não está desperto para estes problemas e os Estados não têm mecanismos rápidos para proteger quem devem. E, quando se trata de multinacionais que na prática têm mais poder e capital do que muitos países de média dimensão, é impossível fazer-lhes frente a não ser num quadro internacional e num espaço de protecção como é a União Europeia. 

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