A mais antiga fabricante de armas norte-americana pediu insolvência

Erros de gestão e o "efeito Trump" na indústria das armas levam ao colapso da Remington Outdoor, um dia depois dos gigantescos protestos contra a violência armada nos EUA.

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Reuters/JOSHUA LOTT

A Remington Outdoor, a mais antiga e uma das principais fabricantes de armas nos Estados Unidos, entregou um pedido de insolvência, este domingo, junto da justiça norte-americana — um dia depois da milhares de pessoas terem aderido à "March for Our  Lives" (Marcha pelas Nossas Vidas), organizada pelos sobreviventes do tiroteio numa escola em Parkland, na Florida, em Fevereiro, que resultou na morte de 17 pessoas.

A fabricante de armas, com mais de 200 anos de existência, enfrenta uma forte quebra das vendas e o crescimento da sua dívida. O pedido de insolvência foi entregue num tribunal do estado de Delaware. A empresa é detida maioritariamente por uma das maiores gestoras de fundos dos EUA, a Cerberus Capital Management. No documento judicial, a empresa declara dívidas entre os 80 milhões e os 400 milhões de euros, e indica que pretende passar a gestão dos activos aos seus credores.

"Efeito Trump” na queda das vendas

Robert Spitzer, professor na Universidade de Nova Iorque e especialista económico na área das armas, explica que uma das causas para esta quebra das vendas está relacionada com a vitória de Donald Trump nas presidenciais de 2016. Desde que assumiu a liderança da Casa Branca, as vendas caíram 27,5%.

O especialista explica que Trump, defensor do livre acesso a armas e um assumido “amigo” da indústria do armamento, não é visto como uma ameaça pelos proprietários de armas de fogo. Logo, a “corrida” à aquisição de armas diminui. O efeito contrário ocorre quando existe um receio de que sejam aplicadas medidas mais restritas no acesso às armas. “As vendas de armas tornaram-se politizadas. As compras de armas têm sido feitas não apenas porque alguém quer um produto, mas para marcar uma determinada posição. Não apenas pelo receio de que sejam aplicadas mais restrições, mas também para marcar uma posição contra Obama”, exemplificou em declarações ao jornal Guardian.

Diz também a BBC que o número de verificações feitas pelo FBI para autorizar a compra de armas atingiu um valor recorde em 2016, durante a campanha presidencial para as eleições norte-americanas, mas que acabou por descer drasticamente após a vitória de Trump, o que sustenta a opinião de vários analistas: há dois anos as vendas eram maiores porque os norte-americanos temiam que a candidata democrata Hillary Clinton vencesse as eleições e adoptasse restrições no acesso às armas.

Os recentes tiroteios nos EUA, e em particular o ocorrido na escola de Parkland, reacenderam o debate sobre o livre acesso às armas e levaram várias empresas a distanciar-se do negócio. No inicio do mês, a cadeia de supermercados Walmart, a maior do país, anunciou que iria deixar de vender armas de fogo e respectivas munições a clientes menores de 21 anos. Por motivos políticos e culturais, os EUA têm um dos maiores índices de posse de armas do mundo — já existem em maior número do que os habitantes.

A Remington Outdoor está sediada na Carolina do Norte, onde produz armas desde 1816. Para além do referido contexto político, um jornalista da BBC em Nova Iorque conta que a empresa “deu um tiro no pé” com a sua gestão, ao cometer sucessivos erros financeiros e ao produzir armas com defeitos.

A fabricante de armas está ainda a ser processada pelos pais das vítimas do tiroteio de 2012 na escola de Sandy Hook, estado do Connecticut, perpetrado uma arma produzida pela Remington — morreram 28 pessoas, a maioria crianças. Os advogados das famílias das vítimas acreditam que o pedido de insolvência não irá influenciar o caso.

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