E se Marrocos derrotar EUA, Canadá e México na corrida pelo Mundial 2026 de futebol?

A candidatura africana tem sido menosprezada face à dimensão dos opositores, mas os marroquinos podem ser premiados por causa do comportamento de Donald Trump.

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Elementos da FIFA durante uma visita a um dos estádios da candiatura americana ao Mundial 2026 Ray Stubblebine/Reuters

A decisão será anunciada poucos horas antes do início do Campeonato do Mundo de futebol 2018, que a Rússia vai organizar, este Verão. Mas, se há alguns meses parecia certo que a candidatura dos Estados Unidos, México e Canadá à organização do Mundial 2026 tinha a vitória garantida, agora há já muita gente que considera possível ser Marrocos o nome do país que estará dentro do envelope a ser aberto por Gianni Infantino, a 13 de Junho. São vários os factores que podem prejudicar as ambições das nações americanas, mas há um que tem ganho peso: Donald Trump.

A inédita candidatura tripartida de EUA, México e Canadá continua a ser a favorita a sedear o Mundial de futebol de 2026. Para além do imenso número de potenciais “consumidores” (os três países congregam uma população que atinge os 500 milhões de pessoas) e do fortíssimo mercado publicitário que oferece à FIFA, o próprio facto de ser uma candidatura composta por três nações constitui uma experiência que o organismo que gere o futebol a nível mundial tem defendido recentemente, já que permite mitigar as despesas avultadas que a organização de um evento como um Mundial acarreta (até hoje, apenas o torneio de 2002, disputado na Coreia do Sul e no Japão, foi realizado por mais do que uma nação).

Mas as coisas mudaram na FIFA ou pelo menos a instituição procura passar essa mensagem. Em Zurique, há um esforço para tentar descolar a FIFA da imagem que lhe tem estado associada nas últimas décadas: a de um organismo preocupado, acima de tudo, em alcançar bons negócios e obter lucros consideráveis com o Campeonato do Mundo.

A votação para a escolha do organizador do Mundial 2026 será a primeira realizada depois dos escândalos que permitiram à Rússia e ao Qatar acolher os dois próximos Mundiais e que abalaram a reputação da FIFA, com vários membros do seu comité executivo a serem presos por suspeita de terem aceitado subornos para votarem em determinada candidatura. Assim, pela primeira vez, será cada uma das 211 nações que integram a FIFA a eleger a sede de um Mundial e fá-lo-ão de forma pública, o que é visto como uma solução que dificulta “a compra” de votos ou que, pelo menos, torna o controlo do processo mais difícil.

E se é verdade que o facto de o Mundial 2026 ser o primeiro em que vão competir 48 selecções (conferindo maior importância às questões relacionadas com o número suficiente de estádios e à fiabilidade das infra-estruturas das cidades-sede, exigências em que a superioridade da candidatura americana é inegável), a crescente antipatia mundial em relação ao gigante norte-americano motivada pelas tomadas de posição do seu presidente, Donald Trump, oferecem a Marrocos uma janela de oportunidade que, até há pouco tempo, quase ninguém acreditava existir.

“Nos últimos meses vimos como Trump insultou países e vimos como dirigentes desportivos ficaram irritados com o comportamento do FBI contra alguns ‘colegas de profissão’, especialmente em países da América do Sul”, explicou ao PÚBLICO Jamil Chade, jornalista brasileiro que acompanha os bastidores da FIFA há 18 anos e autor do livro “Propina, política e futebol”, no qual se revela a forma de funcionamento daquele organismo nas quase duas últimas décadas. Assim, a pergunta que se coloca é se o mundo está disposto a oferecer a Donald Trump um dos eventos mais mediáticos do planeta.

Agarrado a esta dúvida, Marrocos acredita que, à quinta tentativa, vai finalmente, conseguir a organização de um Mundial de futebol, depois dos desapontamentos de 1994, 1998, 2006 e 2010. Numa altura em que já se contam espingardas – os quatro países candidatos não podem votar, nem a Guatemala, cuja federação está suspensa –, surgem alguns cálculos na comunicação social internacional que contabilizam para os marroquinos mais do que os votos necessários. A fazer fé nestes números, Marrocos teria o apoio de grande parte das nações da América do Sul e da Ásia (muitas delas descontentes com a actuação prepotente do FBI nos seus territórios e com as restrições à emigração de cidadãos árabes impostas pela administração norte-americana), para além dos votos dos seus vizinhos do continente africano.

Mas esta matemática é contestada por elementos próximos da candidatura norte-americana, que estão a contar com os votos da maior parte da Europa, de certas zonas da Ásia, da Oceânia e também de outras federações continentais americanas. A candidatura liderada pelos EUA - no país de Trump serão realizados 60 jogos, incluindo todos a partir dos quartos-de-final, com o México e o Canadá a ficarem cada um com os restantes 20 – tem ainda um outro argumento de peso: foi no Mundial que organizou, em 1994, que se fixou o recorde de assistência do torneio (cerca de 3,6 milhões de espectadores). Um número que resiste até hoje, apesar do crescimento da competição, que passou de 24 para 32 selecções participantes.

Se Marrocos vencer, não deixará de ser uma autêntica surpresa. Seria apenas a segunda vez que um país africano receberia a maior competição de futebol do planeta, depois da África do Sul, em 2010. Para já, parece estar na corrida, algo muito positivo face ao poderio do adversário. E a única verdadeira má notícia para os marroquinos nos últimos tempos foi mesmo o apoio que Sepp Blatter, ex-presidente da FIFA, afastado do cargo por suspeitas de corrupção, deu à sua candidatura.

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