Onde está o pai? Na cozinha

Os bloggers Ricardo Dias Felner e Rui Marques, e o chef Hugo Brito têm em comum o gosto pela cozinha e serem pais. Esta segunda-feira celebra-se o Dia do Pai.

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O chef Hugo Brito Enric Vives-Rubio
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Chef Hugo Brito e Simão DR
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Ricardo Dias Felner Sebastião Almeida
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Ricardo Dias Felner Sebastião Almeida
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Rui Marques DR
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Rui Marques e a família DR

O homem na sala e a mulher na cozinha? Sim, dizem os dados, 80% das tarefas domésticas continuam a ser feitas pelas mulheres, mas eles vão assumindo algumas e a cozinha é uma delas.

O PÚBLICO foi à procura de exemplos de homens que gostam de cozinhar e passam esse testemunho aos filhos. A curiosidade e a descoberta de sabores levaram Hugo Brito até à cozinha e a assumi-la profissionalmente: é chef no restaurante Boi-Cavalo, em Lisboa, tem um filho de 4 anos, a quem ensina que se deve provar tudo.

A mesma preocupação tem o jornalista Ricardo Dias Felner, que trocou a investigação de casos como o da licenciatura de Sócrates pela descoberta de mercados e de restaurantes. Tem três filhos e no início de Abril vai ensinar a escrever sobre gastronomia, o seu curso chama-se Papas na Língua. Por último, Rui Marques é engenheiro e começou a cozinhar quando o filho nasceu, em 2016, então criou o blogue A Pitada do Pai, onde promove um estilo de alimentação saudável.

Todos são pais – as idades dos filhos variam entre os 11 meses e os 13 anos – revelam preocupações com a alimentação dos filhos e estes já os seguem na cozinha.

Hugo Brito já comprou uma faca para o filho de 4 anos

Apesar de ter seguido a área de artes plásticas no ArCo, em Lisboa, e de ter feito uma pós-graduação em Amesterdão, onde começou a trabalhar na cozinha por volta dos 28 anos, actualmente, Hugo Brito é chef no restaurante Boi-Cavalo e pai de Simão de 4 anos.

“O Simão ainda é muito pequenino, mas gosta de ajudar. Já lhe comprei uma faca romba para me ajudar a cortar alguns alimentos mais simples. Também me ajuda a mexer e a temperar com sal e pimenta”, conta ao PÚBLICO.

Apesar ter alguns cuidados, o cozinheiro nunca fez “comida para crianças” e habituou o filho a provar e comer de tudo, inclusive comida e alimentos típicos de outros países como lentilhas naan, sushi ou gnocchi. “O horizonte alimentar dele já é muito grande, e por essa mesma razão tem mais escolha e uma alimentação mais variada.”

“Quando era mais novo tivemos uma conversa e ficou definido que não pode dizer que não gosta das coisas sem as provar”, continua, acrescentando que muitas vezes Simão acaba por gostar depois de experimentar.

Como pai e também como chef sempre evitou dar ao filho açúcares refinados ou processados; e fá-lo comer bastantes vegetais e frutos como abacate, espinafres, brócolos e húmus, que Simão “adora”. Outra preocupação é com a comida processada e a proteína animal; estas podem ser substituídas por vegetais – num dia pode fazer espinafres salteados, noutro abóbora assada no forno com testo de amendoim por cima. Quantos aos refrigerantes podem ser substituídos por lassi de manga, por exemplo.

“Mesmo os snacks são quase todos baseados em vegetais. Apesar disso, também somos capazes de ir comer um hambúrguer”, explica, acrescentando, que não pretende ter um controlo muito excessivo em relação à alimentação do filho.

Para o dia do pai, os planos de Hugo passam por um almoço tipicamente português com os seus pais e o filho Simão.

Os filhos de Ricardo Dias Felner já cozinham

Não é chef, nem cozinheiro, é jornalista e tirou o curso na Universidade de Coimbra. Depois de ter trabalhado no PÚBLICO durante dez anos e de ter sido director da Time Out outros três, hoje é jornalista freelancer na área da gastronomia. 

Foi quando um colega de trabalho lhe incutiu o gosto pela área gastronómica que criou o blogue O homem que comia tudo e começou a colaborar com as revistas Vinho Grandes EscolhasSábado, ou com o jornal Expresso, entre outros.

“Além de ser viciado em livros não só de receitas, mas de gastronomia em geral, também converso e aprendo com pescadores, peixeiros, talhantes e merceeiros, que muitas vezes sabem melhor do que ninguém cozinhar ou confeccionar os produtos que vendem”, revela.

O jornalista tem três filhos: “Maria, de 13 anos, Francisco, de 11 e um mais novo com 11 meses”.

“Os mais velhos já cozinham sozinhos e tornaram-se pequenos gourmets”, conta, acrescentando que gostam de certas refeições, mas quando algo “não está ao seu gosto, também se tornam pequenos críticos gastronómicos”.

Desde os 12 meses que eles comem de tudo. Aos dois anos já comiam picante. “No outro dia fomos a um restaurante chinês e quando eles pediram os pratos o chefe de sala veio até à mesa dizer que não iam conseguir comer porque eram muito picante. No final, tinham conseguido comer o frango marinado em malaguetas e adoraram”.

E, tal como diz o provérbio, quando não se gosta come-se menos, para Ricardo Dias Felner é importante que os filhos comam e provem variados alimentos, mesmo que não gostem. Os mais velhos gostam quando o pai cozinha caril, porque desde pequenos estão habituados aos pratos com especiarias, “já cozinham ovos mexidos, massas, panquecas”. “O Francisco agora tem o vício de cozinhar ovos. Por vezes, às sete da manhã, acordo com ele a fazer ovos, gasta-me os ovos todos. Faz ovos estrelados melhor do que eu”, termina com um sorriso.

O filho de Rui Marques tem um banquinho para chegar à bancada

Preocupado com a alimentação do filho Lourenço, que na altura tinha cerca de 5 meses, Rui Marques sentiu a necessidade de substituir as “papas e os iogurtes carregados de açúcar” por alimentos mais saudáveis.

Foi nessa altura, em Junho de 2016, que decidiu criar o blogue A Pitada do Pai. “No primeiro mês houve mais adesão do que se esperava, talvez por ser menos comum ver um pai a escrever num blogue deste género”, lembra. Um mês depois foi convidado a escrever o livro homónimo.

Rui Marques, que apesar de se ter licenciado em engenharia mecatrónica sempre gostou de cozinhar, começou a descobrir alimentos aos quais ele e a família não estavam habituados, bem como “outras formas de adoçar com tâmaras, com maçãs e com bananas”.

“Os nossos filhos são autênticas esponjas, absorvem todos os nossos comportamentos. Por isso achamos que devíamos dar o exemplo”, justifica, acrescentando que como a mulher queria recuperar o peso que tinha antes de ficar grávida, “juntou-se o útil ao agradável”.

O engenheiro sublinha que quando se trata de crianças é importante descomplicar. “Se não quer comer a sopa, bebe a sopa. Coloco a sopa numa tigela e o Lourenço bebe com a palhinha. Se não gosta de encontrar pedaços de coentros na sopa, trituro-os. São crianças, num dia não gostam de tangerinas, no outro comem quatro ou cinco.”

Segundo o autor, tanto o livro como o blogue são baseados em receitas fáceis, práticas, simples e destinadas a toda a família. Como “pai, engenheiro, blogger e marido”, aconselha os mais ocupados a fazer uma organização semanal para ir às compras e preparar alguns pratos.

Sem curso de cozinheiro explica que sempre gostou de comer, ir a restaurantes, ver o Masterchef na televisão, ler livros de culinária e misturar e experimentar receitas. “Para mim a culinária é a combinação de sabores. Se percebermos que a beringela fica bem com o tomate, a partir daí fazemos uma papa, uma sopa, um puré, um acompanhamento, etc..”

Como nunca gostou de tratar da roupa, é Rui quem cozinha em casa, com a ajuda de Lourenço, actualmente com cerca de dois anos e meio. Além de já conseguir cozinhar ovos mexidos sozinho, já tem um “banquinho” na cozinha para ajudar o pai a fazer pão e bolos. “É importante trazer as crianças para a cozinha, ainda mais se gostarem de comer. É importante que façam parte do processo, irem experimentando e provando. Antes era só eu na cozinha, actualmente somos três”, congratula-se.

Rui, que agora vê a cozinha como um espaço familiar e um refúgio, explica que, apesar de não ser fundamentalista e de achar importante que o filho perceba o que é a regra e a excepção, espera que a alimentação saudável que pratica seja aquilo que Lourenço vai comer quando crescer e for ele a decidir.

“Para mim é importante contagiar e incentivar tanto os adultos como os mais novos a fazerem uma alimentação saudável. Além disso, a preocupação de pai muda-nos completamente. O Lourenço adora a açorda de aveia e os nuggets no forno com vegetais, mas em geral come quase tudo, se for preciso também come um hambúrguer. Equilíbrio, moderação e bom senso são os valores que lhe queremos passar e é o lema do blogue”, conclui.

Texto editado por Bárbara Wong

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