Deuses e heróis: as escrituras hindus são para levar a sério

O Governo indiano quer provar cientificamente que os escritos mitológicos são pura verdade. O objectivo é político.

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Ganesh, o deus hindu da prosperidade Amit Dave/REUTERS

A comissão encarregue pelo Governo indiano de demonstrar que a população hindu actual descende dos primeiros habitantes do território e defender que as antigas escrituras hindus descrevem factos, e não apenas mitos, considera "essencial estabelecer uma correlação” entre esses escritos e provas de que a civilização indiana data de há muitos milhares de anos.

Ao fazê-lo, sairiam fortalecidas as duas conclusões a que o comité quer chegar: que os acontecimentos descritos nos textos indianos são reais, e que a população hindu actual descende desses tempos mitológicos.

O ministro da Cultura, Mahesh Sharma,? explicou à Reuters que quer mesmo provar que as escrituras hindus são relatos factuais. Falando da Ramayana, a epopeia que segue a jornada de uma divindade hindu em forma humana, o ministro declarou: “Eu penso que é um documento histórico. Quem pensa que é ficção está redondamente enganado”. Esta história conta como o deus Rama salva a sua mulher de um demónio, e ainda hoje influencia os papéis de género e sentimento de dever de muitos indianos.

Sharma disse que era uma prioridade provar através de investigações arqueológicas a existência de um rio místico, o Saraswati, que é mencionado noutras escrituras antigas, os Vedas.

Outros projectos incluem o exame de artefactos de localizações das escrituras, fazer mapas de datas de acontecimentos astrológicos mencionados nestes textos e escavar locais de batalhas noutra epopeia, o Mahabharata.

Do mesmo modo que alguns cristãos apontam para provas de antigas cheias para apoiar a narrativa bíblica da Arca de Noé, a ideia na Índia é verificar locais e acontecimentos descritos nas antigas escrituras e se estes podem ser verificados, então as histórias podem ser classificadas como verdadeiras. “Se o Corão e a Bíblia podem ser consideradas parte da História, qual é o problema de aceitar os nossos textos religiosos hindus como parte da História da Índia?”, perguntou Sharma.

Modi não ordenou a criação do comité (foi Sharma quem o fez), mas já seguiu esta assunção de que as escrituras relatam factos. Numa inauguração em 2014 de um hospital em Bombaim, Modi apontou os progressos científicos documentados em textos antigos e foi mais longe: ao falar de Ganesha, a divindade com cabeça de elefante, especulou: “Nós veneramos o Deus Ganesha, e talvez tenha havido um cirurgião plástico naquela altura que manteve a cabeça de um elefante no tronco de um humano”, concluindo: “Há tantas áreas em que os nossos antepassados fizeram grandes contribuições.”

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