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Uma cidade japonesa com vista para o muro

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Entre a cidade de Rikuzentakata, no Japão, e o mar que lhe toca existe um muro de betão de 12,5 metros de altura. “Parece que vivemos numa prisão, embora não tenhamos feito nada de errado”, desabafou Atushi Fujita, habitante e pescador de 52 anos, à Reuters.

 

Quando, em 2011, um grande tsunami destruiu a pequena cidade japonesa, perto de duas mil pessoas perderam a vida. Os papéis do divórcio ditaram que nunca mais os habitantes confraternizariam com o gigante azul que, num ataque de fúria de 30 metros de altura, lhes roubou as casas, os familiares e os amigos. Políticos, engenheiros e técnicos garantiram à população de Rikuzentakata que a grande muralha a protegeria de uma nova vaga. “Mesmo que um possível tsunami tenha altura superior à da protecção, essa terá a capacidade de atrasar a inundação e de de garantir mais tempo para o processo de evacuação”, explica Hiroyasu Kawai, especialista do Instituto de Investigação Portuária e Aeroportuária de Yokosuka.

 

Segundo a Reuters, inicialmente, a ideia da construção do resguardo foi bem-vinda pela população; mas, ao longo do tempo, a grande parede foi ganhando inimigos. Há quem considere não ter sido suficientemente ouvido durante o período de planeamento e desconhecer até o custo da empreitada — o custo financeiro e o custo a longo prazo do desinvestimento noutras áreas. Há quem jure também que a grande estrutura afugenta o turismo – facto que a Reuters pôde constatar. “Há 50 anos vínhamos até aqui com as crianças e desfrutávamos dos passeios junto ao mar”, rememorou um turista idoso que comia ostras num restaurante com vista para o muro. “Hoje em dia, não há qualquer vestígio de que isso tenha sequer existido”, concluiu.

 

No Japão, em 2011, 18 mil pessoas perderam a vida em consequência do terramoto e tsunami – vidas humanas, animais e vegetais continuam reféns do impacto do grande desastre nuclear de Fukushima, mesmo nos dias que correm. A construção de grandes muros de protecção surgiu em reacção à perda de confiança nas estruturas quebra-mar que existiam e que falharam perante a violência da agressão marítima. Por isso existem, actualmente, 395 quilómetros de muro a proteger as cidades costeiras do Japão. Mas mesmo Yuichiro Ito, que perdeu a casa e o irmão mais novo no desastre natural, considera a grande muralha “uma paródia”. “Esperam manter-nos felizes por nos terem dado algo que nunca desejámos”, disse à Reuters. Já Katsuhiro Hatakeyama considera o paredão um mal necessário. “Foi graças a este muro que pude reconstruir o meu bed and breakfast e é graças a ele que hoje tenho um emprego."

 

Há quem encare com pesar o divórcio entre Rikuzentakata e o mar. O residente Sotaro Usui relembra: “Todos os habitantes de Rikuzentakata viveram, geração após geração, em contacto com o mar. Este muro separa-nos — e isso é insuportável.”