Viver a sua vida

Como Nossos Pais talvez seja demasiado convencional na forma, mas esta história de uma mulher em busca de sentido para a sua vida tem muito que a recomende.

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Há várias maneiras de olhar para Rosa, a personagem central de Como Nossos Pais, e toda a gente no filme de Laís Bodanzky a vê de maneira diferente. Para uns, Rosa é uma burguesa acomodada e careta que não consegue imaginar a vida fora de uma célula familiar tradicional; para outros uma egoísta que se queixa sem ter razões para isso, que tem uma vida confortável e nem assim se sente satisfeita. Na verdade, nem Rosa sabe bem o que é ou o que quer ser, mas sabe que está farta de ser a super-mulher que mantém a casa de pé, trabalha por fora e toma conta das filhas, que abdica dos seus próprios sonhos enquanto o marido vai cumprir os seus sendo activista pelo ambiente. Tudo isto fica mais ou menos dito sem ser dito na primeira cena de Como Nossos Pais, um almoço familiar, e de repente a bomba cai com uma frieza descomunal: a mãe de Rosa revela que a filha nasceu de um caso fugaz com um colega sociólogo durante uma conferência em Cuba. E se Rosa já estava um bocadinho em crise, agora vai ficar completamente à beira de um ataque de nervos.

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É um arranque fortíssimo, difícil de manter ao logo de duas horas — e nada no resto de Como Nossos Pais está a esse nível, com Laís Bodanzky a deixar o filme lentamente atolar-se numa história mais convencional de mulher em busca de si mesma. Bem contada, sim, de maneira eficaz e desenvolta, sem cair na banalidade maniqueísta telenovelesca, recusando-se a limitar o que aqui se passa a um mero desabafo de problemas burgueses do mundo ocidental. Mas ainda assim convencional, seguindo um arco narrativo razoavelmente clássico e filmada de maneira mais pragmática do que inspirada.

No entanto: uma das melhores coisas de Como Nossos Pais é a sua recusa de catalogar as personagens como “boas” ou “más”, preferindo apenas olhar para elas como seres humanos, e sabendo dirigir os actores de acordo com essa abordagem. Os homens podem ser imaturos e sedutores e convencidos, mas isso não faz deles monstros; toda a gente tem as suas razões, já dizia Renoir, e o filme de Laís Bodanzky parece levar esse mote muito (talvez até demasiado) a sério. Maria Ribeiro, que tem qualquer coisa de Sally Hawkins na pose e no olhar, é muito boa no papel de uma Rosa complexa e confusa, mas é Clarisse Abujamra, no pai da mãe libertada e libertária, prima próxima da Sónia Braga de Aquarius, que sela o interesse que Como Nossos Pais tem: é um filme sobre pessoas a viverem as suas vidas.

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