“Mas hoje há greve?”, perguntam os professores

No Liceu Camões, em Lisboa, em 70 docentes apenas dez aderiram à paralisação nesta terça-feira. Mas os sindicatos garantem que a adesão ficou entre os 60 e os 70%.

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Nuno Ferreira Santos

Estamos no período de aulas de manhã e os corredores do Liceu Camões, em Lisboa, estão vazios. Dentro das salas os professores que não fizeram greve dão as aulas normalmente. Na verdade não foram muitos os que seguiram o apelo dos sindicatos para faltarem esta terça-feira e se juntarem ao protesto contra as negociações falhadas com o Governo por causa do congelamento das carreiras e da contagem do tempo de serviço para efeitos de progressão. Dos 70 docentes que deveriam ter estado a leccionar no Camões na manhã desta terça-feira, apenas dez aderiram à greve, disse o director João Jaime ao PÚBLICO.

A meio da tarde desta terça-feira, as dez organizações sindicais de professores indicaram que a adesão ao primeiro de quatro dias de greve regionais se situou entre os 60 e os 70%, admitiram que houve “constrangimentos” por parte de muitos docentes, semelhantes aos que vários relataram ao PÚBLICO durante a visita ao Camões, mas disseram esperar que a adesão aumente nos próximos dias. Nesta terça-feira, a greve estava convocada para os distritos de Lisboa, Santarém, Setúbal e para a Região Autónoma da Madeira.

Os sindicatos informaram também que está já a ser discutida a data para uma “grande manifestação nacional” de professores, que se realizará no 3.º período de aulas caso o Governo não mude a sua posição.

Numa nota divulgada ainda por volta da meia-noite desta terça-feira, os ministérios da Educação e das Finanças confirmavam que as negociações sobre a recuperação do tempo de serviço chegaram ao fim e que o Governo apenas vai contabilizar pouco mais de dois anos do serviço prestado durante nove anos de congelamento das carreiras.

Mais concretamente, refere-se naquela nota, para efeitos de progressão na carreira serão tidos em conta “2 anos, 9 meses e 18 dias” dos sete anos de tempo de serviço prestado pelos professores entre 2011 e 2017. Os sindicatos exigiam também que fosse tido em conta o período entre 2005 e 2007, que também foi de congelamento das carreiras.

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Nuno Ferreira Santos

O Governo considera que, com a sua proposta, fica garantida a “equidade” entre as várias carreiras da Administração Pública, apesar de para a maioria estar assegurado que os sete anos de tempo de serviço entre 2011 e 2017 serão na íntegra recuperados, o que não acontecerá com os professores. Razão apontada: nas carreiras gerais os trabalhadores progridem de dez em dez anos, enquanto nos professores este intervalo é de quatro anos.

“Assim, os 7 anos de congelamento, que correspondem a 70% do módulo de uma carreira geral, traduzem-se em 70% de 4 anos na carreira docente, ou seja, 2 anos, 9 meses e 18 dias”, especifica-se.

"Só ontem houve reunião e se decidiu avançar"

De regresso ao liceu Camões, em Lisboa .Yamini Jetha, estudante no curso profissional de informática, conta que, da parte da manhã, o seu professor de português foi dos poucos que faltou. Aliás, desde que aqui estuda que Yamini só se lembra de um único professor ter feito greve - e agora. “No meu curso os professores têm que repor as aulas, é raro fazerem greve”, diz. 

Com 18 anos, diz que compreende “o lado dos ‘stores’”. As “carreiras estão congeladas, acho que têm direito ao descongelamento”. 

Esta não é a primeira greve. Alguns professores - que não quiseram ser identificados - não se tinham sequer apercebido da convocação. “Mas hoje há greve?”, pergunta ao PÚBLICO uma professora.

O director explica assim a fraca adesão: “Acho que tem a ver com a forma como foi marcada, só ontem houve reunião e se decidiu avançar”, comenta. “Esta é a semana em que os professores têm dificuldade em faltar porque é a semana das avaliações, com testes, discussão de trabalhos. É uma semana fulcral. Foi uma má semana para a greve”, refere. Porém, concorda com os motivos porque à “carreira dos professores, sobretudo dos mais novos, não podem ser subtraídos quase dez anos”. 

Em causa neste protesto está o facto de os sindicatos de professores quererem que seja contabilizado todo o tempo de serviço prestado durante o período de congelamento de carreiras, ou seja, mais de nove anos. Houve um primeiro período de congelamento entre 2005 e 2007 e um segundo entre 2011 e 2017.

“Para um professor que tenha 20 anos de carreira, só dez é que contam para progressão. Impede de chegarem ao topo da carreira”, explica, justificando a sua concordância. Depois não houve uma “reforma” antes de se chegar a este ponto. “Teria sido interessante reduzir os escalões” de dez para cinco, defende.

Já Lino Reis Neves, professor de Geometria Descritiva, faz sempre greve. Hoje não será excepção, garante à porta do liceu, onde irá ficar durante a tarde. “As causas justificam. Sobretudo por causa da progressão nas carreiras: o tempo de serviço que foi obliterado é prejudicial”.

A caminho da sala de aula, a professora de Português Lídia Teixeira diz que só na manhã desta terça-feira soube que havia greve. Decidiu não fazer: “Tenho matéria para dar, estou completamente apertada. É o fim do período, há testes e trabalhos”, explica. “Foi um mau timing para a greve”, reconhece.

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