Disputa entre CDS e PSD não é ideológica – e quem ganha é o PS

Pedro Adão e Silva e Daniel Oliveira consideram megalómana a ambição de Cristas de liderar a direita e lembram que o eleitorado flutuante que dá vitórias nas eleições não vota pela ideologia, mas sim consoante a economia.

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Paulo Pimenta

Quem ganha com a disputa entre Assunção Cristas e Rui Rio? O mesmo que ganhou com os discursos e com os dois congressos da direita: o PS – e por arrasto o Governo. Quem o diz é o politólogo Pedro Adão e Silva e o comentador e ex-dirigente do Bloco Daniel Oliveira. António Costa teve “dois fins-de-semana de férias”, ironiza Adão e Silva, enquanto o segundo antevê que, “enquanto a economia se mantiver boa, a esquerda continuará no poder, seja o PS sozinho ou com outros”, restando à direita continuar a percorrer o caminho das pedras.

“Quanto pior estiver a direita, melhor para o PS”, vinca Daniel Oliveira, para quem a agressividade com que Costa trata o CDS e os elogios faz a Rio são uma táctica para abrir brechas na direita. E Pedro Adão e Silva afirma que se há quem beneficie com as costas voltadas de Cristas e Rio é o PS – é bem mais difícil haver fuga de votos do PSD ou CDS para o BE…

“Tivemos dois congressos em menos de um mês e o que fica é muito menos a oposição ao Governo e muito mais a disputa entre partidos sobre quem ocupa o espaço de quem. Quando PSD e CDS crescerem isso vai acontecer aos dois e não um à custa do outro”, considera Pedro Adão e Silva, que acrescenta que a pretensão de Assunção Cristas liderar a direita roubando espaço ao PSD “é uma ilusão”.

Aliás, mais do que uma ilusão, é um “excesso de ambição” que “corre o risco de ser soberba” e acabar rapidamente contrariado nas europeias, avisa Adão e Silva. E lembra que Assunção Cristas se contradiz quando diz que quer ultrapassar o PSD, mas nas eleições europeias o CDS-PP se propõe apenas eleger dois eurodeputados (como já teve, embora hoje tenha só um).

Ora, esse objectivo de ser a primeira força da direita implica que apenas quatro meses depois das europeias em que quer ter 10% dos votos Assunção Cristas tenha que ultrapassar o PSD de Rui Rio – e chegar acima dos 30%, quando hoje, nas autarquias, sozinho, vale 3%. “É um grau de megalomania delirante. Pode-se compreender para um comício interno, mas dizer que é candidata a ficar em primeiro lugar ou à frente do PSD… Ninguém pode levar isso a sério”, afirma Daniel Oliveira.

O ex-bloquista admite que o CDS é “um partido muito elástico” e que “tem capacidade de penetração no eleitorado do PSD, como acontece com o Bloco no do PS”. Mas isso não chega como alavanca para os centristas. “O CDS será sempre um partido complementar do PSD, que tenta ocupar o espaço que este deixa livre” e que até “define a sua identidade dependendo do que acontece no PSD”. Daniel Oliveira afirma que Cristas está a “cavalgar uma narrativa sem grande sentido ao pensar que o PSD se deslocou para a esquerda e deixou eleitorado livre à direita”.

O centro “não é um espaço político-ideológico”, mas sim uma fatia do eleitorado que “vota no que acha que está a funcionar; são 500 mil que votam consoante está a economia” e se as actuais condições se mantiverem “vão votar no PS, satisfeitos com a 'geringonça'”, antevê Daniel Oliveira. O problema de Rui Rio, diz, é que “está certo no tempo (de tentar tirar o PSD do gueto e torná-lo menos antipático a um eleitorado menos ideológico) mas está errado nos passos que deu (dispôs-se a fazer acordos antes mesmo de fazer o programa, quando deveria ter feito o inverso)”.

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