Vai ser possível fazer o teste do VIH e das hepatites B e C na farmácia

Não é preciso receita médica. Se quiser saber se está ou não infectado, bastará picar o dedo e recolher três gotas de sangue. Os preços ainda não são conhecidos.

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Os testes rápidos terão sempre de ser confirmados posteriormente, caso sejam positivos guilherme Marques

As farmácias e os laboratórios de análises clínicas foram autorizadas a fazer testes rápidos para a detecção de infecção por VIH e hepatites virais (B e C) sem necessidade de prévia prescrição médica. Se quiser saber se está ou não infectado, bastará picar o dedo e recolher três gotas de sangue. Em cerca de 15 minutos terá acesso aos resultados com estes testes rápidos de rastreio que começam em breve a ser vendidos nestes locais. Os preços ainda não são conhecidos.

Invocando “a defesa do interesse público” e lembrando que a taxa de diagnóstico tardio de VIH/sida em Portugal é “das mais elevadas” da União Europeia, o Ministério da Saúde autoriza, por despacho publicado nesta segunda-feira em Diário da República, a utilização de dispositivos destinados a estes testes rápidos nas farmácias e também em laboratórios de patologia e de análises clínicas. A adesão dos estabelecimentos é voluntária.

Este tipo de testes já está disponível desde há anos nos hospitais e centros de saúde, em centros de aconselhamento de detecção precoce da infecção VIH/sida (CAD), nos centros de respostas integradas para comportamentos aditivos e dependências (CRI)  e em diversas organizações de base comunitária, onde são gratuitos.

Mas a sua venda ainda estava vedada nas farmácias, apesar de, entre 2011 e 2012, se ter realizado um projecto-piloto no Algarve, que se ficou por aí e não foi alargado ao resto do país.

Em Espanha, o custo deste tipo de dispositivos varia entre os 25 e os 30 euros, mas em Portugal os preços ainda terão que ser definidos pelo Infarmed (Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde).

“O que nos interessa é diversificar as formas de as pessoas acederem aos testes. Esta medida vai permitir identificar de forma mais precoce casos de infecção e acabará por contribuir para reduzir o estigma social”, acredita a directora dos programas nacionais para a infecção VIH/sida e hepatites virais da Direcção-Geral da Saúde (DGS), a médica Isabel Aldir. 

O objectivo é chegar a grupos que habitualmente não aderem às medidas convencionais, “quebrando o ciclo de transmissão e mudando o padrão epidemiológico”, reforça a bastonária da Ordem dos Farmacêuticos (OF), Ana Paula Martins.

Também designados point of care, os testes rápidos terão sempre que ser confirmados posteriormente, caso sejam reactivos (positivos). Apesar de muito fiáveis, não são testes de diagnóstico, mas apenas orientadores para o diagnóstico — que só é possível com recurso aos testes convencionais de laboratório. No caso do VIH, é preciso observar o chamado “período janela”, que é de três meses após a exposição ou contacto.

A vantagem é que, com este modelo que envolve as farmácias e os laboratórios, existe a garantia de que o farmacêutico ou outro profissional de saúde comunica o resultado e encaminha a pessoa para cuidados médicos, enfatiza Isabel Aldir.

“É uma medida emblemática, um passo em frente. Estes testes serão efectuados em condições de privacidade, num gabinete, os resultados serão transmitidos ali e a ocasião será aproveitada para fornecer informação adicional”, explica ainda Ana Paula Martins. “Já temos a experiência do programa troca de seringas e, apesar de se falar então no risco de discriminação, nada disso aconteceu”, recorda.

468 mil testes em 2016

Com uma rede de quase três mil estabelecimentos espalhados pelo país, as farmácias já fazem múltiplos testes, como colesterol, glicemia, entre outros, acentua  a bastonária. Também os laboratórios de patologia e análises clínicas (que, incluindo os postos, têm igualmente cerca de três mil estabelecimentos de norte a sul) contam com médicos, enfermeiros e farmacêuticos com formação nesta área, diz.

O Infarmed tem agora 30 dias para publicar as normas necessárias para operacionalizar a concretização da medida, salvaguardando a confidencialidade e privacidade, a prestação de informação apropriada  por profissionais de saúde — que terão formação para aconselhamento antes e depois do teste e a adequada referenciação, refere o despacho.

Os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde vão desenvolver, também no prazo de 30 dias, o processo de referenciação das farmácias comunitárias e dos laboratórios para os serviços hospitalares e a qualificação dos profissionais será da responsabilidade da Ordem dos Farmacêuticos. À DGS caberá apresentar um relatório de monitorização e avaliação da medida até 31 de Janeiro de 2019.

Em 2016, fizeram-se 468.301 testes de rastreio de VIH, 203.836 dos quais nas instituições hospitalares e 235.900 em entidades convencionadas. Foram ainda efectuados 10.916 testes nos centros de acolhimento e de detecção precoce, 3980 nas unidades de cuidados de saúde primários e 13.669 nas organizações não governamentais e organizações de base comunitária. Isabel Aldir adianta, a propósito, que em 2017 já foram feitos cerca de 11 mil testes rápidos.

Continua em estudo a possibilidade de os testes rápidos para rastreio de VIH serem feitos em casa, com autocolheita de sangue, diz a médica. A associação Abraço já adiantou que está pronta para avançar com uma experiência de autocolheita de sangue em casa e com análises realizadas pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge.

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