Love: o amor acabou

A série cómica do Netflix sobre a relação nem sempre recomendável entre duas pessoas criada por Judd Apatow, Lesley Arfin e Paul Rust, que a protagoniza com Gillian Jacobs, chegou à terceira e última temporada, disponível desde esta sexta-feira.

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Gillian Jacobs, Claudia O'Doherty e Paul Rust em Love Netflix

Mickey e Gus não nasceram um para o outro. Apesar disso, as personagens de Gillian Jacobs e Paul Rust, respectivamente, passaram as duas primeiras épocas de Love a apaixonarem-se e a comprometerem-se numa relação duradoura. Nada mau, para duas pessoas altamente auto-sabotadoras. A terceira e derradeira temporada, que tem 12 episódios e está disponível no Netflix desde esta sexta-feira, mostra-os a tentarem fazer essa união funcionar como podem, enquanto o passado de ambos tenta fazê-los voltar ao que eram antes.

O passado é, aliás, algo que vem ao de cima muitas vezes por aqui, com momentos cruciais da vida de Gus a serem explorados nesta temporada. Apesar de a série ter começado em 2016, a acção passa-se apenas no espaço de alguns meses, e mostra os altos e baixos da vida dos dois, uma viciada que está em recuperação e um tipo aparentemente simpático que é frequentemente um idiota para quem o rodeia, com problemas de gestão da raiva.

Além das personagens principais, Love também se foca em personagens como a colega de casa de Mickey, Bertie, interpretada pela australiana Claudia O’Doherty, uma cómica hilariante, cheia de vida, que é quase sempre o ponto alto de tudo em que aparece, e o seu namorado simpático mas algo inútil, um amigo de Gus chamado Randy, a quem é dada vida por Mike Mitchell, do grupo de sketches Birthday Boys. Também mostra as pessoas do trabalho de ambos, como Brett Gelman, um patético terapeuta radiofónico que trabalha na rádio onde Mickey é produtora e acredita que as vozes masculinas são hoje pouco ouvidas num mundo cada vez mais feminista, e Iris Apatow, a estrela de uma série de bruxas onde Gus trabalha como tutor, bem como os amigos dos dois – que nem sempre são tão amigos assim.

O apelido de Iris Apatow não engana: é mesmo filha de Judd Apatow, que co-criou a série com Rust e Lesley Arfin, com quem o protagonista é casado na vida real (é mais ou menos baseada numa parte ínfima da história da relação entre os dois). Apatow também realiza alguns episódios – nomes como Lynn Shelton, a responsável por Humpday - Deu Para o Torto, ou Entre Irmãs, Janicza Bravo, que realizou Lemon, do ano passado, e foi actriz na temporada anterior da série, ou Michael Showalter, o cómico da trupe The State e alguém que recentemente realizou o nomeado para Óscares Amor de Improviso, também estão atrás das câmaras nesta temporada.

A criação tem muito de Apatow, com a franqueza e o realismo com que trata as relações humanas, bem como de Arfin, que colaborou com o criador quando escrevia para Girls, mas Rust, fora disto, é mais conhecido por um sentido de absurdo que tem sido cultivado no mundo da comédia de sketches, na sua banda Don't Stop Or We'll Die, inúmeras participações no podcast Comedy Bang! Bang!, ou a co-escrever Pee-wee's Big Holiday, o subvalorizado filme de Pee-wee Herman que saiu no Netflix em 2016. Essa veia só vem ao de cima ocasionalmente na palermice – no bom sentido – da sua personagem em Love.

Love passa-se numa Los Angeles que raramente vemos na televisão, ainda que se aventure pelo mundo de Hollywood, com alguma paródia desse universo. Nesta temporada, por exemplo, Witchita, a tal série de bruxas em que Gus trabalha, é reformulada para não ser cancelada, com um novo e pouco talentoso elenco, e o próprio Gus decide tentar a sua sorte a realizar um filme, um thriller erótico a cujo guião a namorada dele se refere como algo na onda de Janela Indiscreta, só que para melhor, e que não poderia estar mais longe disso.

Esta última época de Love analisa o que é para aquelas duas pessoas estarem numa relação, com ressentimentos, desilusões passadas e a forma como trataram os outros no passado – e até no presente – a virem ao de cima. Com muita melancolia, tristeza, desconforto – algo que é frequentemente hilariante, como quando a incomparável Vanessa Bayer, ex-Saturday Night Live, a fazer de ex de Gus, canta Bangles num casamento – e ao mesmo tempo doçura, com coisas para dizer sobre as relações e as pessoas. Vai deixar saudades.

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