Roubada password de procuradora para aceder a inquérito dos emails

Técnico informático que terá roubado a senha fica em prisão preventiva enquanto assessor jurídico do Benfica que o terá corrompido está proibido de contactar outros quatro arguidos do caso.

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JOSE COELHO/LUSA

O técnico de informática que terá roubado a password de uma procuradora para aceder a informações sobre processos que se encontram em segredo de justiça ficou preso preventivamente, enquanto o assessor jurídico do Benfica, Paulo Gonçalves, indiciado por o ter corrompido apenas está proibido de contactar os outros quatro arguidos do caso.

As medidas de coacção divulgadas pelas televisões foram conhecidas esta quarta-feira já depois das 22h30. Paulo Gonçalves saiu em liberdade, mas indiciado por um crime de corrupção e quatro de violação do segredo de justiça. Já o técnico de informática está indiciado por corrupção, quatro crimes de violação do segredo de justiça, um de falsidade informática e nove de acesso ilegítimo. 

Uma parte deles diz respeito aos acessos que terá feito ao inquérito dos emails com a password que pertencia a uma procuradora que está colocada no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa, mas se encontra destacada para investigar o caso da máfia do sangue que corre no Departamento Central de Investigação e Acção Penal.

A informação foi avançada pela revista Sábado e confirmada pelo PÚBLICO, que apurou que esta não terá sido a única password roubada pelo oficial de justiça que está em comissão de serviço no Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ) e que faz parte de uma equipa que presta apoio informático aos tribunais da comarca de Braga.

A procuradora está há mais de ano e meio afastada do DIAP de Lisboa, já que foi destacada para assessorar a procuradora-geral distrital de Lisboa, Maria José Morgado. Pouco tempo depois acabou por ser requisitada em exclusivo para acompanhar o processo do sangue que envolve a farmacêutica Octapharma.

Apesar de não estar no DIAP de Lisboa há longos meses a magistrada continuava a possuir credenciais activas que lhe permitiriam aceder aos processos a correr naquele departamento, nomeadamente ao caso dos emails que tanto interesse suscita à cúpula do Benfica sobre quem recaem as suspeitas deste caso.

Uma fonte do IGFEJ explicou ao PÚBLICO que o acesso devia ser retirado a quem está fora de um departamento, mas adiantou que é “prática comum” tal não acontecer, o que terá facilitado o roubo da password. Nos tribunais, as senhas não têm prazo de validade, mantendo-se válidas por longos períodos sem necessidade de qualquer alteração. Os cartões que os magistrados possuem também só são obrigatórios no caso de um magistrado querer assinar electronicamente um despacho.

Todas as outras operações, nomeadamente a consulta e a impressão de documentos, são possíveis sem necessidade de cartão. E o acesso pode ser feito remotamente, como terá acontecido com o técnico que trabalhava na comarca de Braga.

Apanhado pelo endereço de IP

O rasto deixado pelas operações, nomeadamente o endereço IP do computador de onde foram ordenadas, terá permitido aos investigadores da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da PJ chegar ao técnico que trabalha em Braga. Isto porque a leitura dos registos que ficam no sistema permitiu perceber que no mesmo computador num espaço de minutos eram feitas operações normais por um elemento da equipa local de Braga e a consulta de processos pendentes no DIAP de Lisboa.

Acessíveis ao técnico estariam igualmente os passos dados pelo DIAP de Lisboa relativamente às três queixas-crime apresentadas pelo Benfica e que o Ministério Público decidiu reunir num único inquérito, que, como o caso dos emails, corre na 9.ª secção daquele departamento.

No IGFEJ, que colaborou com a PJ nesta investigação, continua a ser um mistério como é que um técnico que trabalha em Braga conseguiu descobrir a password de uma magistrada que exerce as funções a mais de 300 quilómetros e com quem nunca se terá cruzado. As senhas são encriptadas e não estão acessíveis mesmo aos administradores de sistemas. Estes terão, no entanto, poderes para definir as permissões dos utilizadores o que poderá explicar como um oficial da justiça que trabalha na instância local criminal de Guimarães conseguiu aceder a registos de processos fora da sua comarca aos quais, em princípio, não deveria ter acesso.  

O inquérito, conhecido como E-Toupeira, centra-se em Paulo Gonçalves que é suspeito de pagar com favores e prendas informações sobre processos judiciais em curso. Os dados seriam transmitidos por três funcionários judiciais, um dos quais estava a trabalhar como técnico informático. Além deste, foram constituídos arguidos mais dois oficiais de justiça e um agente desportivo que serviria de intermediário entre os primeiros e o assessor do Benfica, levando informação e documentos para Lisboa e de lá trazendo convites e outras prendas.

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