Ministro e Pinto Monteiro foram chamados a depor e sindicato desistiu de queixa

Alberto Costa e Pinto Monteiro "não têm recordação" de terem sequer sido notificados. Sindicato confirma que em 2008 desistiu da queixa feita antes porque altas individualidades estavam arroladas como testemunhas.

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Para os guardas prisionais, a publicação das denúncias minavam a sua credibilidade Paulo Pimenta
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Sindicato alegava que denúncias causavam "alarme na opinião pública" Adriano Miranda

O julgamento decorria em 2008, quando Alberto Costa era ministro da Justiça e Pinto Monteiro procurador-geral da República. O processo tinha origem numa queixa do Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional (SNCGP) feita em 2004. O sociólogo e activista António Pedro Dores, professor do Departamento de Sociologia e do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES/ISCTE-IUL) respondia em tribunal por ter divulgado na comunicação social "queixas documentadas de gritantes violações dos direitos humanos”.

Na contestação, consultada pelo PÚBLICO, o advogado José Preto referia ainda que o relatório dos investigadores do Comité para a Prevenção da Tortura (CPT) do Conselho da Europa com denúncias sobre a situação das prisões – que é periodicamente publicado em vários países – era “globalmente confirmativo das queixas recebidas” pelo arguido e que este divulgava. José Preto referia-se ao documento relativo a Portugal que, nesse ano, foi tornado público quando decorria o julgamento de António Dores. 

Numa das respostas à avaliação feita pelos investigadores do CPT, as autoridades portuguesas diziam não ter conhecimento de algumas situações, como a de reclusos serem desencorajados de apresentar queixas ou intimidados quando o tentavam fazer, como denunciava a Associação Contra a Exlusão pelo Desenvolvimento (ACED) de António Dores. 

Não era essa a experiência que tinha e tem António Pedro Dores: "A ACED queixou-se, em diversas ocasiões, expressamente, das perseguições a que estão sujeitos os presos, e tinha por prática informar os queixosos para saber se estavam preparados para resistir às consequências de fazerem queixa através da associação." 

Julgamento sem desfecho

Lendo a resposta do Governo português ao CPT, o advogado José Preto decidiu arrolar como testemunhas o ministro Alberto Costa e Pinto Monteiro, entre outras figuras, como o então director-geral dos serviços prisionais Rui Sá Gomes, e directores de cadeias.

A partir desse momento, o julgamento não prosseguiu. As sessões previstas já não se realizaram. O SNCGP desistiu da queixa e fê-lo por sugestão da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP). 

“Desistimos da queixa contra António Pedro Dores a pedido da direcção-geral”, confirmou ao PÚBLICO Jorge Alves, presidente do sindicato. “Na altura fomos contactados pelo director Rui Sá Gomes, e acabámos por desistir da queixa. Foi falado connosco que seria melhor assim.” Caso contrário, continua Jorge Alves, “o ministro teria de depor".

Já passaram dez anos. “Na altura era mais importante para nós o que estávamos a negociar [com o Governo] para as carreiras dos guardas prisionais do que esta queixa [que já tinha quatro anos]. Concordámos sobre a importância de se criar um clima de confiança com o ministério que permitisse um cenário favorável às negociações” em curso.

Ex-director não desmente 

Contactado pelo PÚBLICO, o ex-director-geral Rui Sá Gomes começou por dizer que não deu "ordem nenhuma a ninguém para desistir da queixa". Mas não desmente ter conversado com o sindicato. "Posso ter falado, não me lembro", admite. Já a DGRSP, actualmente dirigida pelo procurador Celso Manata, responde por email: "A Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais não comenta hipotéticas conversas que anteriores direcções possam, eventualmente, ter tido com quem quer que seja."

Nos anos que se seguiram, António Pedro Dores foi processado e algumas vezes julgado. Mas este caso ficou na memória do seu advogado como relevador por ter tido o desfecho que teve.

“Não tenho nenhuma recordação de ter sido notificado”, garante Alberto Costa, ex-ministro da Justiça do Governo de José Sócrates. O mesmo garante Pinto Monteiro, também contactado pelo PÚBLICO. "Se eu tivesse sido notificado, não teria deixado de responder por escrito."

“Sou completamente alheio a qualquer diligência que tenha sido feita”, acrescenta Alberto Costa quando questionado sobre a informação de que o então director-geral dos serviços prisionais, Rui Sá Gomes, sob tutela do Ministério da Justiça, persuadiu o sindicato dos guardas a desistir da queixa. 

 

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