Forretas de tempo

Os forretas de dinheiro desperdiçam o tempo a juntar tostões. Os forretas de tempo pensam que estão a acumular tempo com cada minuto que poupam. Mas uns e outros morrem quando têm de morrer.

Não sou forreta com o dinheiro. Mas sou forreta com o tempo. Como o tempo é dinheiro temo que a avareza seja a mesma. Pense-se numa forreta que, apesar de ser rica, não quer gastar dinheiro a comprar os medicamentos que a médica lhe receitou — e morre por causa disso. Compare-se com uma forreta de tempo que se sente muito mal mas, apesar de não ter nada para fazer, não tem pachorra para ir a um hospital por causa das horas que vai perder — e morre por causa disso.

Os forretas de dinheiro desperdiçam o tempo a juntar tostões. Os forretas de tempo pensam que estão a acumular tempo com cada minuto que poupam. Mas uns e outros morrem quando têm de morrer. Os forretas de dinheiro morrem ricos mas pelo menos deixam a riqueza para os vivos. Já os forretas de tempo morrem sem deixar nada porque o tempo deles acabou.

Ou pode? Começa aqui a apologia da avareza temporal. Se o forreta de tempo usa o tempo que poupa para fazer alguma coisa pelos outros será que pode ser perdoado? A escritora que passa o tempo todo a escrever, reduzindo o resto da vida ao mínimo pode ser uma forreta das piores para os amigos, para a família e para si própria (não perdendo tempo, por exemplo, com a saúde e a higiene) mas quando morre deixa os livros que escreveu.

Partindo do princípio que são bons — um princípio muito raro — dá a milhares de pessoas a distracção agradável de ler o que ela escreveu. Só que as pessoas precisam de tempo para lê-la. Conclusão: além de forreta também é uma ladra do pior.

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