Pirotecnia, cânticos e fanatismo: um típico clássico helénico

PAOK e Olympiacos vão defrontar-se no domingo, numa partida importante para as contas do título. O PÚBLICO foi tentar perceber como operam as claques nestes clássicos.

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Forte presença policial não impede confrontos nos estádios REUTERS/Yorgos Karahalis

“Sente-se uma adrenalina, misturada com um prazer enorme. Acho que não há partida como esta. É muito mais que um jogo”. As palavras são de Fernando Varela, jogador do PAOK de Salónica, que esta época se encontra em boa posição para acabar com uma seca de campeonatos que dura há 33 anos. Na caminhada para alcançar o tão cobiçado troféu, enfrenta domingo o heptacampeão, Olympiacos, principal rival do clube de Salónica, num encontro escaldante que merece especial atenção das autoridades.

O central cabo-verdiano, titular na equipa desde que aterrou na Grécia em Junho de 2016, admite ao PÚBLICO que é intimidante jogar na casa dos tradicionais candidatos ao título: “Aqui [na Grécia] não há limites para os adeptos. Se tiverem de entrar em campo, entram”. Mas no jogo de domingo, da 23.ª jornada da Superliga, contará com o apoio da sua massa associativa, conhecida por ser uma das mais ruidosas da Europa.

Na entrada das equipas no Estádio Toumba, 28 mil fãs cantam a plenos pulmões. O recinto fica completamente iluminado pelo brilho incandescente de centenas de tochas. Petardos, foguetes e milhares de papéis são arremessados das bancadas. Tudo isto para intimidar o adversário e injectar motivação extra nos jogadores da casa.

O PÚBLICO conseguiu acesso exclusivo a uma das claques mais fervorosas — e violentas — da Europa. O nosso interlocutor, de seu nome Christos, vive em Evosmos, zona oeste da cidade de Salónica. Desempenha um papel activo no grupo Gate 4 (Porta 4, alusivo ao portão de entrada dos ultras) e preferiu não revelar o seu apelido, por precaução: “A política da claque é não falar com jornalistas”, justifica.

O embate do PAOK com os rivais é planeado meticulosamente, como se percebe pela descrição de Christos. “Preparamos o clássico com meses de antecedência. Compramos as tochas e fazemos as tarjas”, explica, genericamente, para depois se debruçar sobre o encontro de domingo. “Como estamos em primeiro, queremos fazer uma coreografia monumental. Queremos que eles entrem desconcentrados na partida”, afirma. Mal abrem os portões — duas horas antes do início da partida — os membros da claque Gate 4, constituída por cerca de 3000 elementos, entram no estádio e, até ao final do jogo, não deixam de apoiar a equipa.

Um dos factores assustadoramente impressionantes é a quantidade de artefactos pirotécnicos usados nos estádios helénicos. A falta de revistas minuciosas, por parte das autoridades policiais, torna a entrada destes objectos nos recintos em algo trivial. Um cenário que Christos explica de forma directa: “A polícia tem medo do nosso grupo. E a sociedade também. Levamos o material escondido na roupa ou enchemos uma mochila e mandamos para dentro do estádio”, refere o membro da claque.

Outro dos rituais praticados pelo Gate 4 tem um carácter provocatório para com as claques rivais — consiste em ir roubando, ao longo da época, material alusivo a outros clubes para o exibir, virado ao contrário, e queimar nas bancadas durante os jogos de maior risco.

Os jornalistas também não escapam à fúria dos adeptos, com o grego a dizer que os profissionais “falam sempre melhor dos emblemas de Atenas” e que, quando se referem ao PAOK, “apenas noticiam coisas negativas”.

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Adeptos do clube são conhecidos pelo fanatismo Action Images / Matthew Childs

Vasilis Tempelis é jornalista desportivo em Atenas. Responde à acusação do adepto dizendo que “é uma queixa que toda a gente de Salónica tem”. “Eles têm uma parte de razão, porque algumas vezes os meios de comunicação social prestam mais atenção aos clubes da capital”, afirma o repórter do Sport24. Quanto ao fervor clubístico, Vasilis refere, entre risos, que se trata de uma “questão mediterrânica”. “Portugueses, gregos e  italianos são povos quentes”, atesta. Mas o clima crispado em nada impede o exercício livre da actividade jornalística, segundo Vasilis: “Podes escrever o que quiseres. Sobre os jogadores, sobre os adeptos, tudo”.

O jogo de domingo realiza-se às 17h30, hora portuguesa. Se vencer, o PAOK mantém a esperança de levantar o troféu de campeão, 33 anos depois. O Olympiacos, terceiro classificado, está obrigado a vencer o rival para não ficar totalmente afastado da luta pelo título.

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