Tribunal reabre discussão sobre hipermercado no centro histórico

O Tribunal Central Administrativo do Norte (TCAN) reconheceu ao grupo de cidadãos que se opõe ao hipermercado construído na rua 25 de Abril a legitimidade da providência cautelar apresentada, revogando a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em Outubro. As eventuais violações do PDM decorrentes da construção do edifício terão mesmo de ser decididas na justiça.

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A providência cautelar interposta em Abril pelo movimento de cidadãos “Em Defesa da Rua 25 de Abril”, que considerou indevido o licenciamento de um edifício de raiz, de 2300 metros quadrados, para albergar um hipermercado da marca Continente (pertencente ao mesmo grupo que detém o PÚBLICO) naquela zona limite do centro histórico bracarense vai mesmo ter de ser apreciada em tribunal.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAFB) indeferiu, no final de Outubro, a providência, justificando a sentença com a “falta de legitimidade” e com a incapacidade do grupo de cidadãos em explicar como a “construção em causa, a ser ilegal, era contrária aos interesses da população da cidade de Braga”.

Após a sentença, o hipermercado foi inaugurado no final de Novembro de 2017, mas o movimento recorreu, e o Tribunal Central Administrativo do Norte (TCAN) acabou por revogar a decisão anterior, lendo-se no acórdão proferido na segunda-feira que a legitimidade da acção se baseia apenas “na qualidade de cidadão, e não na invocação de um interesse individual ou de um interesse difuso”.

“A sentença fica sem validade e é substituída por esta que diz que podemos discutir a acção. Os cidadãos podem ou não discutir questões de urbanismo? O Tribunal Central Administrativo do Norte diz que podem e que se enquadram precisamente nos meios de fiscalização cívica das autarquias”, afirma ao PÚBLICO Luís Tarroso Gomes, um dos quatro autores do manifesto “Em Defesa da Rua 25 de Abril”, subscrito por mais de um milhar de cidadãos.

O advogado frisou que a decisão do TAFB era “completamente absurda”, defendendo que, segundo a Constituição de 1976, “faz parte da vida democrática discutir as decisões da Câmara Municipal”, nomeadamente as de cariz técnico. Para Tarroso Gomes, a decisão do TCAN mostrou ainda que os cidadãos podem contar com os tribunais e que o seu direito de discutir “não tem de ser visto como um atrevimento”. “Os cidadãos detectam que uma situação não cumpre a lei, e têm o direito de submeter a tribunal a discussão. Era isso que estava a ser vedado com a sentença anterior”, explicou.

“Vários cenários possíveis” com o caso de volta ao tribunal

Com a providência cautelar de volta às mãos do Tribunal Administrativo de Braga, a discussão da legalidade do edifício fica reaberta. O movimento “Em Defesa 25 de Abril” afirma que o hipermercado, como já se encontra no lado da rua 25 de Abril que pertence ao centro histórico de Braga, viola cinco parâmetros do regulamento do Plano Director Municipal (PDM) para essa área – estão relacionados com os usos que um edifício do centro histórico sem fins habitacionais pode ter, com a coerência arquitectónica face aos edifícios em redor e a impermeabilização máxima dos solos permitida (75% da área total construída). “Não estamos a discutir o hipermercado, estamos a discutir o edifício, se um pavilhão industrial pode ser feito ali, com as regras que existem”, diz Tarroso Gomes.

Caso a decisão do TAFB seja favorável, o cidadão diz que há “vários cenários possíveis”, que passam pela demolição do edifício, caso seja reconhecida à providência cautelar razão em todos os parâmetros, ou pela sua adaptação pela entidade proprietária – a IPSS Oficinas de S. José -, caso a razão diga respeito a apenas alguns parâmetros – no último debate organizado pelo movimento de cidadãos, em Outubro de 2017, propôs-se a eliminação do parque de estacionamento.

Tarroso Gomes avisou, contudo, que “não há grande experiência dos tribunais actuarem rapidamente em questões de urbanismo” e considerou que Câmara Municipal de Braga deveria ter feito “uma avaliação escrupulosa das normas”, ainda para mais “normas próprias”, aquando do licenciamento.

O presidente da Câmara de Braga, Ricardo Rio antecipou que o TAFB vai apenas julgar a acção principal do movimento de cidadãos, interposta em Maio, que reitera a ilegalidade do edifício construído, e não a providência cautelar reconhecida como legítima pelo TCAN, já que “incidia sobre o licenciamento da unidade comercial”, que “já está em pleno funcionamento”.

Convicto que o equipamento foi correctamente licenciado e “não violou nenhuma norma, nem nenhum Código do Regulamento Municipal, nem nenhuma lei geral, nem o PDM”, o autarca reconheceu que o edifício pode ter de ser adaptado ou demolido, caso o tribunal encontre irregularidades. “Se o tribunal considerar que existiu, estranhamente, qualquer vicissitude, podemos avaliar se essa vicissitude é corrigível ou não. Se for, poderá o promotor regularizar o que estiver irregular. Se não for, a consequência lógica seria a interrupção da actividade e a demolição do próprio edifício”, adiantou.

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