Chris Becker/Unsplash
Megafone
As vítimas das vendas fora de controlo: pessoas e animais
Porque é que as pessoas são enganadas no momento da compra de animais?
Ana Fernandes é presidente da Associação Zoófila Portuguesa
Efectivamente, existem milhares de cães, em associações e em canis municipais, que estão hoje para adopção: grandes, pequenos, pretos, castanhos, brancos, com olhos verdes ou azuis, de raça ou sem raça definida.
Neste quadro, é difícil perceber que continue a haver um mercado relacionado com criação e venda de animais de estimação. É ainda mais difícil aceitar que a maior parte desse mercado seja informal. Isto significa que, quem opera nesse mercado, não está legalizado, muitas vezes não respeita as condições básicas de vida dos animais, e naturalmente, não paga impostos. Alguns até falsificam documentação para que possam, de forma simples, ganhar dinheiro ao vender uma “mercadoria” enganando os “clientes”.
Porque é que existe esse mercado? Porque é que as pessoas são enganadas no momento da compra? Porque é que alguns dos animais, alegadamente saudáveis e com as vacinas em dia, acabam em hospitais e, por vezes, morrem? Porque é que as pessoas continuam a comprar cães pela Internet?
Provavelmente, porque não sabem que a lei existe para as proteger e que devemos fazer uso dela. A legislação tem evoluído no sentido de proteger os animais alvo de comércio e as pessoas que optam por comprar um animal.
No ano passado, o parlamento aprovou, com a abstenção do CDS-PP, o projecto de lei do PAN que regula a compra e venda de animais de companhia. A Lei n.º 95/2017 de 23-08-2017 vem introduzir algumas alterações relevantes, nomeadamente a proibição da venda pela Internet e vem regular a informação obrigatória que tem de constar nos anúncios e no momento da compra e venda.
Entre outras coisas, diz que qualquer transmissão de propriedade de animal de companhia deve ser acompanhada de declaração médico-veterinária, passada há menos de 15 dias, que ateste que o animal se encontra de boa saúde e apto a ser vendido, devendo incluir ainda informação sobre as vacinas e historial clínico do animal.
O diploma estabelece ainda um registo de criadores profissionais, que devem comunicar a sua actividade à DGAV (Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária) para poderem comercializar os animais.
Como em muitas outras situações, o que se observa numa primeira reacção do mercado à lei é avançar-se pela tentativa de perpetuar a informalidade, com a utilização fraudulenta de carimbos de veterinários, falsificando a documentação que a lei exige.
Podemos questionarmo-nos como é que um criador, que actua à margem da legalidade — e portanto não cumpre, entre outros aspectos, as regras básicas de bem-estar animal — conseguiria obter um boletim de vacinas devidamente preenchido, informação clínica e um atestado médico com validade de menos de 15 dias?
Verificamos, mais uma vez, que a aplicação da legislação tem se ser assegurada pelas entidades competentes, mas que compete ao cidadão comum colaborar também e assegurar a sua defesa, devendo fazer tudo para minimizar os enganos, embustes e mesmo as burlas.
Querendo adquirir um animal de estimação, está nas nossas mãos obter informação, em primeiro lugar, sobre o registo do criador no site da DGAV; segundo, pedir toda a documentação obrigatória; e terceiro, verificar a veracidade da informação clínica. Para isso, basta ligar para o médico que atesta a saúde do animal para perceber se estamos perante informação verdadeira. Não sendo verdadeira, temos obrigação de denunciar.
Pessoas informadas fazem com que o funcionamento do mercado seja mais justo, neste caso para as pessoas que escolhem comprar animais e para todos os animais que têm a pouca sorte de caírem nas armadilhas dos criadores que actuam à margem da lei.