A economia “caracóis dourados”?

A economia parece estar a crescer de forma moderada, quase 4% por ano em termos nominais. Este desempenho das contas externas do país, mais do que o crescimento económico, é surpreendente.

Na passada quarta-feira soube-se que o PIB terá crescido 2,7% em 2017 em termos reais, a melhor taxa de crescimento económico desde 2000. A confirmar-se, ficará acima dos 2,6% da previsão mais recente do Governo.

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É importante, porém, notar que a economia esteve praticamente estagnada nos últimos 17 anos, com o PIB real a crescer 7,4% desde 2000 ficando ainda, em 2017, -1,4% abaixo do pico atingido em 2008. O investimento caiu 25% entre 2008 e 2017. Ou seja, 17 anos com uma taxa de crescimento real anual média de 0,42%, os últimos 9 anos dos quais com uma taxa de crescimento real anual negativa de –0,16%.

Finalmente, 2018 será o ano em que o país ultrapassará o PIB de 2008. Uma década perdida para a economia portuguesa, não obstante a significativa e importante melhoria das contas externas que ocorreu no período (de cerca de 12,5 p.p. do PIB).

Segundo o INE, contribuiu para o crescimento agora observado o aumento da procura interna, em resultado da aceleração do investimento, mantendo-se o contributo das exportações líquidas marginalmente negativo (–0,1 p.p.).

Ou seja, a economia parece estar a crescer de forma moderada, quase 4% por ano em termos nominais, puxada pelo investimento e sem que daí resulte – ao contrário do que ocorria no passado – uma deterioração das contas externas, nomeadamente na balança comercial. Este desempenho das contas externas do país, mais do que o crescimento económico, é surpreendente.

Parece ser o que muitos economistas americanos designavam por economia “Goldilocks” (de “Caracóis dourados e os três ursinhos”), uma expressão profundamente irritante que ficou, e que descreve uma economia nem demasiado “quente” nem demasiado “fria”, com taxa de crescimento económico moderada e taxas de inflação baixas, desempenho esse compatível com uma política monetária não restritiva.

Quais as principais ilações a retirar do crescimento económico observado em 2017?

Primeiro, o crescimento observado ficou significativamente abaixo do que sugeria o desempenho do primeiro trimestre de 2017, defraudando as expectativas de muitos, incluindo as do autor. Ainda não foi em 2017 que se quebrou a barreira psicológica dos 3% de crescimento económico.

Segundo, a política orçamental deverá ter tido um efeito globalmente restritivo e contra cíclico. Em contabilidade pública, a despesa primária cresce 1,7%, muito abaixo da taxa nominal de crescimento da economia, que deverá ter sido próxima de 4%. Em contraste com a despesa pública, as receitas das Administrações Públicas cresceram 3,8%.

Terceiro, o crescimento económico parece sustentável, dado o bom comportamento das exportações e das economias da zona euro. O aumento das importações não se afigura preocupante, após anos de redução e/ou estagnação do investimento privado e público. A estimativa de crescimento económico do Governo para 2018 (2,2%) parece conservadora. O principal risco no momento é a valorização do euro face ao dólar.

Em conclusão, a economia está num ciclo virtuoso sem paralelo na História do país porque acompanhado por contas externas ligeiramente superavitárias. O crescimento económico em 2018 poderá surpreender pela positiva, o que, em conjunto com a redução da despesa com juros, terá reflexos favoráveis no desempenho das contas públicas em 2018.

Conseguir aproveitar esta conjuntura para colocar a economia portuguesa numa trajectória de crescimento mais robusta é, pois, o desafio.

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